ARTIGOS
A Sentinela, de Arnaud
Desplechin (exibição na TV5)
por Tatiana Monassa (10/02/2005)
The Road to Memphis,
de Richard Pearce (exibição na GNT)
por Paulo Ricardo de Almeida
(20/01/2005)
Piano Blues, de Clint
Eastwood (exibição na GNT)
por Paulo Ricardo de Almeida
(07/01/2005)
FILMES DA SEMANA
(JUNHO DE 2005)
Dia 02
E a transformação gradativa do Canal Brasil
em Canal Mercosul continua. A maior parte das estréias
do canal é de filmes argentinos, que acabam ocupando
boa parte do horário nobre do canal. Passaremos
de julgar os méritos artísticos destes
filmes, porque não os vimos. Tampouco é
questão de fincar o pé reclamando do já
pouco espaço dado a filmes brasileiros na televisão,
embora esse questionamento mereça mais que dois
vinténs de atenção. O que importa
no momento é a estréia de um documentário
argentino que, bom ou não, ao menos toca numa
ferida aberta do cinema latino-americano de esquerda
dos anos 70: o "desaparecimento" em maio de
1976, possivelmente por razões políticas,
de Raymundo Gleyzer, cineasta argentino realizador do
censurado filme Los traidores (1972). Raymundo
(2002), filme de Virna Molina e Ernesto Ardito, passa
às 22:40.
Dia 03
Na falta de grandes atrações ou estréias
curiosas nesta noite de sexta-feira, o jeito é
aproveitar para destacar dois filmes recentes que tratam
de questões de sentimento e sexo com uma frontalidade
que indispõem de partida os filmes com uma boa
camada de público. Curiosamente, os dois passam
em seguida pela HBO, em horário nobre. O primeiro
é Falando de Sexo (Speaking of Sex,
2001), de John McNaughton, que passa às 21:00.
Podemos medir o quão subversivo é o filme
por sua incrível falta de lançamento nos
Estados Unidos (e na maioria dos países, aliás),
mesmo com atores como Bill Murray, Lara Flynn Boyle
e James Spader. O sexo está no divã e
o filme é frenético como em Hawks: como
perder um filme desses? Em seguida, Secretária
de Steven Shainberg (Secretary, 2002), recentemente
defendido nesta mesma coluna. O filme passa às
22:45.
Dia 04
Steamboat Bill, Jr. (dir. Charles Reisner e Buster
Keaton, 1928) não é um dos longas-metragens
mais conhecidos de Buster Keaton. É um de seus
últimos filmes mudos e, se observarmos os filmes
que existem logo antes A General, Amores
de Colegial ou logo depois The
Cameraman , havemos de concordar que o filme
é imperdível. Ainda mais quando lembramos
que, anteriormente, o tema de barcos e mares deu Marinheiro
poer Descuido (The Navigator, 1024), obra-prima
definitiva. Steamboat Bill, Jr. passa na RetrôTV
ao meio-dia, na única sessão semanal da
televisão dedicada inteiramente a filmes silenciosos.
Mais à noite, o Telecine Premium estréia
um dos mais interessantes thrillers dos últimos
anos. Por um Triz (Out of Time, 2003)
é um belo exercício de agilidade narrativa,
expectativa e antecipação não sem
semelhanças com a série 24 Horas
superposição de intrigas e prazos,
correria indiscriminada, tensão constante ,
mas é também um exemplo de uso cinematográfico
do roteiro que prioriza a inteligência (o estilo)
em vez da esperteza (os "achados"). O filme
passa às 21:00.
Dia 05
A RetrôTV
exibe uma pequena homenagem a Humphrey Bogart, passando
dois filmes não muito acessíveis em que
o ator é protagonista. O primeiro é A
Trágica Farsa, de Mark Robson (The Harder
They Fall, 1956), às 18:00, e o segundo é
A Nave da Revolta, de Edward Dmytryk (The
Caine Mutiny, 1954), às 20:00. Ambos os diretores
estão longe de ser grandes autores, ou até
mesmo artesãos consistentes são
aliás de uma inconsistência flagrante,
chegando às vezes perto até da incompetência.
No entanto, são dois filmes que sobressaem na
carreira de cada um dos diretores, e Bogart, claro,
ajuda. Ainda no mesmo canal, às 22:00 passa O
Espião Que Veio do Frio, de Martin Ritt (The
Spy Who Came in From the Cold, 1965), com Richard
Burton no papel do herói Leamas do livro de John
Le Carré. Falando em astros e diretores inconsistentes...
Dia 06
No dia que a Globo passa Carandiru de Hector
Babenco (previsto para as 22:25), o Cinemax exibe (às
22:00) Cidade de Deus, de Fernando Meirelles.
Mais interessante do que jogar um contra o outro à
procura das falhas de um e das qualidades de outro
qual é mais "ético", qual tem
mais agilidade e dinamismo, qual tem preocupações
sociais mais genuínas, etc. , é
interessante notar o papel que dois protagonistas-intermediários
exercem no modo de identificação/desinstalação
no filme. Em ambos os filmes, o outro (o pobre, o favelado,
o prisioneiro) é acessado a partir de um personagem
que está ao mesmo tempo dentro e fora, e que
filtra para nós, de modo mais palatável,
o universo um certo investimento libidinal fantasmático
propriamente social no outro da classe média
que está adiante de nós. Buscapé
e o médico vivido por Luiz Carlos Vasconcelos
operam uma mesma função, por mais que
as classes dos personagens sejam distintas. Trata-se
aqui de revelar um mundo que aos olhos do protagonista
pareça instigante, diverso, rico (a riqueza de
tudo aquilo que nos é outro), mas de nunca nos
instalar inteiramente dentro deste mundo. O persoangem
principal atua como um intermediário entre o
espectador e seu outro, criando uma linha de demarcação
bastante clara. Não livra a nossa cara de espectadores,
mas tampouco nos engaja como se aquilo dissesse respeito
a nós. A linha de demarcação não
nos permite, e se tivermos que buscar um filme em que
não se demarque, só se trouxermos novamente
à baila O Invasor, O Prisioneiro da
Grade de Ferro... Em todo caso, Carandiru e Cidade
de Deus são dois dos mais belos momentos do cinema
brasileiro dos últimos anos. Só são...
frágeis.
Dia 07
Aconteceu Naquela Noite de Frank Capra (It
Happened One Night, 1934) reúne Claudette
Colbert e Clark Gable num filme bastante em moda hoje:
é uma comédia de recasamento (e dê-lhe
Stanley Cavell), é um road movie, é
um grande ganhador de Oscars, etc. Nada disso, no entanto,
explica a graça do toque de Capra muito
mais leve aqui do que de costume e a química
entre os dois atores. Quem nos dá o prazer da
exibição é o Cinemax Prime, que
passa o filme às 21:30. Logo depois, às
23:30, o Canal Futura exibe Sargento York (Sergeant
York, 1941), belíssimo e raro filme de Howard
Hawks com Gary Cooper e Walter Brennan. Pouco mencionado,
inclusive pelos amantes de Hawks, York é
um dos belos exemplos de como Hawks filma personagens
diante da morte, como em seu mais perfeito filme, Paraíso
Infernal. Doçura e destino nunca pareceram
tão próximos.
Dia 08
OK, a estréia foi no sábado, mas sábado
não tinha competição. Fica pra
hoje, então: Pacto de Justiça de
Kevin Costner (Open Range, 2003) não é
lá um grande filme, mas a carreira de Costner
como cineasta, em suas esquisitices mas também
em seu apego, revelam um realizador que merece ser acompanhado
mesmo que seja pelo belo Dança Com
Lobos. Um misto de nostalgia cinematográfica
e desejo pioneirístico de começar do zero
completamente fantasmático na medida em
que começar do zero hoje é impossível
fazem de seus filmes algo semelhante a pancadas
da própria cabeça na parede. Mas notáveis
pancadas. Pacto de Justiça passa às
21:00 na HBO.
Dia 09
Na falta de grandes atrações ou de estréias
promissoras nesta quinta-feira, podemos escolher entre
dois dos filmes recentes que poderíamos chamar,
segundo a denominação de Truffaut, de
"grandes filmes doentes". A FOX passa Minority
Report A Nova Lei (Minority Report),
de Steven Spielberg, às 21:00, enquanto o Telecine
Emotion exibe Dogville (idem, 2003), de Lars Von Trier,
no mesmo horário. De Spielberg podemos falar
de uma fase atormentada pós-A.I., como
se a criança que reinventou o grande cinema industrial
hollywoodiano nos anos 70-80 tivesse se transformado
num velho sem chegar a passar pela idade adulta. Minority
Report se defronta com o material de base da ficção
americana, e da instalação desse país
como diferença (puritana e autocêntrica,
sem a menor dúvida) no mundo. A intriga repete
Intolerância: ver como é possível
agir de forma diversa em relação ao destino.
De Von Trier, falemos mais de uma obra inteira que dramatiza
a doença mas é ao mesmo tempo instalado
nela. Em todo caso, não como Cronenberg, que
se instala na mesma doença de seus protagonistas.
Os filmes de Lars Von Trier vão ficando progressivamente
mais desprendidos da ficção que narram,
e o jogo de identificações já não
deixa esconder mais a maneira como ele faz do mundo
seu teatrinho pessoal. O problema não é
tanto o fato de que ele manipula (a manipulação
e a questão identificação/distância
estão no cerne do que está sendo discutido
em Dançando no Escuro e Dogville),
mas o resultado dessa manipulação: a entrada
numa visão de mundo que tenta se autojustificar
por construir um "universo", ou seja, ser
cinema "de autor". Mas, em resumo, poderíamos
dizer que neste universo falta mundo. Galáxia
deserta.
Dia 10
Sem nenhum estardalhaço, quase em silêncio,
o Eurochannel exibe Barocco, o Jardim do Suplício
(Barocco, 1976), terceiro longa-metragem de André
Techiné. com elenco superestelar: Gérard
Depardieu, Isabelle Adjani, Marie-France Pisier, Jean-Claude
Brialy e Jean-François Stévenin. Mais
conhecida a partir da década de 80, a obra de
Techiné funciona através de circuitos
psicológicos que trabalham uma fisicalidade estranha
nos atores, fornecendo interpretações
carregadas de originalidade e pregnância. Adicionando
a isso a dificuldade de acesso a esse filme (que, no
mais, não é lá muito falado ou
referido tratando-se de Techiné), vale a pena
ligar no Eurochannel às 22:00
Dia 11
Kill Bill, Volume 1 sendo exibido na HBO às
21:00, grande chance de retornar ao filme de Tarantino.
Primeiro ao formato: existe uma certa volatilidade nas
maneiras de se assistir ao dístico de Tarantino,
mas ver o filme em formato quadrado, no 4:3 da televisão
(e do primeiro DVD lançado) não é
uma delas. Uma das forças do cinema de Tarantino
é a maneira precisa e impressionante com que
ele enquadra para o formato panorâmico 2,35:1.
Igualmente, pode-se dizer que as cores e os movimentos
de Tarantino também pedem uma tela grande, e
uma tela menor que nós reduziria bastante o poder
de encantamento, a força da mise-en-scène.
A narrativa, ao contrário da mise-en-scène,
traduz bem para a tela pequena. Quentin Tarantino, o
homem que fez com que o cinema comercial se rendesse
à maior importância da mise-en-scène
em relação à narratividade ou à
história que está sendo contada
e assim mostrando-se discípulo fiel de Sergio
Leone, de Monte Hellman, de Sam Peckinpah , mostra
seu filme mais desmesuradamente anti-narrativo, mais
devoto ao artifício, e ganha sua aposta. Resta
saber se na televisão dá pra perceber
o que é nada menos do que uma evidência
numa tela grande de cinema.
Dia 12
Possivelmente o melhor filme de Andrzej Wajda, Kanal
(idem, 1957) estréia neste domingo na TV5 às
21:40. Uma certa tendência ao academicismo e à
mão pesada apareceriam com o passar do tempo,
mas isso não impediria a força de vários
dos filmes que fazem sua fama: Sem Anestesia,
Cinzas e Diamantes, O Homem de Ferro).
Kanal, como os Bergman menos certos de si mesmo, é
um filme mais apaixonante.
Dia 13
Com Sin City, Robert Rodriguez volta à
categoria dos diretores fashion na qual esteve
no começo de sua carreira, com El Mariachi
e os filmes alavancados pela griffe Tarantino
pós-Pulp Fiction (A Balada do Pistoleiro,
Um Drink no Inferno, Grande Hotel). Três
Spy Kids depois, além de alguns filmes
em que Rodriguez se distanciou do imaginário
"sangue e piadas" que fez a fama de seu amigo
mais famoso, e Rodriguez volta à semi-obscuridade,
ou à maldosa linhagem dos has been, o
que, segundo muitos, Era uma Vez no México
apenas confirmaria. Ora, o cinema de Rodriguez sempre
foi medido a partir de Tarantino, injustamente e com
um tanto de miopia crítica (em todo caso, esta
fama foi dada mais pelo público teen-cult
do que pela imprensa especializada... esta nunca
chegou a levar Rodriguez muito a sério), e o
cinema deste sujeito curioso sempre esteve muito mais
do lado da mobilidade absoluta (ao contrário
de uma certa monumentalidade do plano em Tarantino)
e da construção do cinema como brinquedo.
O mínimo que se pode dizer é que ele leva
seu projeto muito a sério, de forma rigorosa
e com muito talento e personalidade (pode-se dizer de
cada um de seus filmes que eles levam a sua marca).
Chance então, antes do reconhecimento absoluto,
de ver (ou rever) Era uma Vez no México,
que o HBO Plus passa às 22:05.
Dia 14
A coluna desta semana jamais teve a idéia de
fazer destas linhas uma semana temática Tarantino.
Mais eis que surge um filme de um dos diretores preferidos
do diretor de Kill Bill: Walter Hill. Wild
Bill Uma Lenda no Oeste (Wild Bill,
1995) faz parte da reconstrução do imaginário
do western que tanto preocupa Hill ao longo de sua carreira
chegando hoje à construção
visual e à direção do episódio
piloto da série
Deadwood e narra a história do
pistoleiro Wild Bill Hickok. Outro caso de um diretor
que já foi objeto de moda Warriors,
48 Horas e hoje precisa ser reencontrado
fora do circuito da fama. Wild Bill passa no
Telecine Action às 23:05.
Dia 15
Por fim, terminamos a semana com um clássico
de Jerry Lewis e possivelmente a porta de entrada privilegiada
para seus filmes: O Professor Aloprado (The
Nutty Professor, 1963), em que Lewis adapta a história
de Doutor Jekyll e Mr. Hyde a sua típica persona
de tela. O filme passa às 22:00 na RetrôTV
e não poderíamos elogiá-lo mais.
Imperdível.
Dia 19
Enquanto esperamos por maiores reformulações,
a coluna de filmes da semana, dado o histórico
de constantes atrasos, passa a ser publicada no domingo,
na esperança de que desta vez consigamos uma
periodicidade assídua e dentro do prazo. A semana
começa muito bem com três estréias
de razoável interesse. Vamos à melhor:
Aprile (1998), de Nanni Moretti, que passa às
22:40 no Telecine Emotion. É uma estréia
apenas na rede Telecine, uma vez que o filme já
circulou bastante pelos canais TVA/DirecTV. Ainda assim,
uma ótima oportunidade para ver um Moretti em
ótima forma, espécie de cinediário
como anteriormente o fora Cario Diário.
Reflexão sobre política italiana e sobre
os prazeres e suplícios de se ter um filho. Simplesmente
adorável. Antes disso, às 21:00, o Telecine
Action estréia O Imbatível (Undisputed,
2002), último longa-metragem de Walter Hill até
a presente data. Não é exatamente um dos
momentos altos de sua carreira, mas também não
é desprezível. O piloto da série
Deadwood é melhor. Por fim, às
23:00, estréia no Canal Brasil o misterioso Guru
das Sete Cidades, filme de 1972 dirigido por Carlos
Bini e estrelado por Otávio Terceiro, ator de
Rogério Sganzerla (O Signo do Caos, Nem
Tudo É Verdade). Último filme de Bini,
que um ano antes havia feito seu longa de estréia,
Geração Bendita (É Isso Aí,
Bicho), Guru é um desses filmes invisíveis
que, quiçá, podem conter características
bem curiosas. A ver.
Dia 20
O Telecine Premium estréia às 21:00 O
Tango e o Assassino (Assassination Tango,
2002), irregular porém bastante interessante
filme de Robert Duvall, ator amplamente conhecido e
anteriormente realizador do grande O Apóstolo.
Mas o grande destaque da noite é O Açougueiro
(Le Boucher, 1970), um dos melhores e mais celebrados
filmes de Claude Chabrol, com interpretações
extraordinárias de Stéphane Audran e Jean
Yanne, em uma das mais perturbadoras das histórias
de Chabrol. Entomologista, diria o documentário
de Labarthe sobre ele. Entomologista, sim, sem dúvida.
Eurochannel, meia-noite de segunda para terça.
Dia 21
Estão aí em DVD todos os filmes da série
A Pantera Cor-de-Rosa para vermos que Blake Edwards
não é somente um comediógrafo,
mas um grande encenador para o formato panorâmico
(2,35:1) e um autor coerente e consistente ao longo
de sua carreira. Um deles, A Vingança da Pantera
Cor-de-Rosa (Revenge of the Pink Panther,
1978), passa no Film & Arts às 17:00 e à
meia-noite de terça para quarta. É o último
com Peter Sellers e não é exatamente o
mais lembrado deles, mas se passar no formato certo,
vale a pena tranqüilamente a visão... Se
não, aproveitando que vivemos semana da mostra
Cinesul (que mais uma vez se especializa em trazer para
sua competição oficial filmes cada vez
mais nulos), que tal conferir Los debutantes
(idem, 2003), filme chileno de Andrés Waissbluth
que, visto de passagem na tv a cabo uma certa vez, parecia
bem interessante. O filme passa no Cinemax Prime às
23:15.
Dia 22
Rita Hayworth e Gene Kelly juntos dirigidos por Charles
Vidor. Naturalmente Vidor é o que fica mal na
fita, embora não seja nenhum borra-botas. Modelos
(Cover Girl, 1944), que o Cinemax exibe às
16:00, é tido como um dos maiores musicais da
Columbia, e Gene Kelly teve tratamento de luxo, chegando
ele mesmo a dominar o set como uma espécie de
diretor/produtor (a idéia da dança na
rua, por exemplo, é interamente dele e de mais
ninguém). Vidor não é exatamente
um autor mas geralmente carrega bem seus filmes, e Hayworth
vale quase qualquer parada.
Dia 23
Finalmente voltamos a falar no Telecine Classic. E agora
com muito louvor, porque eles exibem um filme bastante
raro de Budd Boetticher: Arrancada da Morte (Red
Ball Express, 1952). Não é exatamente
a época mais talentosa de Boetticher, não
é o gênero em que ele foi mestre (o western),
mas ainda assim, para todos aqueles que já viram
ao menos um filme dele com Randolph Scott, assistir
a qualquer Boetticher é questão de honra.
O homem é um desses talentos que conseguem pegar
o convencional e trabalhá-lo com uma limpidez
tão incrível que tudo fica parecendo arte
moderna. 21:00. Entretanto, para quem fez papel de bobo
e não foi assistir ao relançamento nos
cinemas da cópia restaurada de Terra em Transe
(visão obrigatória, apesar da restauração
deixar a impressão de que existe uma micropeneira
entre a câmera e os atores) pode pegar o controle
e vê-lo às 21:20, na TV5. Jardel Filho,
Glauce Rocha, José Lewgoy, Paulo Autran, Paulo
Gracindo e trocentos outros (Milani, Pereio, Emanuel
Cavalcanti, José Marinho, Carvana, Migliaccio,
Reston, Danuza Leão, Mario Lago, Jofre Soares,
Darlene Glória) num filme que poderia se chamar
"Brasil, 1967".
Dia 24
Mais Walter Hill aparecendo aqui. Desta vez é
Confronto Final (Southern Comfort, 1981).
O mundo do western assombra o trabalho desse realizador,
e o assombra especificamente como um fantasma. Como
fazer voltar um gênero que não existe mais,
mas acima de tudo como fazer com que essas histórias
nos pareçam atuais? É todo o sentido
de sua obra mais cultuada por fãs, Os Selvagens
da Noite (Warriors, em que gangues de rua
vão fazer o papel de caubóis e pistoleiros).
Confronto Final passa às 11:50 no Telecine
Action.
Dia 25
Último filme de John Ford, Sete Mulheres
(Seven Women, 1966) tem uma inacessibilidade
impressionante. Filme feito em formato panorâmico
de CinemaScope, o filme jamais consegue ser exibido
desta forma, a não ser no TCM americano (porque
o brasileiro é o lixo dos lixos, só exibindo
filmes dublados e colorizados). Acaba que temos que
recorrer à única forma possível
de vê-lo, em tela cheia, nas periódicas
exibições que faz o Canal Futura. Neste
sábado, passa mais uma vez, às 22:00.
Nenhum lançamento em vídeo, que dirá
DVD. Nem nacional, nem importado. Ainda assim, é
tido por muitos como um dos grandes filmes de John Ford,
e para alguns o maior de todos. E então, ver
ou não ver no canal Futura...? Até o próximo
domingo.
Dia 26
Antes de Bonequinha de Luxo, Blake Edwards dirigiu
seis comédias de que pouco se ouviu falar. Dessas,
a mais conhecida é Anáguas a Bordo
(Operation Petticoat, 1959), que o Telecine Classic
estréia às 21:00. O filme, estrelado por
Cary Grant e Tony Curtis, é uma comédia
militar sobre um submarino quase sucateado. Ótima
oportunidade para ver um Edwards ainda antes da fama
como um dos grandes comediógrafos americanos,
um estatuto que lhe pertence até hoje e que futuramente
Contracampo tentará demonstrar o porquê.
Dia 27
Da mostra dedicada aos épicos romanos que o RetrôTV
anda exibindo, o melhor é reter o mais interessante:
A Queda do Império Romano (The Fall
of the Roman Empire, 1964), de Anthony Mann, que
o canal exibe às 22:00. Antepenúltimo
filme de Mann, e seu segundo épico (precedido
de El Cid, feito três anos antes), A
Queda... tem um elenco estelar (Sophia Loren, Stephen
Boyd, Alec Guiness, Omar Shariff, James Mason, Mel Ferrer,
Christopher Plummer), e mesmo que os épicos dos
anos 50-60 constituam um filão um tanto difícil
de engolir hoje, o estilo de Mann faz aqui sua diferença,
muito embora o ápice de seu cinema ainda esteja
nos faroestes dos anos 50. No Telecine Emotion, estréia
às 21:00 Fábrica de Robô
(Heartbeeps, 1981), filme dirigido por Allan
Arkush, responsável por algumas comédias
cult do mesmo período (Rock'n'Roll High School,
1979; Get Crazy, 1983) e hoje dirigindo quase
que unicamente para séries de televisão
(e nenhuma muito honrosa, diga-se), e estrelado pelo
mitológico comediante Andy Kauffman cinebiografado
por Milos Forman em O Mundo de Andy/Man on
the Moon (1999) , que viria a morrer três
anos depois. Isso tudo, é certo, não eleva
a expectativa sobre o filme para além da curiosidade,
mas em todo caso a visão corre o risco de recompensar.
Dia 28
Em Tropas Estelares (Starship Troopers,
1997), Paul Verhoeven faz sua costumeira prova pelo
absurdo e exerce seu inegável talento satírico
em cima do militarismo americano. Talvez mais que em
qualquer outro, neste filme fica clara a proposta de
Verhoeven de carnavalizar e usar o excesso para criticar.
Se antes alguém achava que seus filmes eram apenas
puras obras de mau-gosto (não que não
o sejam, mas elas são isso e seu inverso crítico),
esse passa a pá de cal. A conferir no Cinemax
Prime às 21:30. Já no Cinemax, passa a
nada confiável seqüência de Vampiros,
de John Carpenter. É Vampiros: Os Mortos
(Vampires: Los Muertos, 2002), de Tommy Lee Wallace,
que além
de dirigir sequels de Carpenter não fez muita
coisa além de dirigir telefilmes e episódios
de séries de tv. O filme passa às 22:00,
e o ator principal não dá nenhuma vontade
de conferir: Jon Bon Jovi. Então, talvez valha
a pena prestar atenção num realizador
que já teve a sua fama e hoje é conhecido
apenas por ter feito O Céu É Para Todos
(To Kill a Mockingbird, 1962): Robert Mulligan.
Em Quando Setembro Chegar (Come September,
1961), ele dirige Rock Hudson e Gina Lollobrigida numa
comédia romântica em CinemaScope, e o Film&Arts
exibe às 20:00. A não deixar passar
principalmente se o canal for bacana e passar o filme
no formato certo.
Dia 29
Falando em formato certo, um que se vê em formato
certo na televisão e não no cinema é
Elogio ao Amor (Éloge de l'amour,
2001), de Jean-Luc Godard, que o Cinemax Prime exibe
às 19:45. Metade em película e preto e
branco (para o presente), metade em vídeo digital
colorido (para o passado, com um colorido saturado extraordinário),
o filme começa com o amor mas rapidamente fala
que, para haver amor, é preciso primeiro haver
memória e história, e daí desencadeia
as reflexões que Godard vem fazendo nos últimos
anos sobre a imagem como memória, ou a imagem
como esquecimento; sobre política hoje, e sobre
atuação. Os locais históricos abandonados
em preto-e-branco, mais documentais impossível,
são um verdadeiro filme de terror o terror
da História. Um grande filme, amargurado mas
acreditando como poucos na imagem e na força
que ela (ainda) tem contra a não-imagem da difusão
midiática.
Dia 30
Eis uma bela novidade do Telecine Classic: exibir juntas
as duas versões mais famosas cinematográfica
de Ave do Paraíso (Bird of Paradise),
a peça de Richard Walton Tully, dirigidas por
dois diretores no mínimo consideráveis.
A primeira, que passa às 19:30, é de King
Vidor, de 1932, com Dolores Del Rio e Joel McCrea, e
a segunda, exibida às 21:00, é de Delmer
Daves, de 1951, estrelada por Debra Paget e Louis Jourdan.
Mais do que questão de disputa entre as duas
versões, aqui é a ocasião para
ver dois filmes de diretores que vale a pena acompanhar,
um decisivo (Vidor) e outro interessante (Daves).
Ruy Gardnier
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