CINEMA FALADO, PARTE 1
Um ano de documentários?

Ruy Gardnier: Uma primeira observação a se fazer é que se questionou internamente a validade desse encontro. Foi a primeira vez na revista que houve esse questionamento, porque antes parecia automaticamente válido que se fizesse o Cinema Falado sobre o ano do cinema brasileiro, e dessa vez parecia fazer pouco sentido, ou menos sentido do que antes, dada a produção desse ano. Isso envolve alguns fatores, dentre os quais uma avaliação pessoal da produção que foi lançada comercialmente no ano, e outro em relação ao formato antigo do Cinema Falado, que se focava ora em modelos de produção e fomento ao cinema, ora em uma análise debatida filme a filme. Viu-se que isso não seria tão frutífero quanto nos outros anos. Pode ser que outras maneiras de abordar sejam mais úteis para lidar com o cinema brasileiro de 2004, ao menos aquele lançado comercialmente, mas é algo que a gente só vai ver conversando.

Daniel Caetano: É de se notar uma coisa: a gente teve um consenso na revista, que é sempre uma coisa um pouco problemática, mas a gente concluiu que esse ano teve um grande filme brasileiro, que é o do Paulo Sacramento, O Prisioneiro da Grade de Ferro, de que toda a equipe da revista gostou muito, e um outro, não um consenso, mas também bastante presente que foi o filme do Bressane, Filme de Amor. De resto, tiveram alguns filmes com boa receptividade e vários outros que precisamente não agradaram.

RG: Eu colocaria nesse patamar de filmes que fizeram a diferença no nosso gosto em 2004 pelo menos outros dois ou três, que são Peões, Garotas do ABC e Entreatos. Todos esses filmes tiveram na lista de melhores de mais de um colaborador da Contracampo. Agora, partindo tanto do ponto de vista da indústria – ou da imprensa mais apressada que fala que esse é um péssimo ano pro cinema brasileiro porque diminuiu o percentual de ocupação das telas – quanto da nossa própria avaliação de que 2004 não é um ano bom pro cinema brasileiro por conta da enorme quantidade de abacaxis que entraram em cartaz, eu estou disposto a contestar um pouco isso, porque dá para tirar uns dez ou doze títulos de algum interesse para o cinema brasileiro. A questão é que depois desses doze a avaliação é radical, você tem uma infinidade de filmes cheios de problemas de estética e cheios de equívocos completos e falta de comunicação com quem quer que seja. A coisa ultrapassa o nível narrativo: trata-se do eixo de fazer sentido.

DC: Essa coisa do público é uma outra discussão que nem tem a ver com a avaliação crítica. Olga é um caso exemplar, um filme muito criticado inclusive pela mídia cotidiana, e teve até aquela história do Daniel Filho falar que crítica ruim ajuda as pessoas a irem ao cinema, o que é algo bem discutível. De certa maneira, Olga foi um grande sucesso, mas o problema desses grandes filmes é que eles não conseguiram fazer o sucesso que se imaginava, e que iria crescer em comparação com Cidade de Deus e Carandiru. Então essa coisa de bilheteria é um tanto quanto aleatória. E o Cazuza é também exemplo, pois a bilheteria dele é um pouco aleatória. Tem um apoio, isso ajuda, mas outros filmes às vezes têm o mesmo apoio e não conseguem público. Eles esperavam estourar mais com alguns outros filmes, como A Dona da História, e não acho que esse critério de pessoas indo ao cinema seja tão eficiente, porque em outros anos a gente teve, por exemplo, a bizarrice de Carandiru.

RG: A avaliação de relevância dos filmes desse ano é o fato de que, anteriormente, os filmes atenuavam em alguma medida para o espectador um certo conteúdo social mas eram filmes que traziam uma polêmica, enquanto Olga e Cazuza o máximo que tentam fazer é colocar num aquário aquela figura e fazer o jogo do grande público, ou seja, trazer retratos amenizados dessas figuras, que só são populares justamente por um perfil de vida diferenciado, e indiferenciá-los no meio de um modo de fazer cinema que é canônico e está longe de querer levantar pontos. Os filmes parecem pedir para que não se discuta sobre eles.

Gilberto Silva Jr: O Daniel falou que o Olga representou um certo sucesso de público, mas mesmo assim o filme ainda ficou bastante abaixo das expectativas de bilheteria que eram previstas ou esperadas pela Globo Filmes. Em termos de bilheteria, o único êxito do cinema brasileiro esse ano parece ter sido realmente o Cazuza, que ficou acima do esperado. Eu pessoalmente não aprecio muito o filme, mas ele teve uma penetração até para um público não admirador do Cazuza, um público numa faixa mais velha, conservador, que talvez se chocaria com a figura contestatória do Cazuza. Mas, como o Ruy falou, o trabalho de amenizar, de tornar essa figura palatável, deve ter ajudado nessa penetração.

Luiz Carlos Oliveira Jr: O Cazuza fez público mais ou menos daquela forma que o Cidade de Deus e até o próprio Carandiru faziam: iam superando as expectativas aos poucos, à medida que o filme percorria sua carreira comercial. À diferença do Olga, que chegou para ser um hit e o fato é que ele ficou aquém das expectativas da própria Globo Filmes.

GSJr: Assim como A Dona da História, que ficou bem abaixo.

LCJr: Se ano passado a gente começava falando do êxito de bilheteria da Globo Filmes, e de como isso estava sendo usado de uma forma tendenciosa pela imprensa para tentar passar a idéia de um grande ano para o cinema brasileiro, esse ano a inversão disso, ou seja, o fato da Globo Filmes não ter atingido a meta esperada, serviu para a mesma imprensa criar um discurso de que o ano não foi tão bom.

DC: A gente sabe que esse discurso está ligado a uma série de interesses, questões das mesmas corporações estarem trabalhando, produzindo, divulgando e analisando, e isso é esquisito. Tenho a impressão de que a gente tem de discutir aquilo que se temia cair no óbvio, que são algumas avaliações críticas em torno de alguns filmes que são mais provocadoras do que um texto ou dois de uma pessoa vá dar conta. Dá para se criar um certo debate, talvez não como nos outros anos, em termos de todos os filmes, mas em torno de uns quatro, cinco, seis específicos que, mesmo que as opiniões sejam mais ou menos semelhantes sobre a qualidade dos filmes, eles provocam algo além do "gostei por tal motivo" ou "não gostei por tal motivo", mas sim o que eles representam em si. Por exemplo, mesmo com Olga ou Glauber – O Filme podemos discutir mais do que o "por que não gostamos", entrar em algumas opções que os filmes seguem, e também nos casos de que obviamente gostamos, como O Prisioneiro da Grade de Ferro e Garotas do ABC. Garotas do ABC mais ainda, por ter um certo viés histórico do cinema brasileiro que a gente pode discutir em relação à recepção de uma estética do Carlão que tem sido problemática com o público nos últimos anos, coisa que não era. E O Prisioneiro pela própria atitude do Paulo de entregar a câmera, misturar o relato dos prisioneiros com a decisão dele de encadeamento do relato e o que interessa ao filme, misturando essa coisa do autor. Eu proporia então começar com o próprio filme do Paulo. Naquele dia em que o filme foi exibido no Odeon, na Sessão Cineclube, quando ele foi lá com o Aloysio Raulino [diretor de fotografia do filme], acho que não se comentou tanto sobre o olhar que os prisioneiros estavam fazendo de si mesmos (a entrevista pode ser lida aqui). Me parece que é isso que ele busca, e que tem a ver com algo que já vem sendo discutido há alguns anos no cinema brasileiro, que é o olhar da marginalidade. Ali ele procura o contrário do que essa turma toda busca, de mostrar uma figura marginal e normatizar como uma figura genial ou como um grande herói, quando são pessoas que pela própria justiça foram marginalizadas e que se colocam como pessoas normais, ninguém ali se coloca como herói, isso eu acho muito interessante.

RG: É um pouco como o próprio processo do filme, que era a princípio para ser sobre o Bandido da Luz Vermelha e que depois, quando o filme foi ser feito, viu-se que era outra coisa o que se buscava. Atrás dessa figura havia outra coisa, o foco era totalmente outro.

GSJr.: Quando o Daniel fala desse processo que o filme faz, de apresentar a visão dos caras, penso que isso vai numa mão oposta justamente ao que eu não gostei no Carandiru, que era um certo paternalismo, até uma certa idealização em cima da figura do prisioneiro. O filme do Sacramento, por mostrar uma visão deles, ou por trabalhar em conjunto com uma visão deles sobre eles mesmos, tem uma autenticidade, uma veracidade, isso não se deve ao fato de ser documentário, porque a gente sabe que tem documentário que foge dessa veracidade. Mas o filme do Paulo conseguiu transparecer isso, seja em termos documentais, de retratar uma realidade, seja de ser um filme emocionante, que toca profundamente. Você não sai frio após assistir ao filme.

DC: Uma coisa que a gente pode levantar da Contracampo são todos os artigos que seriam feitos e não foram. E tem um artigo que eu lembro que o Ricardo Miranda prometeu de fazer mas não fez, questionando a relação, que o trailer do filme até usa, de se apresentar como documentário. A mesma coisa que tem no filme da Ana Carolina [co-dir. Paulo Rufino], Lavra-Dor. A própria colocação questiona: será que é documentário? A grande sacação de botar essa frase é porque, mal ou bem, são retratos construídos pelas próprias pessoas. Ninguém é um bom Sherlock Holmes de si mesmo... O cara está se exibindo, e essa veracidade de que o Gilberto fala é muito legal porque você sente essa relação de vida na tela, mas a gente sabe que são eles que a estão construindo, e nisso fica muito interessante essa idéia do filme ter saído do retrato sobre um bandido para deixar uma série de pessoas, de nomes que vão aparecer no final, construindo seus olhares sobre si mesmos. O Coutinho diz que todo mundo que aparece num documentário é um personagem, a pessoa real não está no filme.

LCOJr: E o Coutinho sabe muito bem trabalhar as pessoas como personagens.

DC: O Prisioneiro faz a gente se perder nisso, se enganar. Esse engano é necessário pro filme.

LCOJr: O Gilberto puxou a comparação com o filme do Babenco e é curioso que eu lembro bem do Paulo falando que não viu o Carandiru. E é impressionante como o filme dele chega a sugerir não sei se uma resposta, mas nitidamente traça um caminho diametralmente oposto, a ponto do Carandiru terminar com a cena da implosão tocando "Aquarela do Brasil" e o Paulo Sacramento justamente começar com a desimplosão, com a cena reversa e com um som que não é uma música, uma aquarela, é um som absolutamente incômodo, estrondoso.

GSJr: Só pra lembrar que Carandiru e O Prisioneiro ficaram prontos praticamente na mesma época, o que houve foi o atraso do lançamento comercial do filme do Sacramento. A primeira exibição foi no festival "É Tudo Verdade", em 2003, mais ou menos quando estava saindo o Carandiru.

DC: É engraçado que o Babenco também tem esse talento em lidar com a coisa, mas ele promove algo semelhante ao que fazem esses blockbusters desse ano, que é de criar personagens com contexto melodramático, para se tornarem palatáveis para um grande público, mas há uma certa intenção política em fazer isso aí, que dá mais certo em Carandiru do que deu em qualquer um dos blockbusters desse ano. A partir do fato, inclusive, de que a relação que as pessoas tinham com aqueles personagens anteriormente era muito mais agressiva. Mas é óbvio que os filmes seguem intenções opostas, um procurando ser melodramático e o outro procurando nos trazer uma impressão de real.

RG: Ainda mais porque Carandiru tem uma estrutura narrativa completamente arriscada, por acumulação de história e não por evolução de uma intriga, que inexiste. É um filme obviamente cindido em dois. Há uma hora e quarenta, ou mais do que isso, de histórias de acumulação da vida dos personagens, essa primeira parte também ela fragmentada em n subpartes que não se relacionam necessariamente entre si. Acaba funcionando porque, se numa hora você sente uma certa chatice, pelo fato de que o filme está começando a cada vez, tem uma hora que a coisa começa a pesar, e é na fissura de uma parte para outra que você vê que o percurso dessas pessoas, com quem ele fez você se identificar, não adianta nada porque todos são alvo da violência policial na segunda parte. Mas voltando à produção desse ano, porque Carandiru foi suficientemente falado no ano passado, acho que O Prisioneiro conversa com vários outros filmes na questão da naturalidade e da verossimilhança, de um realismo. Filmes como Justiça, ou Fala Tu, ou Entreatos, que em alguns momentos tentam ser uma idealização daquilo que se busca. Entreatos é certamente muito mais bem sucedido do que os outros dois de que falei, mas tem momentos bastante questionáveis. Quero associar muito uma cena do Entreatos, aquela do sujeito que tomou uma carona com o Lula, que é completamente dissociada, só serve para mostrar um discurso de outro sobre como o Lula é simpático, com uma cena no Fala Tu que nada tem a ver com o universo daquelas pessoas de rap, de hip hop, mas é um fait divers que acontece no meio da trama, da namorada de um produtor ter sido assaltada, ter perdido o celular, e de uma hora para outra, do nada, começa-se a falar de roubo de celular só para criar um universo de classe baixa, o que eu acho completamente espúrio e dissociado. Esse episódio do sujeito no avião certamente seria um excelente curta-metragem ou um extra de DVD do Entreatos, mas aquilo não é o filme de forma alguma. Aquilo só serve para uma tendência idealista que eu vejo na obra do João Moreira Salles, por mais que ele se arme de todos os mecanismos e métodos documentários que ele conhece e estudou muito bem, viu em muitos filmes, mas que não vejo aplicado de uma forma mais pensada ou mais intuitivamente honesta com os temas dele. No Fala Tu obviamente é muito mais problemático, porque o pessoal é iniciante, e aquilo não faz parte do filme, só entra porque há alguma ação e ele achou interessante. Documentarista corre muito esse risco de montar um filme sobre um tema pequeno e achar que não vai ter drama nenhum. Então existe um risco nesses documentários de hiper-dramatizar as coisas justamente porque alguém podia achar que o tema deles é menos digno de interesse do que eles de fato acham. Então eles entopem a narrativa com intrigas: o fato de alguém ser assaltado é uma violência, então é um propulsor de uma narrativa, mas essa não está no filme em nenhum momento.

GSJr: A gente começou falando de O Prisioneiro da Grade de Ferro, o Ruy entrou no Fala Tu e no Justiça, e enquanto há essa veracidade de que eu tinha falado no filme do Sacramento, que consegue quase o tempo todo nos transmitir, nos inserir dentro de uma realidade, o Justiça fica no meio termo. Tem momentos em que o Justiça consegue, principalmente quando se passa dentro do tribunal. A partir do momento em que ele sai para mostrar a vida daquelas pessoas, advogados, juizes e os próprios réus, quase sempre o filme cai ou no folclórico ou no hiper-dramático...

LCOJr: Ou no constrangimento mesmo. Tem cenas que são muito mal encenadas.

GSJr: Tem uma seqüência de um moleque que acaba de ser liberado da cadeia e que fica esperando o ônibus na Praça Mauá, aquilo é meio ridículo, encenação até exagerada. Mas o filme consegue transmitir alguma coisa quando está retratando processos no tribunal. O Fala Tu já fica, a meu ver, mais abaixo. Ele começa a ensaiar uma veracidade para os personagens, mas sem sustentação. Tanto que os personagens não são mantidos de forma igual ao longo do filme. No início do filme são três personagens, o gordo, aquela menina e o Macarrão, e no final vira um filme sobre o Macarrão, os outros são praticamente abandonados.

RG: Uma coisa que se deve falar sobre a Maria Augusta Ramos, e que não me lembro de alguém já ter falado, é que há o primeiro caso que eu conheço de plágio de testemunho, plágio de depoimento. A Maria Augusta Ramos viu o filme do Bezerra da Silva que o Simplício Neto fez com a Márcia Derraik, gostou de um depoimento e botou um sujeito fazendo o mesmo depoimento no filme dela, Rio, um Dia de Agosto, uma coisa muito curiosa. Mas bom, voltemos ao assunto: uma coisa pode ser um vestígio falso daquilo que a gente está dizendo, que O Prisioneiro da Grade de Ferro teria mais veracidade – essa foi a palavra mais usada – por causa do seu método. É antes por causa da sua estrutura, pelo conceito do filme. Não é pelo fato de botar a câmera na mão dos prisioneiros que o filme tem força. É o contrário: existe um conceito e existe uma estrutura do filme, que é justamente o que em alguma medida falta nesses outros.

LCOJr: O Entreatos, o Justiça e O Prisioneiro da Grade de Ferro são três filmes em que uma coisa posta em causa a cada plano é como ser justo, como filmar aquilo de um modo justo. Uns filmes mais, outros menos. No caso do Justiça isso chega a ser um problema, porque em muitos momentos ele não sabe como lidar com essa questão de "qual o olhar justo para essa cena".

GSJr: Olha o paradoxo do filme: um olhar justo num filme que se auto-intitula Justiça.

LCOJr: Pois é, e aí aquela cena de que o Gilberto falou, do menino que é liberado, condensa o que o filme tem de pior e de melhor. O que ele tem de melhor, no momento anterior, quando ele está sendo liberado e o cara está preenchendo aquele formulário enorme, com informações que variam do essencial ao mais esquisito, e logo depois tem a cena dele esperando o ônibus, em que tem um plano fechado na perna dele com algum tipo de doença, cena absolutamente desnecessária. Em O Prisioneiro vejo uma postura totalmente diferente, que é a da equipe do filme ter uma noção muito forte de que eles estão ali dentro para criar um processo, o filme é acima de tudo um processo de filmagem, de trabalho em conjunto com aquela instituição e com as pessoas que estão ali, e a coisa se dá de forma muito mais natural. O olhar é construído ao longo do processo, não vejo esse sofrimento que eu vi no Justiça, com a imagem chegando a ter uma certa dor, uma dúvida do tipo "será que isso está certo, será que é isso?". Em O Prisioneiro a coisa se dá de uma forma tão fluida, o filme vai crescendo daquele conjunto de forças, daquele conjunto de fatores, e essa questão no máximo atravessa o filme, mas sem ser um dilema.

DC: Por isso eu vou preferir sempre usar o termo sensação de real a veracidade. Dois retratos que eu vejo que agradaram à equipe porque dão essa sensação de real, não interessando o que é a realidade ou não, são o Raízes do Brasil, do Nelson Pereira dos Santos, principalmente na primeira parte, que é aquele filme de família, e o Fábio Fabuloso. Claramente são discursos construídos, são imagens selecionadas, a família do Sérgio Buarque de Holanda não vai se resumir a dois ou três detalhes que o Nelson mostra, mas é assim que se constrói o olhar, e a realidade está fora do filme, sempre, isso é óbvio. Não há como dar conta dela, o que importa é escolher o que interessa mostrar. Saber o que você quer mostrar e saber que está encadeando um discurso. Passar ao espectador uma certa simpatia, uma certa sensação de que está tendo uma relação com o real é muito mais válido do que querer dar conta de todos os momentos que estão querendo acontecer, ou do que imaginar que está se mostrando de verdade, com toda sua profundidade, com todos os seus ângulos, tais e tais problemas. Isso não é preciso. A segunda metade do filme do Nelson também é assim: ele não vai resumir a história de um país em uma hora, ainda mais ligando com o histórico de um pensador que analisa esse país constantemente. Mas assumir esse retrato incompleto é muito interessante, é o que dá um certo ar de simpatia. No Fábio Fabuloso você sente isso muito, o filme é muito divertido, você simpatiza com o personagem o tempo todo.

LCOJr: Nesse sentido, o filme mais próximo dele esse ano seria o Entreatos. São dois filmes claramente feitos para você simpatizar com o personagem.

DC: E uma terceira tentativa, eu diria totalmente fracassada, é o Glauber – O Filme.



Parte 2: O documento e o conceito. O documento não é o conceito.

Parte 3: Um passeio pelo mercado.

Parte 4: O cinema como parque temático.


Parte 5: Garotas do ABC e os hábitos do olhar.