Com
Wood & Stock – Sexo, orégano e rock’n’roll, Otto
Guerra volta a transpor figuras dos quadrinhos para
as telas, após ter realizado Rock & Hudson – os cowboys
gays, que era inspirado nos personagens de Adão
Iturrusgarai. Agora sua fonte foi o desenhista Angeli,
mítico criador dos dois personagens que dão nome ao
filme, assim como de dezenas de outros, todos ou quase
todos ligados à cultura urbana de São Paulo. Ao escolher
como figuras centrais a dupla de hippies velhos, Guerra
teve que deixar de lado outros tantos personagens antológicos:
Bibelô, Meia-Oito, Bob Cuspe, os Skrotinhos... a galeria
de Angeli é vasta e divertidíssima. Mesmo entre os personagens
escolhidos, não são poucas as piadas boas o bastante
para serem incluídas – no entanto, nem tudo pode caber
num filme só.
No caminho escolhido, o filme de Guerra acerta em alguns
momentos, nem tanto em alguns outros: se o seu Stock
é uma figura engraçada, com seu jeito de hippie abusado
e seu sotaque carregado de paulistano, o filme comete
o pecado de fazer com que todas as cenas de uma personagem
memorável como a Rê Bordosa pareçam chatas e perdidas,
desnecessárias, como se ela fosse adicionada ao filme
apenas por ser “representativa da obra de Angeli”. Apesar
da dublagem de Rita Lee, a Rê Bordosa da versão para
cinema não tem o charme ou a empatia da alcoólatra detonada
dos quadrinhos diários.
Não é por acaso, e talvez este seja justamente um dos
motivos: os quadrinhos, por serem feitos para publicação
em jornal, são diários e curtíssimos (com as exceções
de eventuais estórias longas, publicadas por Angeli
na revista Chiclete com Banana, que manteve por
mais de uma década). Não é uma tarefa simples manter
o ritmo durante todo um longa-metragem a partir da visualização
de piadas não-seqüenciais, que na tela duram mínimos
segundos. Em certos momentos, o resultado faz jus à
genialidade de Angeli – e, curiosamente, alguns desses
momentos ocorrem justamente quando o filme foge das
piadas do próprio Angeli, como no delírio de um mini-Raul
Seixas (dublado por Tom Zé) ou numa calcinha com uma
imagem cantante de Elton John. Em outros trechos, Wood
& Stock, o filme, parece se arrastar ao longo de
uma trama pela qual nem mesmo os personagens dão sinais
de interesse.
Daniel Caetano
|