O GRITO DAS FORMIGAS
Mohsen Makhmalbaf, Shaere Zobale-Há, Índia, 2006

Desde Sex and Philosophy, seu penúltimo filme, Mohsen Makhmalbaf utiliza seu cinema para discursar sobre variados assuntos: no caso de Sex and Philosophy, a relação entre amor, o sexo e o tempo; no caso de O Grito das Formigas, a relação entre os homens e a fé (ou, em outras palavras, entre os homens e Deus). Este ponto-de-partida, contudo, não é necessariamente negativo. Jean-Luc Godard e Manoel de Oliveira estão por aí, fazendo belos filmes, com o intuito de demolir certezas estabelecidas e instaurar novas dúvidas. Mas, fora o fato de Makhmalbaf ser um cineasta muito inferior aos dois citados acima (quase todos os outros também são, na verdade), não é isso que faz de O Grito das Formigas um filme muito fraco. Ao se criar um filme-discurso, infelizmente, é necessário que se tenha algo a dizer. Makhmalbaf, apesar da verborragia repetitiva, constante e entediante ao longo de seus 85 minutos de projeção, parece não saber dessa regra. O Grito das Formigas (igualmente a Sex and Philosophy) discorre sobre a fé como um garoto de 12 anos questionando a injustiça de Deus. Suas imagens “poéticas”, que buscam espaço por entre as discussões incessantes, nada dizem (e nada, neste caso, é quase um elogio). Seus personagens são meros receptáculos para as idéias geniais do diretor (como, por exemplo, perceber que a inexistência de Deus pode ser comprovada pela dor das formigas ao serem mortas por nós a cada pisada no chão). As situações que cria (pois um filme-discurso precisa existir a partir de situações) nunca chegam a ter grau algum de profundidade, pois o pensamento por trás delas é totalmente ralo. As metáforas presentes durante todo o filme não alcançam vôos maiores, pois simplesmente não têm substância para existir.

Makhmalbaf mudou de país para fazer O Grito das Formigas, mas seu cinema está estacionado. O diretor repete exatamente os mesmos problemas de seu filme anterior, e isto não pode ser boa notícia, considerando que seu filme anterior tinha muitos deles. Em Sex and Philosophy, podíamos pelo menos dar risadas involuntárias e esperar que o cineasta corrigisse seu rumo. Quando ele o reafirma, porém, é caso de se preocupar. O diretor iraniano parece acreditar que, com suas indagações infantis, conseguirá mudar as crenças do mundo, e a volta para a Índia (país profundamente religioso) pertence a essa esperança. Talvez seja o caso de sugerir a ele que, antes de tornar-se um novo Manoel de Oliveira, voltasse a ser o velho Mohsen Makhmalbaf. Ou que, infelizmente, silenciasse seu cinema, que a cada filme extremamente discursivo e pretensamente profundo vem se tornando mais e mais irrelevante.


Leonardo Levis