Um
casal, um quarto de motel. Partindo dessa simplória
premissa, o chileno Bize constrói um curioso exercício
de cinema. Tudo começa ao final de uma relação sexual.
O diretor e seu roteirista Julio Rojas vão se inserindo
gradativamente no universo do casal, criando uma forte
cumplicidade com a platéia, pois vamos conhecendo um
pouco dos personagens à medida que eles também vão conhecendo
um ao outro, quando se revela que Daniela e Bruno trocaram
apenas poucas palavras em uma festa antes de partir
para as vias de fato.
Se fica ainda a muitos passos de realizar um filme brilhante,
Bize consegue explorar com marcante eficácia um argumento
carregado de aparentes limitações. Sua câmera transita
inquieta pelos exíguos espaços do quarto, percorrendo
ambientes e retratando corpos. O filme foge às tentações
de incorrer numa mera ilustração de diálogos inseridos
num roteiro que não deixa de carregar um quê de teatral.
Ao imprimir a maior parte do tempo uma leveza a suas
imagens, leveza essa coerente com tema e ambiente tratados,
surge em Na Cama uma feliz reprodução das sensações
– paradoxais e ao mesmo tempo complementares – de intimidade
e afastamento, vivenciadas por um homem e uma mulher
beirando os trinta anos cujas vidas, encerrado o tempo
narrativo, muito provavelmente jamais voltarão a se
cruzar.
Mesmo que por vezes escorregue numa estrutura um tanto
presa à dramaturgia, já que dos diálogos entre o casal
vão surgindo periodicamente várias novas revelações
num curto espaço de tempo, vemos em Matias Bize e seu
Na Cama um profundo desejo de inquietação, de
descoberta de algo novo, como a atração que leva Bruno
e Daniela ao quarto de motel. Como o casal que tenta,
ao menos por um breve tempo, fugir das limitações de
sua vida cotidiana e seu futuro de felicidade incerta,
Bize vai aqui mergulhando em motivações individuais,
busca seguir um rumo diverso dos preceitos de “conteúdo
social”, os quais, se obviamente não estão inseridos
na totalidade do universo do cinema latino-americano,
certamente povoam sobremaneira a sua vertente com a
qual temos um maior contato.
Gilberto Silva Jr.
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