A
seqüência-resumo que abre o filme é confusa e ultra-estilizada:
planos rápidos e que mostram as coisas apenas pela metade,
mudanças bruscas de cor na passagem entre as imagens,
informações jogadas de modo que propositalmente não
se completam, edição de som acavalada. Depois, em ritmo
mais leve, os personagens vão sendo apresentados e começam
a preencher uma historinha que já conhecemos, daquelas
com gangsteres que parecem figuras de HQ e diálogos
que oscilam entre os pontos centrais da trama e as divagações
sobre cultura pop ou sobre coisa nenhuma que há dez
anos tinham lá seu charme pós-Pulp Fiction. Em
seu dia de azar, Slevin (Josh Hartnett) entra de gaiato
numa confusão que envolve a antiga rivalidade entre
dois mafiosos. Muito cedo percebemos que ele é o menino
da história contada no início por Goodkat (Bruce Willis
pouco exigido e, por conseguinte, funcionando no piloto
automático), matador profissional frio e infalível.
Sua participação nessa confusão, portanto, não é tão
por acaso quanto parece, como se revelará gradativamente
após o grande ponto de virada do filme.
À exceção das cenas de Slevin com sua extrovertida vizinha
Lindsey (Lucy Liu), feitas num tom de comédia romântica
que faz o filme respirar minimamente, no restante há
uma mão pesada tanto na direção quanto na montagem.
É raro ver um plano de Xeque-mate que realmente
queira mostrar alguma coisa, ou extrair algo dos atores,
ou construir uma relação verdadeira entre eles. Tudo
se resume a um jogo com as imagens e com as informações
parciais da narrativa. Quando a trama se deflagra um
plano de vingança detalhadamente arquitetado por Slevin
e Goodkat, a principal influência de McGuigan para realizar
este filme vem à tona. O enredo de vingança de Xeque-mate
é claramente derivado de filmes como Old Boy
e Lady Vingança, do coreano Park Chan-wook. Até
os flash-backs cheios de maneirismos fotográficos
e os cenários que confundem as dimensões do espaço lá
estão, alguns desses cenários sendo quase plágios das
locações das cenas clímax de Old Boy. Por mais
que os truques do cinema de Park sejam cansativos e
se auto-esgotem, ele possui um talento evidente para
compor imagens marcantes pelo grafismo e pela iconicidade,
e também para algumas gags de humor negro. McGuigan,
contudo, não possui nenhum atrativo de estilo para empacotar
a trama enfadonha. O tema da filiação, pois tudo passa
por uma relação entre pai e filho (biológico ou adotivo),
também flutua como algo mais que o filme incorpora a
seu tabuleiro de xadrez, mas sem muita convicção, sem
achar uma forma, de fato (o que vemos são remendos de
plágios e estilizações claudicantes). Bobeira por bobeira,
é melhor deixar que esse tipo de filme continue sendo
feito por Park Chan-wook mesmo.
Luiz Carlos Oliveira Jr.
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