Essa sessão é atualizada semanalmente.

ARTIGOS
Jose + 10 = 0
(sobre um comercial da Adidas)
por Luiz Carlos Oliveira Jr. (12/06/2006)

Ser ou não ser
(sobre o reality show Made)
por Luiz Carlos Oliveira Jr. (02/05/2006)

FILMES DA SEMANA
(29 DE MAIO A 16 DE JULHO DE 2006)


Dia 29/5
Monte Hellman está em todos os lugares. Esteve nesta última edição do Festival de Cannes, como presidente do júri da mostra un Certain Regard, e também apresentando seu mais recente filme, o média-metragem Stanley's Girlfriend. Ele também está nas promoções de DVDs de um hipermercado carioac com seu Cavalgada no Vento (Ride in the Whirlwind, 1965). E, por fim, também está na programação de televisão a cabo nesta semana, com O Tiro Certo (The Shooting, 1967), possivelmente o western mais abstrato de todos os tempos – inclusive em seu título –, com Jack Nicholson, Warren Oates e Millie Perkins no elenco e uma apropriação do ritmo e dos temas do faroeste que estão entre as coisas mais aventurosas já feitas no gênero. O filme passa às 22:00 no Telecine Cult. À meia-noite, no Eurochannel, mais Cannes: a atriz Maria de Medeiros aproveitou sua presença em Cannes para entrevistar uma série de críticos e diretores de cinema e fazer Bem me Quer, Mal me Quer (Je t'aime moi non plus, 2004), sobre a eterna querela da crítica. Apesar de não chegar exatamente a lugar nenhum, o filme é bem interessante de se ver, nem que seja para travar contato com a opinião dos diretores e com o rosto dessas figuras sem rosto que são geralmente os críticos de cinema. Mas essas não são as duas únicas atrações do dia: às 19:30, no Canal Brasil, passam dois filmes raros de Ivan Cardoso, Ruínas de Murutucu (1976) e Sexo, Drogas e Rocn'n'roll (1999).
Dia 30
Confidências à Meia-Noite (Pillow Talk, 1959) é possivelmente a comédia romântica mais completa de Doris Day e Rock Hudson, conforme um artigo recente daqui da revista tentou mostrar. O filme, dirigido por Michaal Gordon, passa no Film & Arts às 20:00. Mas a atração mais curiosa da noite é sem dúvida Memória e História em Utopia e Barbárie (2005), filme de Sílvio Tendler que é uma espécie de Chatô do documentário brasileiro no quesito "produção que só o diretor parece entender"e no sentido "quantas regalias, hein". Curiosamente, o filme não estréia grande num desses festivais da vida, mas na televisão. Ou então é possível que essa exibição seja apenas a versão beta de alguma coisa maior, só para dar satisfação ou calar algumas vozes que tentam entender por que o cineasta de Glauber o Filme e Castro Alves não completa seu filme e precisa ainda viajar para uns 30 países e mais 5 planetas. Seja o trabalho completo, seja uma parte do percurso, o filme será exibido no Canal Brasil, na sessão É Tudo Verdade, às 22:40. Mas talvez seja de fato mais proveitoso assistir a outro filme dirigido por verdadeiros highlights do cinema brasileiro, Sertão de Acrílico Azul Piscina (2004), de Karim Aïnouz e Marcelo Gomes, que o mesmo canal exibe às 19:30.
Dia 31
Numa quarta-feira sem muito brilho ou destaques, o Eurochannel exibe um dos primeiros filmes de Pier Paolo Pasolini, Mamma Roma (1962). O filme é muito famoso pela estrondosa atuação de Anna Magnani, mas esse segundo filme de Pasolini é ainda uma etapa para um estilo que chegará em toda sua força apenas no longa-metragem seguinte, O Evangelho Segundo São Mateus (1964). Em todo caso, ainda em seus primeiros filmes mais próximos à herança do neo-realismo há talento e lirismo demais para considerarmos os filmes pré-64 como um período de aprendizagem. E isso tanto Accatone – Desajuste Social quanto Mamma Roma, e principalmente o genial curta A Ricota (do filme RoGoPaG) testemunham muito bem. O Eurochannel exibe o filme às 23:30.
Dia 01/6
O site do Canal Brasil foi reformulado, ficou mais bonito e mais prático, mas voltou a repetir uma falha que não acontecia há tempos: esquecer de colocar a programação do mês seguinte no ar. Assim, não temos acesso ao que o canal exibirá até domingo, e o mesmo aconteceria com o Film & Arts, que também não permite ver a programação do mês seguinte,se não fosse o completíssimo site "Tudo no ar" da Uol. Nessa quinta-feira não teremos clássicos estreando na programação do Telecine Cult, como de praxe, mas alguns filmes recentes pelos quais não nutrimos uma paixão maior: primeiro trata-se de Voando Alto (View from the Top, 2003), dirigido por Bruno Barreto e estrelado por Gwyneth Paltrow, que passa no Cinemax às 22:00. Naturalmente, o único interesse é o fato de ser o filme de um brasileiro em Hollywood e nada mais. No mesmo horário, só que no Telecine Cult, estréia Oldboy (idem, 2003), filme do diretor coreano Park Chan-wook. Park – na Coréia, como em Hong Kong, em Taiwan e na China, os nomes dos diretores é o primeiro, a não ser quando eles ocidentalizam, como no caso de Edward Yang – é um diretor celebrado por muitos, e tem um inegável talento visual (como comprova a melhor cena de Oldboy, a pancadaria num corredor exíguo), mas ao mesmo tempo um senso de provocação bastante estéril e malandragens de roteiro que de fato deveriam ter permanecido escondidas na cartola do mágico. Lady Vingança, seu mais recente filme, é bem mais atrativo visualmente – estonteante, por momentos –, mas é também mais pueril e vagabundo.
Dia 02
Steve McQueen e James Coburn estão em O Inferno É para os Heróis (Hell Is for Heroes, 1962), filme de guerra de Don Siegel que recebe algumas páginas no famoso livro de entrevistas que Peter Bogdanovich fez com vários diretores americanos, Afinal, quem faz os filmes?. Produção conturbada, sobretudo por brigas entre o roteirista original e o protagonista Steve McQueen, o filme no entanto apresenta várias soluções interessantes,tanto visual quanto narrativamente. Curiosamente, a década de 60 é tanto o período em que Siegel conseguiu alguns de seus melhores filmes, como Os Assassinos (1964) e Meu Nome É Coogan (1968), mas ao mesmo tempo trabalho como diretor para a televisão, algo bem menos prestigioso naquele período, fazendo episódios das séries Além da Imaginação, Breaking Point e Bus Stop. Don Siegel, como André de Toth, é puro cinema físico. O filme passa no Telecine Cult às 22:00. Mais cedo, às 18:45, o Cinemax exibe Como Nasce um Bravo (Cowboy, 1958), de Delmer Daves. Diretor de gênero, famoso por seus faroestes (3:10 to Yuma, The Last Wagon) ou o noir Bogart-Baccal (Prisioneiro do Passado), Daves tem uma marca distintiva, mas sua preocupação visual caminha sempre no sentido de um certo exibicionismo de movimentos câmera que, se na época era incomum, hoje tornou-se um vício bastante partilhado por Hollywood e pelos cinemas mais independentes (Iñarritu, PT Anderson, entre outros). Mas como é incomum encontrarmos estréias de filmes antigos de alguma relevância depois que o TCClassic virou TCCult e a DirecTV criminosamente desligou seu RetrôTV, vale mais é assistir mesmo.
Dia 03
Cruzada no Telecine Premium ou Dança Comigo na HBO? Com uma escolha dessas, Sofia mandava tranqüilamente as duas para o forno e ia ver Amor à Flor da Pele (Fa yeung nin wa, 2000), filme que tirou Wong Kar-wai de um circuito mais alternativo e levou-o direto ao superestrelato do circuitinho autoral, como uma espécie de novo Fellini numa estética plenamente discernível, cheia de uma visualidade perceptível utilizando um tipo particular de excessos no artificialismo para construir um universo. Mergulho na estabilidade e no conforto de autor, com tudo que a expressão faz meter medo? Não exatamente. Se Amor à Flor da Pele mostra uma sedimentação em relação a uma obra que era inteiramente construída em torno da instabilidade e do descentramento, é acima de tudo porque Wong aqui decide trabalhar com outro tipo de época e, sobretudo, um outro registro de personagens, no caso mais velhos do que aqueles que costumeiramente eram seus heróis. 2046 retoma muito do
clima de desesperança e do caráter heraclitiano presente nos filmes antigos. Amor à Flor da Pele, ainda que seja o mais próximo que Wong chegou do academicismo e de uma aceitação até de setores mais conservadores, é ainda um puro deleite. Entra na programação do Telecine Classic às 22:00. E, só para lembrar, temos aqui mais Cannes, já que Wong Kar-wai foi o presidente do júri da competição oficial esse ano.
Dia 04
Mais um filme de Blake Edwards reestreando nos canais da Globosat. Dessa vez, é Anáguas a Bordo (Operation Petticoat, 1959), estrelado por Cary Grant e Tony Curtis. É um dos primeiros filmes de Edwards, numa época em que ele ainda vivia entre a televisão e o cinema, sem um sucesso que o catapultasse ao "time A" de diretores de Hollywood, coisa que aconteceria com Bonequinha de Luxo dois anos depois. Sessão matinée de domingo no Telecine Cult, às 14:05. Boa maneira de se passar o último dia do fim-de-semana.
Dia 05
Força Diabólica (The Tingler, 1959) é um dos mais famosos filmes de William Castle, diretor de westerns que no final da década de 50 entrou no filão dos filmes de terror, criando estratégias de divulgação bastante incomuns, como colocar poltronas que tremiam nos momentos de terror (neste filme) ou garantir um seguro de vida para aqueles que fossem acometidos pela morte de tã assustados pelo filme (com Macabro, 1957). Embora não tenha entrado para o panteão de grandes diretores de cinema fantástico (lugar que pertence a Tourneur, Bava, Carpenter entre outros), Castle merece mais atenção do que lhe é dada hoje. E ainda temos a chance de ver Vincent Price e, segundo dizem, a primeira viagem de LSD encenada no cinema. Tudo isso no Cinemax às 17:00. Mais à noite, o Telecine Emotion estréia em sua programação o filme Marie-Jo e Seus Dois Amores (Marie-Jo et seus deux amours, 2002), de Robert Guédiguian. O ponto alto do filme é que não se trata simplesmente de uma intriga de troca de casais, mas de uma mulher que, mesmo amando seu marido, se apaixona também por outro homem. Guédiguian sustenta com muito talento a densidade psicológica necessária a esse tipo de situação limite, e Ariane Ascaride dá seu costumeiro show de interpretação. Pode-se preferir outros trabalhos do diretor a este – sobretudo Marius e Jeanette, À Vida, À Morte e A Cidade Está Tranqüila –, mas ainda assim a saga de Marie-Jo tem sua força. Passa às 22:00.
Dia 06
Aproveitando que nessa semana só se fala em Copa do Mundo, a sessão É Tudo Verdade do Canal Brasil decide exibir Garrincha, Alegria do Povo (1963), de Joaquim Pedro de Andrade. O filme é mais do que um simples documentário na história do cinema brasileiro, pois nele tenta-se dar conta de uma série de influências que começavam a pulular ao redor do mundo, sobretudo na França e nos Estados Unidos. Foi o primeiro filme brasileiro a deflagrar questionamentos e polêmicas sobre o "cinema-verdade" (que naquele momento servia para denominar não só os filmes de Jean Rouch mas também o do cinema direto americano de Penebaker, Drew e Leacock) e sobre uma apreensão mais direta da realidade, fugindo do discurso documental nacional de então, que, calcado no documentário clássico, utilizava a figura do narrador onisciente como elemento organizador da totalidade do discurso. Problemáticas teóricas à parte – e convenhamos que as polêmicas em torno da "tomada do real" no documentário sempre foram um tanto quanto enfadonhas –, o filme é de uma vitalidade impressionante, e interessa ainda hoje não só a admiradores de futebol e/ou de documentário, mas qualquer um que gosta de ver um bom filme. Passa às 22:35.
Dia 07
Num dia sem grandes estréias e destaques raros ainda não-mencionados nesta tribuna, temos a chance de voltar sobre alguns diretores que, apesar de terem trajetórias e reconhecimento inteiramente diferentes, caíram hoje num quase esquecimento. Primeiro temos George Stevens, diretor de filmes pra lá de famosos como Um Lugar ao Sol, Os Brutos Também Amam e Assim Caminha a Humanidade. Não são filmes costumeiramente admirados pelos maiores defensores do cinema de autor, e isso de certa forma explica por que fala-se muito desses três filmes (e de alguns poucos a mais, na verdade), mas quase nada da carreira dele e dos filmes feitos dos anos 40 para trás. Filmes que, curiosamente, são considerados mais contidos e organizados segundo uma lógica bem melhor construída e matizada. Um desses filmes é Original Pecado (The More the Merrier, 1943), comédia romântica com Jean Arthur e Joel McCrea que o Cinemax exibe cedinho, às 09:30. À tarde, às 15:00, temos O Pistoleiro (The Stranger Wore a Gun, 1953), de André de Toth, um diretor que nunca dirigiu um grande blockbuster e que teve uma admiração restrita aos cinéfilos americanos (nem na França existe algo mais sólido sobre sua carreira), como gênio do cinema físico, entre Fuller e Siegel. Já na madrugada de quarta para quinta-feira, às 04:30, o Cinemax Prime exibe Ratos Humanos (Tight Spot, 1955), de Phil Karlson, outro diretor americano que goza de uma fama talvez ainda menor do que a de de Toth, em grande parte também por ter trabalhado em produções B de filmes de gênero. Se os diretores caíram no esquecimento, seus atores não: Randolph Scott para O Pistoleiro, Ginger Rogers e Edward G. Robinson para Ratos Humanos.
Dia 08
Falando em atores, nesta quinta-feira o Telecine Cult inicia as comemorações dos 80 anos de nascimento de Marilyn Monroe com duas comédias de 1953, Os Homens Preferem as Loiras (Gentlemen Prefer Blondes), às 20:00, e Como Agarrar um Milionário (How to Marry a Millionaire), às 22:00. O primeiro não é exatamente a melhor maneira de começar a ver as comédias de Howard Hawks, já que o diretor nunca teve muito boas palavras para falar do filme, que considerava cafona ("phony") e nem chegou a dirigir inteiro, deixando a cargo da equipe técnica as filmagens de alguns dos números musicais, entre os quais o famoso "Diamonds Are a Girl's Best Friends". Ainda assim, o filme alcança momentos de graça possivelmente maiores do que no filme de Jean Negulesco, certamente mais profissional e focado,mas sem os toques que tornam as comédias de Hawks tão deliciosas de assistir. Além desses dois filmes, o Telecine Cult ainda exibirá mais oito títulos com MM até o final de julho.
Dia 09
Os dois maiores destaques da semana, no entanto, aparecem nesta sexta-feira, em horários semelhantes. Às 21:30, o Cinemax Prime finalmente mostra a versão original de Kung Fu Futebol Clube, ou Shaolin Soccer (Siu lam juk kau, 2001), de Stephen Chow, retalhado em 25 minutos pela produtora americana do filme, Miramax. O filme foi o primeiro grande lançamento ocidental de um filme de Stephen Chow, mas geralmente as pessoas que assistiram ao filme viram o "corte alternativo" da companhia de Harvey Weinstein, tanto no cinema quanto no dvd. O lançamento nacional em dvd seguiu o caminho, e agora finalmente teremos a chance de ver o filme que precedeu o adorável Kung-Fusão (Kung Fu, 2004) em sua montagem original, como o filme foi concebido pelo seu diretor. Já no Telecine Cult às 22:00 passa James Dean, o Mito Sobrevive (Come Back to the Five and Dime, Jimmy Dean, Jimmy Dean, 1982), um dos filmes menos conhecidos de Robert Altman, indisponível em dvd tanto no Brasil quanto nos EUA. O filme, no entanto, não é uma biografia do astro que morreu jovem, mas o encontro de um fã-clube de admiradoras do ator que se reúne para comemorar o aniversário de sua morte. O filme foi adaptado para o cinema pelo próprio autor da peça, Ed Graczyk.
Dia 10
Para a grande estréia do sábado, a HBO oferece Capitão Sky e o Mundo de Amanhã (Sky Captain and the World of Tomorrow, 2004), de Kenny Conran
. O filme traz Gwyneth Paltrow e Jude Law entre cenários inteiramente feitos em computação gráfica retro-futurista. Ainda que seja uma experiência interessante, o filme nada mais é do que algo curioso, um espetáculo que atrai mais pela proeza do que pela estética, aqui puramente funcional (ao contrário de Sin City, feito a partir de procedimentos semelhantes, mas infinitamente mais interessante). O filme estréia às 21:00. Já o Telecine Premium traz Alfie – O Sedutor (Alfie, 2004), de Charles Shyer. Mais uma vez o astro é Jude Law, dessa vez numa refilmagem do original de 1966 protagonizado por Michael Caine. O mínimo que se pode dizer é que é um grande desafio e que Jude Law garantiu-se muito bem, compondo um personagem talvez ainda mais dúbio em seu arquétipo de Don Juan estilhaçado. O filme passa às 22:00, e se quisermos comparar com o original de Lewis Gilbert (com fenomenal música de Sonny Rollins), poderemos vê-lo no Telecine Cult às 19:55, numa dessas tabelinhas costumeiras remake-original que a Globosat anda fazendo (a última, se vocês bem lembram, foi com O Vôo da Fênix). Um detalhe: o Alfie original chama-se Como Conquistar as Mulheres? Mais uma boa curiosidade do Telecine, agora o Emotion: A Casa do Sim (The House of Yes, 1997), primeiro longa-metragem dirigido por Mark S. Waters, diretor de duas belas comédias, uma romântica (E Se Fosse Verdade) e uma ácida (Meninas Malvadas). A Casa do Sim conta com o então iniciante Freddie Prinze Jr. em seu primeiro filme como protagonista. Boa oportunidade de travar contato com uma parte mais obscura da carreira de um dos diretores de gênero mais promissores dos últimos anos no cinema americano.
Dia 11
Por fim, um mistério e uma curiosidade. Esse mês, o Canal Brasil começa a exibir O Gato (2004), um média quase longa-metragem (58min) realizado entre 1986 e 1988 no Rio Grande do Sul em 16mm e apenas finalizado há dois anos. Ironicamente, o filme vem se inscrever tardiamente na história pioneira do cinema gaúcho dos anos 80, junto a projetos como Deu pra Ti Anos 70 e Verdes Anos. Mais detalhes sobre o filme podem ser encontrados na página que a Casa de Cinema dedicou ao filme quando de sua première numa sala portoalegrense. O filme passa às 02:50 na madrugada de domingo para segunda-feira, é dirigido por Saturnino Rocha e conta na ficha técnica com um monte de nomes conhecidos do hoje solidificado cinema gaúcho (Henrique de Freitas Lima, Giba Assis Brasil). O filme é estrelado por Giuseppe Oristânio.
Dia 12
Com o início da Copa do Mundo, quase todas as atenções da mídia se dirigem para o futebol. Mesmo na área cinematográfica, poucos são os cinéfilos brasileiros que não se rendem à competição, às vezes até aproveitando a ocasião para desovar um ou outro produtos feitos mais ou menos para capitalizar em cima da atenção que o esporte bretão tem por parte de um contingente significativo da população brasileira. Em Contracampo, uma maioria segue os jogos avidamente, e as discussões passam a ser mais sobre os jogos do dia do que sobre as estréias da semana. Mas quem decidir abdicar inteiramente de assistir a filmes na televisão a cabo ou, no mínimo, gravar os filmes para vê-los depois do campeonato, pode perder uma pérola ou duas. O fato é que a semana está recheada de estréias e filmes dignos de interesse, ainda que nada de extraordinariamente raro e acachapante ganhe espaço na programação. Ainda assim, boas apostas e opções curiosas de fruição para um público mais exigente. por exemplo, pode não ser grandes coisas, mas Nana (2003), cuja primeira parte passa no Eurochannel às 18:00, é um telefilme em dois episódios baseado no mesmo livro de Émile Zola que Jean Renoir adaptou em 1926, com a mítica Catherine Hessling. Quem assume essa função neste novo filme dirigido por Edouard Molinaro é Lou Doillon, filha do cineasta Jacques Doillon e da cantora/atriz Jane Birkin. Opção naturalmente melhor que as duas bombas que o Telecine Cult estréia para o fim da noite, Dogma do Amor de Thomas Vinterberg (It's All About Love, 2003) às 22:00 e Um Coração para Sonhar de Pupi Avati (Il cuore altrove, 2004) às 23:55. Entre os dois, poucas semelhanças além do fato de terem sido estreados em grande estilo e pompa, e desabonarem até os admiradores mais fervorosos de ambos cineastas (ainda que, pensando bem, creio que Avati não deve ter admiradores fervorosos exceto seus familiares). Em todo caso, o melhor mesmo é assistir a Eletrodoméstica (2005), filme de Kléber Mendonça Filho que passa no Canal Brasil num prêmio que a emissora dará a um curta-metragem escolhido entre vários. O filme passa às 00:15 e fazemos figa para que nosso colega – pois, além de cineasta talentoso, também milita na crítica e é convidado do nosso quadro de cotações – fature o prêmio, seja ele qual for.
Dia 13
No dia do primeiro jogo do Brasil, que tal comemorar assistindo a um desses filmes que são puro tributo à beleza, à complexidade dos planos, ao talento da direção em transfigurar o espaço visual e fazer do cinema uma arte que fala uma linguagem inteiramente autônoma das outras artes. Falamos de Orson Welles e de seu A Marca da Maldade (Touch of Evil, 1958), que passa no Film & Arts às 22:00. O filme não é exatamente raro de ser exibido – aliás, o Film & Arts tem um grupo seleto de filmes à sua disposição, mas infelizmente os repete à exaustão –, mas nem sempre de raridades vive a televisão a cabe. Muito pelo contrário, aliás. No mesmo horário, há sempre uma aposta a fazer com Marionetes (Strings, 2004), filme dirigido pelo dinamarquês Anders Rønnow Klarlund, que utiliza animação de bonecos como processo para contar uma historinha mítica de um filho que vai vingar seu pai. Uma opção mais interessante, no entanto, é Passe Livre (1974), documentário de Oswaldo Caldeira sobre a famosa questão do passe no futebol, que a seção É Tudo Verdade exibe no Canal Brasil às 22:35. Até agora, a parasitagem futebolística ao menos está trazendo filmes pertinentes e relevantes, que merecem uma atenção que geralmente não lhes é devida, ou simplesmente, como é o caso agora, filmes que tem uma visibilidade quase negativa. Tomara que não tenhamos que descambar para o filme da Copa feito por Murilo Salles...
Dia 14
Num dia sem destaques, vale apenas mencionar a estréia na programação da rede Telecine de Wilbur Quer se Matar (Wilbur Wants to Kill Himself, 2002), longa-metragem da diretora Lone Scherfig que segue-se ao "filme dogma" Italiano para Iniciantes. É o terceiro destaque dinamarquês da semana – quem sabe, para atenuar a ausência do país na Copa... –, ainda que nenhum desses seja mais do que uma mera curiosidade, e, no caso do filme de Vinterberg, de algo a manter distância. Telecine Emotion, às 22:00.
Dia 15
Mais uma quinta-feira de Marilyn Monroe, desta vez com O Mundo da Fantasia (There's No Business Like Show Business, 1954), filme dirigido por Walter Lang em que a verdadeira protagonista é Ethel Merman, e la Monroe ocupa apenas um papel secundário. O filme passa às 20:00 no Telecine Classic. Em seguida, às 22:00, um verdadeiro clássico: O Pecado Mora ao Lado (The Seven Year Inch, 1955), grande filme de Billy Wilder que eternizou Monroe com a cena do vestido subindo e que é muito provavelmente a primeira obra a aproveitar o máximo de sua persona entre a total sedução e a plena vulgaridade. Mas o verdadeiro destaque do dia é o raríssimo O Pornógrafo (1970), obra seminal do chamado "cinema marginal" em sua vertente Boca do Lixo. Amigo de Carlos Reichenbach (que é ator no filme), João Callegaro fez este filme e nunca repetiu a dose com outro longa. Mas O Pornógrafo está aí, pronto para ser descoberto ou redescoberto e finalmente atingir a posição que merece dentro do cinema brasileiro. O filme passa na seção Brasil Cult, às 22:35.
Dia 16
Julieta dos Espíritos (Giulietta degli spiriti, 1965), um dos filmes menos conhecidos de Federico Fellini, passa no Eurochannel às 22:00. O filme inicia uma densificação da obra de Fellini, uma saturação de signos já longe de filmes como Noites de Cabíria ou A Doce Vida. Como tal, foi muito mal visto e mal falado na época, e o filme bem mereceria uma reavaliação levando em conta o papel do filme dentro da evolução de sua estética. Já no Cinemax, no mesmo horário, passa Mondovino (idem, 2003), documentário sobre como a globalização afeta a produção mundial de vinho em seus aspectos econômicos, culturais e pessoais, e como se tende – e esse talvez de fato seja o maior mérito do filme, que no geral é desigual e meio monótono de assistir – a uma uniformização do gosto baseada em fontes monopolísticas de legitimação do bom gosto e forçam a produção mundial se curvar a um padrão específico que mata progressivamente a diversidade de gostos e modos de produção. Bom, e não é um processo que vemos também progressivamente no cinema, com as grandes estréias tomando quase metade do circuito exibidor das grandes cidades?

Dia 17
O Fantasma da Ópera de Joel Schumacher às 22:00 no Telecine Premium de um lado,e do outro Um Presente para Helen de Garry Marshall às 21:00 na HBO do outro. Isso é uma disputa? Só se for para saber qual deles é menos atração principal da semana. Em compensação, temos boas atrações fora dos destaques do horário nobre e dos canais de filmes recentes. Como por exemplo Alice Não Mora Mais Aqui (Alice Doesn't Live Here Anymore, 1974), filme de Martin Scorsese que o Cinemax Prime exibe às 21:30, ou a versão de O Fantasma da Ópera de 1943 dirigida por Arthur Lubin e estrelada por Nelson Eddy que o Telecine Classic para como antepasto para o pasto (com trocadilho, claro) de Joel Schumacher. E, antecipando algo que será tratado mais longamente na próxima edição de Contracampo, temos no Canal Brasil dois filmes, um que não estreou e outro que estreou mal e porcamente num cinema longínquo e ficou apenas uma semana em cartaz. Às 23:30, passa Viva Sapato! (2004) de Luiz Carlos Lacerda, e em seguida, à 01:15, passa O Circo das Qualidades Humanas (2004), rara produção de longa-metragem mineira, num filme em episódios que conta com o louvável nome de Geraldo Veloso – cineasta do ótimo Perdidos e Malditos –, além de Milton Alencar Jr., Jorge Moreno e PaulO Augusto Nunes. O primeiro filme passa no quadro "Seleção Brasileira", numa metáfora não muito feliz em momento de Copa do Mundo. Afinal, se tivéssemos que exibir nossa proficiência cinematográfica com o grotesco e risível filme de Lacerda, provavelmente ficaríamos atrás até de Papua Nova Guiné, mesmo que lá nunca tenham feito nenhum filme.
Dia 18
Mais um filme sobre marujos cantantes que passeiam pela França? Sim, mas desta vez quem dirige é Richard Quine, que na década de 50 não era um diretor como os outros, mas o realizador de algumas das mais charmosas comédias de sua década (que, convenhamos, não foi modesta em ótimos diretores de comédia). Trata-se de Três Marujos em Paris (So This Is Paris, 1955), um musical com Tony Curtis, Gene Nelson e Paul Gilbert como os protagonistas do título. O filme passa às 14:30 no Telecine Classic. À noite, podemos ficar com qualquer uma de duas estréias pouco estimulantes. Um é O Milagre de Berna (Das Wunder von Bern, 2003), de Sönke Wortmann, sobre a vitória da seleção alemã na Copa do Mundo de 1954, e o segundo é Viva Voz (2003), de Paulo Morelli, filme-painel da produtora O2 sobre a classe média paulista. Elogiados pela imprensa menos criteriosa, ambos os filmes passam às 22:00. Nesse caso, talvez seja melhor não torcer nem pelo Brasil nem pela Alemanha...

Dia 19
Quando Team America – Detonando o Mundo (Team America: World Police, 2004) entrou em cartaz nos Estados Unidos, boa parte da mídia ficou dividida porque o filme faz deboche tanto do discurso oficial da mídia quanto dos pilares de um discurso mais dissonante e crítico da hegemonia americana, como o presidente norte-coreano kim Jong-Il e o ator Sean Penn. Realizado por Trey Parker e concebido por Parker com Matt Stone – ou seja, os criadores da série South Park –, Team America não foi lançado nos cinemas brasileiros, sabe-se lá por quê. Sabe-se, sim, que essa dupla realizou um filme que trabalha todo o subconsciente americano, as certezas, as paranóias e tudo mais que seja referente ao papel intervencionista dos EUA no mundo (o título em inglês se refere ao país como uma "polícia mundial"). Mas o interesse deles não é exatamente ideológico – não se sai exatamente "torcendo" pró ou contra guerra –, mas um retrato em forma de achincalhe dos lugares-comuns da sociedade americana. Pena que eles sejam tão irregulares em todos os seus projetos, alternando momentos brilhantes com tiradas inteiramente tediosas, e curiosamente fazendo do riso uma estratégia não de perspectivação dos costumes sociais, mas uma forma de confortável através do riso. O filme estréia no Telecine Premium às 20:10. Mais tarde, às 22:35, o Canal Brasil exibe Panca de Valente (1968), possivelmente o longa-metragem menos conhecido de Luís Sérgio Person, realizador dos belíssimos São Paulo, Sociedade Anônima (1965) e O Caso dos Irmãos Naves (1967). Person foi recentemente homenageado pelo Festival Brasileiro de Cinema Universitário, e por sua filha, Marina Person, que lhe dedicou um documentário, Person, também exibido no FBCU. Mais tarde no mesmo Canal Brasil, teremos o primeiro filme de um ciclo dedicado aos filmes de Helena Ramos, mus maior da pornochanchada paulista. O filme que inicia o ciclo é Crazy, um Dia Muito Louco (1981), penúltimo filme de Victor Lima, cineasta mais conhecido por sua produção entre os anos 50-60 nas comédias da Herbert Richers. O filme passa às 00:30.
Dia 20
A estréia do dia é Um Vazio no Meu Coração (Ett Hål i mitt hjärta, 2004, dir. Lukas Moodysson), sensação negativa do Festival do Rio de 2004, onde o filme chegou até a ganhar avisos na porta do cinema por seu conteúdo explícito e por sua linguagem incomum, tantas eram as reclamações por parte do público. Mas, ao contrário do que possa parecer nesse caso, não é que a estética do filme esteja à frente da percepção do público. O filme se desenvolve num registro entre obscenidade e ingenuidade que é francamente banal, além de fazer uso de imagens "chocantes" como motivo fácil de buchicho e escândalo. Aparentemente, Moodysson funciona mais como contador de histórias certinhas e algo comoventes que, mesmo estando há milhas do brilhantismo, mostram alguma eficiência em narração e construção de atmosfera, como em Amigas de Colégio e Bem-Vindos. O filme estréia no Telecine Cult às 22:00. Mas novamente os destaques do dia vão para o Canal Brasil, que exibe às 06:00 (isso mesmo, seis da manhã de terça-feira) o telefilme O Último Dia de Lampião (1972), raríssima obra de Maurice Capovilla, e dedica parte de sua programação a curtas-metragens de temática homossexual, a "Mostra Arco-Íris", com um filme recente de Luiz Carlos Lacerda, Homossexualidade e Cinema Brasileiro (2006), e mais alguns filmes que tocam diretamente no assunto: Parada de Orgulho Gay (também de Lacerda), Curta Seqüência – Alasca (de José Joffily), Cinco Naipes e No Coração de Shirley. Essa série de curtas começa às 20:00
Dia 21
Novamente é o Canal Brasil que salva um dia muito fraco em atrações, com um filme quase inédito e um clássico de Helena Ramos. O primeiro é Rua de Mão Dupla (2004), documentário de Cao Guimarães (dos premiados Da Janela do Meu Quarto e A Alma do Osso) feito a partir da idéia de "outro", com duas pessoas trocando de casa por 24 horas e filmando suas percepções a partir dessa casa provisória que o dispositivo do filme criou. Montado originalmente como uma instalação para a Bienal de São Paulo em 2002, as imagens de Rua de Mão Dupla foram depois reorganizadas e editadas, e passam no Canal Brasil às 04:30 de quarta para quinta-feira. Antes disso, mas ainda na madrugada, passa Mulher Objeto (1981), filme do hoje autor de novelas Sílvio de Abreu. O filme foi o maior sucesso de público e de crítica na carreira de Helena Ramos, e utiliza a atriz num imaginário que ela já tinha encarnado em Mulher, Mulher (1979) de Jean Garret: a mulher frígida que precisa descobrir o sexo de maneira fora da usual e que acaba encontrando o prazer apenas na transgressão. Nenhum dos filmes, no entanto, é exatamente um libelo à liberdade sexual feminina, e o tema "sexo como libertação" vai só até certo ponto. Em todo caso, tanto pelo talento quanto pelos temas que o filme encerra, vale bastante a pena assistir a Mulher Objeto.
Dia 22
Novamente Marilyn Monroe em sessão dupla, mais uma vez um diretor não muito conhecido fazendo um filme interessante e um diretor especial fazendo um filme lendário. Às 20:00, o Telecine Cult passa Nunca Fui Santa (Bus Stop, 1956), de Joshua Logan. O filme é mais conhecido por ser o momento na carreira de Marilyn em que ela queria mais do que ser simplesmente uma starlet, exigindo um papel que ela pudesse mostrar melhor suas habilidades de atriz. Logan, que simplesmente terminara de fazer o mesmo com Kim Novak em Picnic/Férias de Amor no ano anterior, consegue aqui extrair uma bela interpretação de MM (apesar de isso não ser suficiente para fazer de Nunca Fui Santa um filme tão memorável quanto Picnic). Às 22:00, passa um desses grandes clássicos que volta e meia ganha menções entre os melhores filmes de todos os tempos e é considerado por muitos a maior comédia de todos os tempos: Quanto Mais Quente Melhor (Some Like it Hot, 1959), onde Billy Wilder mostra para quem quiser ver que ele não é somente um roteirista que decidiu passar à direção por ciúme de seu material, mas um cineasta autêntico que realmente coloca todas as suas fichas na crença que o humor e a caricatura podem revelar muito sobre o comportamento humano. Trata-se de um filme que, para além de suas evidentes qualidades de escrita, apresenta formidáveis atuações do trio principal de atores – Jack Lemmon, Marilyn Monroe e Tony Curtis – e evidencia o mundo de Billy Wilder com um jogo de imagens que as pessoas constróem para si mesmas. Um prazer constante em ver e rever.
Dia 23
Enquanto o Telecine Classic estréia em sua programação um filme de Sidney Lumet que costumava figurar na programação do Film & Arts, Mulher Daquela Espécie (That Kind of Woman, 1959, às 22:00), a TV5 passa um desses filmes
recentes que os cinéfilos esperam ter a chance de ver nos festivais mas que acabam sendo preteridos por filmes de mais apelo de mídia. Le Monde vivant, de Eugène Green, passou no Festival de Cannes de 2003 e ganhou diversos elogios da imprensa como um dos filmes franceses mais interessantes de sua geração. Por seu filme anterior, Toutes les nuits, Green recebeu elogios até de Jean-Luc Godard, que não é exatamente um grande admirador de muita coisa que anda sendo realizada nos dias de hoje. Ainda assim, Eugène Green continua um desconhecido para o espectador brasileiro, jamais tendo qualquer de seus filmes exibidos sequer em festivais. Apesar do horário quase proibitivo, 03:10 na madrugada de sexta-feira para o sábado, Le Monde vivant é o grande destaque da semana na programação de filmes na tv a cabo.
Dia 24
Depois de alguns filmes que francamente não se explicam como destaques no horário nobre de sábado, finalmente temos dessa vez alguns filmes que, se não se enquadram nos padrões de vigor cinematográfico dos espectadores mais exigentes, ao menos se justificam pelo grau de atenção dado pela mídia e pela afluência do público. As 21:00 a HBO estréia Constantine (dir. Francis Lawrence, 2005), adaptação de história em quadrinhos que se aproveita de um certo tipo de charme dark concedido a Keanu Reeves por seu personagem em Matrix, e às 22:00 o Telecine premium exibe Ray (dir. Taylor Hackford, 2004), cinebiografia de Ray Charles protagonizada por Jamie Foxx que, apesar de eficiente e até emocionante em algumas cenas, não consegue fugir do esquema mais básico de ascensão-excesso-queda que permeia esses projetos de filme baseados em personagens talentosos de vida controversa (Johnny e June é outro exemplo mais recente). Mais vale então prestar atenção a um filme muito mais sincero e coerente em sua construção de mundo como Perdidos na Noite (Midnight Cowboy, 1969), dirigido por Schlesinger, que o Telecine Cult estréia em sua programação às 22:00, ou ao belo Bendito Fruto (2005), primeira produção de longa-metragem ficcional do Cecip de Eduardo Coutinho, dirigido com talento e sutileza por Sergio Goldenberg, que apresenta bastante talento ao fazer o filme passar do registro de uma comédia de costumes e evoluir narrativamente como um melodrama, tratando inicialmente de um único tema – preconceito de classe de um homem que não consegue admitir seu amor por sua empregada – e por fim ampliando-o num universo social mais amplo de dificuldade em fazer a convivência com o diferente reinar sobre os preconceitos adquiridos no convívio social (como a subtrama de amor gay,que aparece lá pela segunda metade do filme). Verdadeiro destaque do dia, o filme estréia como "Filme do mês" na sessão Seleção Brasileira do Canal Brasil às 23:00.
Dia 25
Se o sábado é o dia para os canais de estréias mais chamativas do ponto de vista do público geral, o domingo vem se revelando como o dia dos filmes-circuitinho, com o cinemax consolidando o horário da noite ao trazer sempre estréias de peso, e o Telecine Cult fazendo volta e meia algo semelhante. Dessa vez, quem ganha é o canal da HBO, já que o da Globosat exibe Contra a Parede (Gegen die Wand, 2004), filme de Fatih Akin que ganhou o prêmio máximo no Festival de Berlim em 2004, mas que não consegue escapar de uma narrativa de redenção final que acaba culpabilizando um modo de vida desviante e apela para um "retorno às raízes" como única forma de vida autêntica. Se a primeira parte do filme é estimulante e apresenta uma entrega aparentemente bastante honesta a seus personagens, a segunda parece querer fazer uma chantagem emocional com a primeira, nos fazendo rever nossa apreciação do prazer que sentimos acompanhando a vida turbulenta inicial do casal de protagonistas. Em todo caso, há de se admitir que Fatih Akin nesse filme apresenta um talento um tanto incomum que ultrapassa a mera eficácia narrativa. O filme passa às 22:00 no Telecine Cult. Já o Cinemax exibe o bem mais simpático Steamboy (Suchîmubôi, 2004), animação japonesa dirigida por Katsuhiro Otomo – sim, o mesmo de Metropolis e Akira – que encanta pela beleza de seu visual preciso e viajante, mas não se segura totalmente ao longo de sua duração (126'). Ainda que não apresente as fantasias vertiginosas e cativantes de um Miyazaki, Steamboy merece destaque tanto por suas qualidades quanto pela inexplicável pouca atenção que as animações japonesas em longa-metragem têm no circuito brasileiro, nos cinemas, nos festivais, nos lançamentos em dvd e na televisão a cabo.

Strip Search (idem, 2004), de Sidney Lumet, foi objeto de uma verdadeira celeuma nos Estados Unidos. Tendo como enfoque a restrição das liberdades individuais concedidas depois do 11 de setembro, o filme segue diversas narrativas paralelas, entre as quais uma mulher americana detida pelas autoridades chinesas e um árabe detido pelas autoridades americanas. Repleto de atores famosos (Maggie Gyllenhaal, Glenn Close, Ellen Barkin), o filme foi produzido pela HBO e exibido apenas uma vez na emissora americana. Depois disso, todos os horários de reexibição foram trocados e, tempos depois, o filme foi remontado e transformou-se num filme de 50 e poucos minutos. O filme enfureceu os patriotas americanos que defendem o "ato patriótico", e a censura (interna ou externa, sabe-se lá) decidiu dar ao filme a mínima visibilidade possível, e em seu formato cortado. segundo consta no site brasileiro, a HBO exibe hoje o filme em seu formato completo, naquilo que talvez seja uma das raras exibições que o filme terá até que essa espécie de embargo branco acabe (ou seja, quando as vagas da História tornarem esse assunto menos controverso), às 21:00. E não é só pelo escândalo que Lumet parece ter voltado com tudo à atenção dos cinéfilos. Seu mais recente filme, Find Me Guilty, teve uma excelente recepção por parte da crítica mais exigente, e novamente com um filme de temática fortemente política. Esse só veremos quando o filme estrear nos cinemas (Vin Diesel como protagonista parece ser garantia suficiente), mas Strip Search pode ser visto na noite de segunda-feira na HBO. Já o Canal Brasil exibe no horário nobre de 21:30 o mais recente filme de Zelito Viana. Não, ainda não se trata de JK, podemos ainda nos preparar para o que vem por aí. É um filme curto, e, segundo alguns comentários ouvidos, um digno documentário sobre a pintora naif Aparecida Azedo – Uma Vida em 24 Quadros (2005), vídeo que acaba de concorrer na competição de vídeos do Cinesul (sem prêmio, aliás).
Dia 27
Mais uma vez quem salva a terça-feira é o Canal Brasil. E desta vez com atrações sarapintadas ao longo da programação. Bem cedinho, às 09:00, passa A Miss e o Dinossauro 2005, curta recente que aproveita filmagens que foram recentemente encontradas do projeto A Miss e o Dinossauro original, com diversos rolos de filme super-8 registrando o dia-a-dia e o trabalho da turma envolvida com a mítica produtora Belair, de Rogério Sganzerla, Julio Bressane e Helena Ignez. Quem assina essa montagem é esta última, que também faz uma narração explicando a natureza das imagens e o espírito da Belair, e adiciona um emocionante depoimento de Rogério Sganzerla em discurso mais geral sobre cinema. Enquanto todos os rolos do Miss original não aparecem, esta é a única forma mais amplamente veiculável de travar contato com esse precioso material de registro e poesia. Mais à noite, na sessão É Tudo Verdade, passam dois filmes que tratam mais uma vez de futebol. Dois filmes que, em momentos distintos, participam de uma das maiores contribuições (em envergadura do projeto, em foco e em conjunto, ainda que individualmente poucos filmes se sobressaiam) ao documentário brasileiro, a assim chamada Caravana Farkas. O primeiro filme é Subterrâneos do Futebol (1968), de Maurice Capovilla, produzido por Thomas Farkas, e o segundo é Todomundo (1980), dirigido pelo próprio Thomas Farkas. Dois registros muito diferentes, e que sem querer testemunham o desgaste de um formato outrora celebrado, o documentário sociológico. Subterrâneos do Futebol pertence a Brasil Verdade, coletânea de quatro filmes que tentam esquadrinhar realidades de contraste social gritante e jogar uma outra luz sobre aquilo que outrora era controlado por um discurso paternalista e/ou culturalista que minava a análise política (ou dialética) das contradições da sociedade brasileira. Como o maior esporte popular do Brasil, o futebol é visto sob o olhar pessimista dos vários jogadores que não viram craques, dos jogadores que são dominados pelos empresários de clubes (tornados escravos por não possuírem o próprio passe), da desigualdade de um universo do qual em geral só se vê a face espetacular e emocionante da atividade. Mas, se o ptojeto tem seu brilho, a condução e a estrutura carregam um alarmismo tão apocalíptico que em momentos a veemência torna-se risível, e o filme parece tão cheio de si, dominado por certezas absolutas, que nenhuma imagem parece sobreviver por si mesma, e si apenas como ilustração parasitária de uma tese prévia. Anos depois, Farkas focará naquilo que ficou recalcado pelo discurso politizante do primeiro projeto: a turba, o torcedor em seu espetáculo de emoção e sofrimento, aquilo que faz da paixão pelo esporte uma coisa única. Se a caravana Farkas nasce com a missão auto-determinada de conhecer o Brasil, talvez tenha sido ironicamente em seu final que ela chegou mais perto de realizar seu projeto... num filme que possivelmente nem se mantinha mais no antigo programa! A sessão É Tudo Verdade começa às 22:35. Já às 04:30, o mesmo canal exibe Anna Terra (2004), recente filme do veterano artista underground Luiz Rosenberg Filho, autor de filmes como Crônica de um Industrial e A$$untina das Amérikas, que tentam trabalhar a crítica do capitalismo em moldes mais godardianos (o Godard de Duas ou Três Coisas, mais especificamente). Nesse novo filme, Rosenberg retrata os trinta anos de carreira e o talento da letrista Ana Terra, pouco conhecida artista que escreveu os versos de algumas pérolas da música brasileira, como "Amor, Meu Grande Amor", "Meu Menino" e "Essa Mulher".
Dia 28
Já que os longas não entusiasmam, ficaremos com dois destaques em curta-metragem, ambos dirigidos por Rogério Sganzerla. O primeiro é a peça de antologia A Linguagem de Orson Welles (1990), belíssimo filme de ensaio e espécie de estopim para a grandeza de Tudo É Brasil (1998), em que Welles é uma espécie de megapretexto para uma revitalização da vida de belle époque da metrópole carioca no começo dos anos 40, em que se tenta analisar através da passagem de Welles por aqui um pouco da alma brasileira em seu melhor e seu pior. O filme passa às 09:00. Já na madrugada de quarta para quinta-feira, às 04:40, passa Informação: H. J. Koellreuter (2003), último filme realizado por Rogério Sganzerla, homenagem ao famoso professor e músico baiano radicado na Bahia e espécie de último elogio de Sganzerla à arte rigorosa e radical que deseja provocar um engrandecimento de repertório por parte do espectador, realizar com a arte uma espécie de revolução permanente que Trótski queria fazer através da política. Projeto comovente que, mesmo em seu fracasso, realizou algumas das obras mais significativas da arte cinematográfica no Brasil.
Dia 29
Última homenagem aos 80 anos de nascimento de Marilyn Monroe, essa quinta-feira nos apresenta dois dos últimos filmes em que MM atuou: Adorável Pecadora (Let's Make Love, 1960), de George Cukor, e Os Desajustados (The Misfits, 1961), de John Huston. Rodeada de atores célebres, Yves Montand e Tony Randall no primeiro e Clark Gable e Montgomery Clift no segundo, la Marilyn faz suas duas últimas aparições antes de morrer, num filme de Cukor pouco considerado (talvez justamente) e num filme de Huston também pouco considerado (talvez injustamente, por ser um daqueles em que mais parece transparecer uma sensibilidade distintiva num cinema que em geral é regido apenas pela eficiência). O primeiro passa às 20:00, o segundo às 22:00, sempre no Telecine Cult. No mesmo horário, o Telecine cult exibe Melinda & Melinda (idem, 2004), em que o diretor Woody Allen brinca com a ênfase dada a certos aspectos de uma história e de como, a partir dos mesmos dados iniciais, pode-se construir uma comédia ou uma tragédia. Como toda essa conversa de processo criativo, intersubjetividade, teoria da recepção e obra aberta não são hoje só insuportáveis, mas terrivelmente caducos e sem sentido, Allen só consegue fazer o que faz hoje em dia: arremedo de cinema. E isso é mais trágico que cômico. Ou não.
Dia 30
Três anos antes de filmar Marilyn em
Adorável Pecadora, George cukor dirigiu Anna Magnani e Anthony Quinn em A Fúria da Carne (Wild Is the Wind, 1957), filme que ganhou o Leão de Prata de melhor atriz para la Magnani (e Cukor, como se sabe, era especialista em conseguir as melhores atuações das atrizes com quem trabalhava) e foi indicado a três Oscars (canção, ator e atriz). Não é o filme mais reverenciado de George Cukor, mas também é um dos menos vistos e não exatamente um triunfo da acessibilidade (não foi lançado em dvd nem nos EUA ainda, por exemplo). Razão a mais para assistir ao filme no Telecine Cult às 20:00.
Dia 01/7
Martin Scorsese sempre dividiu os mais ferrenhos críticos de cinema, dificilmente atingindo status de unanimidade entre os mais difíceis de agradar. Sua carreira, no entanto, atingiu um novo grau de controvérsia a partir do momento em que ele se alinhou com a Miramax para fazer superproduções estreladas por Leonardo DiCaprio. Naturalmente, a escolha de Scorsese se dá não por uma instituicionalização de sua carreira, mas por causa da crença – partilhada, aliás, por seus mais ferrenhos detratores – de que a visão de um cineasta pode se exercer mesmo no filme mais controlado pelos produtores, desequilibrado por cortes em função de uma duração mais acessível ao grande público e com atores que não são necessariamente a melhor escolha para os papéis, mas são formas de financiar filmes mais caros. Assim como Gangues de Nova York, O Aviador (The Aviator, 2004) foi produto de umna queda de braço entre Scorsese e Harvey Weinstein, e de acordo com a avaliação positiva ou negativa que se faz do filme, todos discutem quem ganhou. Por mais instável que o filme pareça ser, no entanto, é difícil tirar-lhe o mérito por algumas das cenas mais interessantes exibidas em cinema nos últimos anos. Que em O Aviador Scorsese criou tanto em temática quanto em linguagem um filme muito parecido com os filmes que realizou quando tinha acesso ao corte final, parece indubitável. O filme mostra Scorsese o tempo todo. Mas a questão verdadeira é saber sea forma é a melhor possível. E sobre isso nem mesmo o titular de coluna que vos escreve consegue chegar a uma conclusão. Tire-a você mesmo(a) na HBO às 21:00.
Dia 02
O Cinemax, sempre interessante no modo como amplia o nosso leque de produções de países com cinematografias geralmente menos acessíveis,nos propõe como destaque de domingo o filme Buena Vida (Delivery) (2004), filme argentino dirigido pelo estreante Leonardo Di Cesare. O filme rodou mundo através dos festivais internacionais e ganhou alguns prêmios (Toulouse, Valladolid, Mar del Plata) com um retrato entre comédia e drama da classe baixa argentina, da tensão entre classe média e baixa, e uma história de amor que surge disso tudo. O filme passa às 22:00, mas no mesmo horário o Telecine Cult exibe Os Incompreendidos (Les 400 coups, 1959), primeiro longa-metragem de François Truffaut e um dos filmes deflagradores da nouvelle vague. Primeiro volume da pentalogia do personagem Antoine Doinel, filme que lançou Jean-Pierre Léaud para o cinema, filme de um toque pessoal incrível, etc. etc., Os Incompreendidos é curiosamente ainda mais comentado do que visto, muito em função do caráter de mito que o filme ocupa, mas naturalmente muito mais em razão da pouca disponibilidade que o filme sempre teve no país. Quem sabe agora o filme realmente comece a ser mais visto.
Dia 03
Estreado no Festival de Cannes de 2004, Vida e Morte de Peter Sellers (The Life and Death of Peter Sellers, 2004), de Stephen Hopkins, passou direto pelo circuito exibidor nacional e foi lançado direto em DVD. Ainda que haja certa unanimidade a respeito da pouca capacidade do filme de trabalhar a contento seu tema, há de se convir que o tema – a biografia do ator Peter Sellers – é interessante o suficiente para garantir um interesse de uma boa parte do público que vai aos cinemas. Produzido pela HBO filmes, ele agora estréia "em casa", na HBO, às 21:00. Mais tarde, três filmes estréiam no horário das 22:00. Um deles é Acrobatas (Le acrobate, 1997), de Silvio Soldini, cineasta com 25 anos de carreira, mas que só começou a ter mais visibilidade a partir do grande sucesso que o xaropíssimo Pão e Tulipas fez no circuitinho carioca. Ainda que Soldini não seja um exemplo de cineasta que gostaríamos de ver ter a filmografia completa retrospectada, o Eurochannel faz seu papel ao trazer o filme do cineasta e, claro, ampliar seu repertório, que anda cada vez mais repetitivo e óbvio. Já nos canais da Globosat, dois filmes: no Telecine Emotion, passa O Pianista (The Pianist, 2002), filme que rendeu a Palma de Ouro em Cannes para Roman Polanski, além dos Oscars de direção e melhor ator (além de roteiro adaptado); já no Telecine Cult, passa Os Abutres Têm Fome (Two Mules for Sister Sara, 1970), filme que tem em suas credenciais história de Budd Boetticher, direção de Don Siegel, música de Ennio Morricone, além de Clint Eastwood e Shirley MacLaine de protagonistas. Momento de concretização da obra de Siegel. momento de começo de carreira na direção para Eastwood, que no ano seguinte realizaria seu primeiro longa-metragem, Play Misty for Me (1971).
Dia 04
Falando em filmes premiados em Cannes e com o Oscar ao mesmo tempo, o Telecine Cult exibe nesta terça-feira às 22:00 A História Oficial (La historia oficial, 1985), possivelmente o filme argentino mais famoso dos anos 80. Oscar de filme estrangeiro, melhor atuação e prêmio do júri ecumênico em Cannes, A História Oficial apresenta a típica ficção política unanimista ao filmar a passagem de uma pacata mãe de família alienada dos processos sociais e políticos da Argentina até a conscientização que nasce a partir de um fato atrelado a sua existência. Luiz Puenzo foi muito elogiado pelo trabalho com os atores, especialmente pela atuação de Norma Aleandro, mas nenhum de seus filmes seguintes conseguiu convencer o público internacional de que se tratava de um cineasta de talento distinto. Às 22:35, na sessão É Tudo Verdade, passa no Canal Brasil o média-metragem Tinta Fresca (2004), de Paula Alzugaray e Ricardo Van Steen, sobre "a iconografia transitória que ocupa muros e fachadas de espaços públicos", ou seja, sobre pichações, grafites e todo tipo de arte gráfica de rua no Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco. Às 23:55, no mesmo Canal Brasil, teremos o curta-metragem Texas Hotel (1999), de Claudio Assis, espécie de protótipo para Amarelo Manga, com o mesmo cenário e, sobretudo, o mesmo espírito do longa-metragem de estréia do diretor.
Dia 05
O Canal Brasil continua exibindo os curtas-metragens de Rogério Sganzerla. Dessa vez é Viagem e Descrição da Guanabara por Ocasião da França Antártica (1976), com Paulo "Bandido da Luz Vermelha" Villaça como Villegaignon, passando pela geografia virgem do Rio de Janeiro. O filme passa de manhãzinha, às 06:40. Mais tarde, no mesmo canal, teremos a curiosidade Os Paspalhões em Pinóquio 2000 (1982), último filme dirigido pelo veterano Victor Lima, e estrelado por um grande elenco de comediantes, como Catalano, Roni Cócegas, os irmãos Older e Olney Cazarré (mais conhecidos pelo ofício de dubladores) e o herói do telecatch Ted Boy Marino. A sinopse é impagável: "Dono de uma indústria de papel higiênico destrói as fábricas dos concorrentes e arquiteta o plano de poluir as águas da cidade para provocar desarranjo na população e aumentar as vendas do seu produto". Passa às 12:30.
Dia 06
Mais conhecido como diretor teatral na Broadway e como dançarino, Joseph Anthony também foi diretor cinematográfico. Entre os poucos filmes que dirigiu, se destaca Lágrimas do Céu (The Rainmaker, 1956), estrelado por Burt Lancaster e Katharine Hepburn, em atuação que lhe rendeu sua sétima indicação ao Oscar de melhor atriz. O filme passa no Telecine Cult às 19:40. Em seguida, às 22:00, para aqueles que já estavam sentindo saudades de Billy Wilder e seus filmes com Marilyn Monroe, o TCC passa Sabrina (idem, 1954), com um ícone feminino diametralmente oposto a MM: Audrey Hepburn em seu segundo papel num filme americano, que aqui interpreta ao lado de Humphrey Bogart e William Holden. Já no Canal Brasil, poderemos ver Jece Valadão em um dos grandes papéis cinematográficos de sua carreira, fazendo o protagonista de Boca de Ouro (1962), de Nelson Pereira dos Santos, na sessão Brasil Cult, às 22:35. Por fim, num dia recheado de belas parcerias entre atores e diretores, o mesmo Canal Brasil exibe A Reinvenção da Rua (2003), filme dirigido por uma das maiores atrizes brasileiras, Helena Ignez, que aqui tem a ajuda de seu marido (na montagem) para fazer um retrato do artista Vito Acconci, com ênfase numa obra realizada por ele no viaduto do Glicério, em São Paulo, em que ele propunha uma reconfiguração do espaço público e um espaço de convivência que beneficiava os moradores de rua. O filme passa na madrugada de quinta para sexta-feira, às 03:25.
Dia 07
Na manhãzinha desta sexta-feira, o Canal Brasil exibe o documentário Adolfo Celi: Um Homem entre Duas Culturas (2006). Dirigido por Leonardo Celi, filho de Adolfo, o filme traça um registro entre o teatro e o cinema, entre a atuação e a direção, entre o Brasil e a Itália. Para quem não sabe quem foi Adolfo Celi, vale dizer que trata-se do diretor do primeiro filme da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, Caiçara, e da biografia do compositor Zequinha de Abreu, Tico-tico no Fubá, além de ter trabalhado como ator em incontáveis filmes italianos e americanos. O documentário, um longa-metragem de 75min de duração, passa às 05:00, enquanto o dia amanhece... Passemos à noite. Enquanto os cinemas exibem uma adaptação
de um autor americano que abençoava um modo de existência boêmio, John Fante – com Pergunte ao Pó, de Robert Towne, que o coro quase unânime diz ser o mico dos micos –, o Telecine Cult estréia em sua programação um filme baseado em outro autor beberrão, grande fã de Fante, Charles Bukowski. Trata-se de Condenados pelo Vício (Barfly, 1987), dirigido por Barbet Schroeder e roteirizado pelo próprio Bukowski, com Mickey Rourke no papel principal. É comum considerar Barfly como um "autêntico" Bukowski, em contraposição a Crônica de um Amor Louco, dirigido por Marco Ferreri anos antes – não sem adaptações que tornam o filme mais próximo do universo do cineasta italiano do que do escritor americano –, que seria a adaptação "falsa". Mas é também possível dizer que a diferença entre os filmes é a diferente grandeza dos cineastas, e nesse caso naturalmente Ferreri toma a ponta. Por fim, é possível ver os filmes pelo que são e pelo que propõem ser, e evitar essas querelas sobre autenticidade que francamente enchem o saco às vezes. O filme passa às 22:00 no Telecine Cult.
Dia 08
Continuação de O Diário da Princesa na HBO ou a continuação de O Nome do Jogo no Telecine Premium? Gary Marshall ou F. Gary Gray? Se você prefere votar nulo, há sempre a opção de esperar mais um pouco e assistir à versão dos diretores de Gosto de Sangue (Blood Simple, 1984), primeiro longa-metragem de Joel e Ethan Coen, e uma espécie de breviário de tudo que eles viriam afazer em suas carreiras, tanto nos méritos quanto nas deficiências. Desde o começo, sente-se que o que mais interessa a esses cineastas é o mecanismo, uma lógica superior (a mão dos diretores equivalendo à mão impiedosa e cruel de deus) que desaba sobre os destinos dos personagens, meras existências derrisórias com sonhos de papelão. Quando o mecanismo está azeitado, dá em belas empreitadas como Ajuste de Contas e Barton Fink. Quando não, eles parecem se deixar envolver no mesmo aquário em que enfiaram seus personagens, caindo num vazio tão risível quanto os anseios de seus personagens. Às vezes dá a impressão de que eles herdam, de alguma forma, o cinema cerebral de Kubrick mas não sabem muito bem o que fazer com ele a não ser dar umas boas risadas às expensas do resto do mundo. Mas às vezes eles acertam. Gosto de Sangue, versão dos diretores, mais coeso e mais cínico, passa à meia-noite de sábado para domingo. Antes disso, à tarde, o Canal Brasil passa às 17:35 o especial Retratos Brasileiros dedicado à atriz Betty Faria e acerta na mosca ao exibir, em seguida, às 18:00, o belo Romance da Empregada (1987), de Bruno Barreto (sim, ele já soube fazer filme bom). Betty Faria não fez uma grande quantidade de filmes, mas conseguiu emplacar diversos personagens fortes, como em A Estrela Sobe, Bye Bye Brazil, Lili, a Estrela do Crime, Anjos do Arrabalde e, mais recentemente, o grande Bens Confiscados.
Dia 09
Um Só Pecado (La Peau douce, 1964) é um dos menos lembrados filmes de François Truffaut, talvez por não apresentar tanta ternura, talvez por ser um filme mais diretamente influenciado pela decupagem hitchcockiana (as entrevistas para o famoso livro Hitchcock-Truffaut começaram antes das filmagens e fizeram com que o cineasta de Os Incompreendidos quisesse testar outras formas de fazer cinema). Rechaçado no Festival de Cannes, onde participou da competição oficial, e rechaçado nas telas parisienses, o filme teve grande acolhida apenas em países escandinavos, como a Dinamarca e a Finlândia, onde foi um dos filmes mais vistos do ano. Além do talento de Truffaut, o filme ainda conta com a atuação e a beleza exuberante de Françoise Dorléac, irmã mais velha de Catherine Deneuve, morta tragicamente aos 25 anos num acidente automobilístico. O filme passa no Telecine Cult às 22:00.
Dia 10
Semana esquisita essa, concentrando a maior parte dos destaques para um único dia, e deixando outros dias inteiramente despidos de atrações. Como, por exemplo, essa segunda-feira de ressaca de Copa do Mundo, em que os canais de que mais se espera não fornecem nada de muito interessante, e resta ao Universal Channel exibir Dominados pelo Desejo (After Dark, My Sweet, 1990), filme de James Foley adaptado de um romance de Jim Thompson, e exemplo de um certo renascimento do cinema noir do qual participam na década de 90 filmes como Los Angeles – Cidade Proibida, Estrada Perdida e Os Imorais. Se Foley nunca teve uma obra sólida e consistente a ponto de se fazer um caso mais sério sobre sua visão artística, ao menos parece unânime reconhecer-lhe um talento inequívoco do artesanato, com alguns momentos altos que possivelmente superam a mera curiosidade. Dominados pelo Desejo encanta desde críticos de gostos mais convencionais como Roger Ebert até outros com preferências mais ousadas, como Bill Krohn (que acaba de ter seu livro sobre Buñuel lançado no país pela Taschen). Quanto a nós, podemos conferi-lo às 23:00, no Universal Channel.
Dia 11
George Pan Cosmatos é um desses nomes que vários fãs de cinema já leram diversas vezes, e imagina-se um cineasta de longa carreira. Curiosamente, GPC realizou apenas dez filmes, e ficou famoso por dois veículos para Sylvester Stallone em sua fase "herói violento": Rambo II e Stallone Cobra. Nascido na Itália, de origem grega, Cosmatos foi assistente de Preminger em Exodus, trabalhou em Zorba o Grego de Cacoyannis e começou a dirigir em 1970. A Travessia de Cassandra (The Cassandra Crossing, 1976) é seu terceiro longa-metragem, e se não dá para defender o interesse pelo filme às custas do talento do diretor, se olharmos para o estelar elenco a boca começa a salivar: Sophia Loren, Richar Harris, Ava Gardner, Burt Lancaster, Lou Castel, Martin Sheen, Ingrid Thulin, Alida Valli, Lee Strassberg e até o controverso O.J. Simpson, jogador de futebol americano processado em 1994 pelo assassinato de sua mulher (e inocentado no ano seguinte). O filme passa no Film & Arts às 20:00. Já no A&M às 22:00 passa Superman – O Filme (Superman, 1978), primeira tentativa de transplantar o sucesso do herói dos quadrinhos para as telas. No momento em que está prestes a entrar em cartaz uma nova versão – da qual, aliás, se anda falando muito bem –, o A&M faz uma mini-retrospectiva, e nesta terça exibe o primeiro da série, dirigido por Richard Donner. Já no Canal Brasil, a sessão
É Tudo Verdade passa o filme Cineastas Brasileiros – César Lattes e José Leite Lopes (2004), filme de José Mariani que surgiu como uma novidade muito grande no cenário do documentário nacional, sem muita tradição em retratar figuras como pesquisadores e teóricos (conta-se nos dedos as iniciativas desse tipo, como Joaquim Pedro sobre Gilberto Freyre e Nelson Pereira dos Santos sobre Sérgio Buarque de Hollanda). Inicialmente exibido na TVE, sem lançamento fora do circuito comercial e sem maior destaque nos festivais de documentário, o filme pede para ser descoberto por um número maior de espectadores interessados. O filme passa às 22:35.
Dia 12
Trocam-se os Richards. Sai Donner, entra Lester, e o A&M exibe Superman II – A Aventura Continua (Superman II, 1980) às 22:00. É isso.
Dia 13
O A&M continua com a saga do Super-Homem exibindo Superman III (idem, 1983), filme também dirigido por Richard Donner, às 22:00. Já a sessão Brasil Cult, destinada a exibir filmes mais ousados na programação do Canal Brasil, exibe às 22:35 o filme O Homem de Papel (1975), policial de Carlos Coimbra rodado em Fortaleza. Mas os destaques do dia são mesmo outros. Inicialmente, o documentário Edgar G. Ulmer – The Man Off-Screen (idem, 2004), que passa às 21:00 na HBO e chama a atenção para um cineasta cada vez menos conhecido pelos admiradores do cinema, mas que é uma figura ímpar por sua trajetória, por fazer muito (cinema) com muito pouco (dinheiro), mas sobretudo por sua criatividade. O filme conta com depoimentos de cineastas como Joe Dante, john Landis, Roger Corman, Wim Wenders e Peter Bogdanovich, entre outros. Antes disso, no Telecine Cult, temos a grande atração da semana: A Marcha Nupcial (The Wedding March, 1928), de Erich von Stroheim. Rara aparição de filme silencioso entre os canais da tv a cabo desde que, no começo do ano, a DirecTV parou de transmitir o já saudoso canal RetrôTV. Stroheim é uma das maiores figuras do cinema mudo, autor de obras-primas como Maridos Cegos, Esposas Ingênuas, Queen Kelly e Ouro e Maldição. Como sempre em se tratando de Stroheim, as proporções megalômanas das obras (em termos de duração dos filmes, principalmente) acabavam causando brigas com os produtores, e com A Marcha Nupcial não foi diferente. O projeto foi dividido em dois, cabendo o nome original do projeto apenas ao primeiro filme. O segundo, intitulado The Honeymoon e lançado no mesmo ano, queimou num incêndio na década de 50 e hoje é considerado perdido. Mas A Marcha Nupcial está aí, belo, restaurado e pronto para ser visto no Telecine Cult às 19:55. Em seguida, no mesmo canal, teremos Cinderela em Paris (Funny Face, 1958), belo filme de Stanley Donen com Fred Astaire e Audrey Hepburn, obra que faz um uso extravagante e delicioso da cor, usando e abusando dos clichês sobre moda, intelectualidade e cultura francesa, mas de uma maneira tão leve e doce que essas pequenas complicações assumem caráter irrelevante. O filme passa às 22:00. Ufa! E tudo isso num dia só, enquanto há tantos em que não tem nada...
Dia 14
Momento de consolidação da carreira de Ettore Scola, Casanova e a Revolução (La Nuit de Varennes, 1982)
é um filme de produção francesa, conta com um elenco estelar (Marcello Mastroianni, Jean-Louis Barrault, Hanna Schygulla, Harvey Keitel, Andréa Ferreol, Laura Betti, entre outros) e tem uma produção bastante mais onerosa que seus filmes anteriores. Até aí, nada demais, não fosse essa época também o momento em que seus filmes começam a trabalhar na fórmula fácil da abstração e da alegoria (O Terraço, O Baile), em que um espaço físico criava um microuniverso que reproduzia as tensões e os jogos de papéis do mundo político macro. Se nos anos 80 Scola era considerado um dos maiores diretores daquele momento (pelo menos a se julgar pela recepção que seu cinema tinha no Brasil), hoje é mister rever essa idéia e admitir que seu cinema envelheceu impiedosamente. Casanova e a Revolução, por seu caráter diferenciado de país, estatura de produção e momento limítrofe, vale a pena ser revisitado para nova avaliação, e passa no Telecine Cult às 19:50. Outro filme dos anos 80, mas de destino bastante diferente, é Além da Paixão (1984), filme de Bruno Barreto que é possivelmente o mais invisível de sua carreira. Nele, Regina Duarte é uma dona-de-casa burguesa que se apaixona por um jovem bissexual envolvido num mundo de drogas e promiscuidade. O filme passa no Canal Brasil às 20:00.
Dia 15
Andrew Niccol e seu Senhor das Armas (The Lord of War, 2005) no Telecine Premium ou Oliver Stone e seu Alexandre (idem, 2004) na HBO? Embora seja possível defender Gattaca, primeiro filme do neo-zelandês Niccol, não há muita coisa aceitável em Senhor da Guerra além das boas intenções em traçar um panorama do tráfico internacional de armas e como ele conta com carta branca de poderosas autoridades do mundo inteiro, inclusive americanas. Mas, em termos dramáticos e expressivos, o filme está mais próximo de um moralismo embrulha-estômago à mode de Crash – No Limite do que de uma tentativa mais séria – ainda que bm-sucedida apenas em parte – de ficção global como é o caso de Syriana. Em todo caso, vale muito mais a pena ficar com Cidade dos Sonhos (Mulholland Dr., 2001), longa-metragem mais recente de David Lynch até agora, e grande motivo de diversas discussões em mesas de bar e teses de mestrado sobre a natureza do que se viu, de com o filme acaba, etc. Poucas vezes um filme acedeu tão rápido à categoria de clássico, e no caso é merecido: tudo que é deslumbramento gratuito é também um misticismo complexo no poder da imagem, tudo que é joguete de roteiro é também um mergulho profundo em nossos pressupostos como espectadores de "filmes de mistério". Lynch sabe jogar o jogo dos espertinhos, mas ele é muito mais que isso: trata-se de um autêntico cineasta. Enquanto esperamos ansiosamente por Inland Empire, que deve estrear no Festival de Veneza em setembro, podemos assistir e reassistir a Mulholland Dr., que estréia na programação do Telecine Cult à meia-noite de sábado para domingo.
Dia 16
Já que falávamos de Luis Puenzo na semana anterior, com A História Oficial, desta vez teremos exibido pelo Cinemax às 22:00 seu filme mais recente, A Prostituta e a Baleia (La puta y la ballena, 2004), co-produção argentino-espanhola, estrelado por uma das mulheres mais deslumbrantes do cinema contemporâneo: Aitana Sánchez-Gijón. Mas o real destaque do dia é Beijos Proibidos (Baisers volés, 1968), terceiro volume da pentalogia de Antoine Doinel, seguindo-se ao média-metragem Antoine e Colette, presente no filme em episódios O Amor aos 20 Anos. Filmado entre as barricadas em defesa de Henri Langlois, que havia sido retirado da diretoria da Cinemateca Francesa, e os acontecimentos de Maio de 1968, o filme parece seguir esses acontecimentos apenas pela televisão (como de fato aparece em algumas cenas do filme), enquanto se fixa na vida emocional e alienada de seus personagens em suas buscas sentimentais. Principalmente Doinel, que aqui se vê entre o amor de Claude Jade, sua namorada, e Delphine Seyrig, mulher do patrão, além de uma prostituta ou duas. Possivelmente o filme mais terno de Truffaut, ele consegue atribuir uma sensibilidade e um andamento ao filme que são todos próprios, ainda que o filme não se descole muito dos princípios de armação do cinema ficcional mais costumeiro. Mas basta vê-lo em comparação com um filme com Gangsters de Casaca (Mélodie en sous-sol, 1963), filme de Henri Verneuil com Jean Gabin e Alain Delon que a TV5 passa às 20:25, para que se perceba a diferença entre os filmes e constate-se a pessoalidade do filme de Truffaut. Beijos Proibidos passa às 22:00 no Telecine Cult.

Ruy Gardnier

 

 
A Marcha Nupcial (1928), de Erich von Stroheim, é o destaque da semana (Telecine Cult, 19:50, dia 13/7).

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