CRIME SEM PERDÃO
Gordon Douglas, The Detective, EUA, 1968

Gordon Douglas e Frank Sinatra colaboraram juntos em três filmes entre 1967 e 1968 (os outros dois são Tony Rome e A Dama de Pedra, em que Sinatra interpreta o detetive particular do título do primeiro). A trinca, e em especial este Crime Sem Perdão, diz muito sobre a confusão estética que dominava Hollywood no final dos anos 60. Douglas é um artesão de terceiro escalão competente, sem grande imaginação ou interesses autorais, mas do tipo em que um produtor/ator como Sinatra pode confiar para entregar um produto direto e eficiente. Aqui, com a necessidade ao mesmo tempo de entregar um sólido veiculo para Sinatra, fazer um filme que responda aos anseios de uma platéia “moderna” e dar corpo às preocupações políticas que o roteiro denuncia (cortesia de Abby Mann que escreveu o similar mas infinitamente superior Crime e Paixão de Robert Aldrich), Douglas claramente não sabe por onde começar e o fracasso do filme de navegar entre os seus elementos acaba lhe garantido um interesse extra, que um filme um tanto melhor resolvido talvez não tivesse.

O que primeiro chama a atenção e domina Crime Sem Perdão é justamente a noção que o filme tem de moderno. O filme vai e volta no tempo por razão nenhuma a não ser que alguém (Sinatra? Douglas? Mann?) tenha decidido que a estrutura daria uma arejada ao filme e aumentaria a impressão de que não se tratava de apenas outro filme de policial. Só que aqui os intricados flashbacks fazem pouco mais do que tirar o espectador da experiência do filme. Pior: como a retórica do roteiro mão pesada de Mann depende da inevitabilidade trágica da situação em que o policial incorruptível vivido por Sinatra se envolve, a estrutura encontrada termina por jogar contra a própria proposta dramática do filme. Douglas complementa isso ao buscar com freqüência posições estranhas para colocar a câmera. Há uma autoconsciência na decupagem do filme que vai contra os modestos mas honestos talentos do cineasta. Se a intenção era buscar novas formas de apresentar o espaço cênico, o efeito termina por sugerir que Douglas não sabe onde pôr a câmera.

Tudo isso é uma pena, dado que Crime Sem Perdão faz outras coisas muito bem. Toda a sub-trama relacionada ao casamento de Sinatra e Lee Remick funciona muitíssimo bem (muito devido ao trabalho dos atores), o que incomoda ainda mais a incapacidade de Douglas de incorporá-las ao filme. Além disso, há uma grande autenticidade nas cenas de trabalho policial indicando que alguém ligado à produção sabia muito bem do que estava falando. E é nesses momentos em que vemos Sinatra trabalhar que Douglas retira a força do filme, pena que ele não parece achar isso o suficiente.


Filipe Furtado

(DVD Fox)