Essa sessão é atualizada semanalmente.

ARTIGOS
Quando a televisão faz montagem
(sobre Barcelona 3, Real Madrid 0, 19/11/2005)
por Luiz Carlos Oliveira Jr. (26/01/2006)

FILMES DA SEMANA
(NOVEMBRO DE 2005 A JANEIRO DE 2006)


Dia 06/11
Seis semanas de férias – esperamos que o leitor entenda, Festival do Rio e Mostra de São Paulo não é exatamente sombra e água fresca – e, quando voltamos, tudo está mudado. Tudo não, naturalmente, mas algo decisivo, ou ao menos algo que permanecia como uma esperança. Falamos, claro, da transformação do Telecine Classic em Telecine Cult. A mudança, na verdade, almeja dar uma arejada no canal, mas a conseqüência já se prevê: já que "cults" são filmes de todas as épocas, as novidades da programação vão ser os filmes recentes, e progressivamente os filmes dos anos 60 para trás vão ganhar cada vez menos espaço. O Telecine Emotion vai dedicar-se inteiramente ao mainstream e mais uma vez os filmes "de arte e ensaio" vão ser guetificados, quiçá estigmatizados. Mas vamos aos filmes. Aqui do Brasil, é claro. A boa notícia do Canal Brasil é que eles deram uma renovada no acervo de filmes picantes comprando um pacote de Cláudio Cunha. Ora, Claudio Cunha é o sujeito por trás (!) de filmes como Snuff – Vítimas do Prazer e... Oh! Rebuceteio (1984), filme que o canal exibe à 01:30 de domingo para segunda-feira. Mítico pelo título e pela dificuldade do acesso (uma cópia em vídeo é uma raridade), o filme finalmente terá uma possibilidade de avaliação a partir dessas novas exibições. Antes disso, a sessão É Tudo Verdade, dedicada a documentários brasileiros, exibe Igreja dos Oprimidos (1986), último longa-metragem de Jorge Bodansky. O filme passa às 21:00.
Dia 07/11
E não é que o Cinemax se recuperou da lombra de que era acometido e voltou a exibir preciosidades do arco da velha? A primeira dessa semana é Demônio de Mulher (It Should Happen to You, 1954), filme de George Cukor com Judy Holliday e Jack Lemmon. Ainda que o filme não sobressaia na filmografia de Cukor, é um desses realizadores cujos filmes deveríamos perseguir em todas as ocasiões. O filme passa às 15:00 no Cinemax e às 18:00 no canal suplementar do Cinemax. Mais tarde, no RetrôTV, a homenagem a Audrey Hepburn faz o canal exibir Guerra e Paz (1956), um dos mais controversos filmes de King Vidor. Para Tag Gallagher, é um dos maiores filmes de todos os tempos; para mais de um admirador de Vidor, é algo que ele não deveria ter feito. Para aqueles que acompanharam na Mostra filmes de Oliveira como O Sapato de Cetim e Amor de Perdição (mais de 4 horas cada), eis aqui outro desafio, dessa vez na telinha: 3h28 de filme. Naturalmente, não será tempo desperdiçado. O filme passa à 01:05.
Dia 08/11
Bom, uma das coisas diferentes nessa semana é que a terça-feira não é o dia mais morno da semana. Ao contrário, pode-se até vê-lo como o mais agitado. Começa às 05:05, com Shabab imra'a (1956), filme que representou o Egito no Festival de Cannes em seu ano. Dirigido por Salah Abouseif e Amin Yousseff Ghurab, o filme, que em francês se chama A Sangue-suga, conta a história de um jovem que fica tão fascinado por uma mulher que abandona suas tarefas com a mãe, com a noiva e com o trabalho. Pode ser uma obra-prima, pode ser apenas uma curiosidade. O certo é que não voltará a acontecer tão facilmente a oportunidade de ver um filme egípcio de 50 anos atrás... Às 10:30, mais uma surpresa deliciosa do Cinemax: A Noite do Demônio (Night of the Demon, 1958), de Jacques Tourneur. Mais à noite, nosso primeiro destaque dado ao Telecine Cult: Intervenção Divina (Yadon ilaheyya, 2002), segundo longa-metragem de Elia Suleiman e sensacional libelo em prol da liberdade e da sobredeterminação do povo palestino em forma de comédia dramática à Jacques Tati. Tudo bem que o filme não é inédito na tv a cabo (passou na TV5 ao menos), mas vale o destaque ao canal. Não é só porque a gente tem birra que a gente não vai reconhecer os belos filmes que eles passam (pois há ainda alguns deles)... Às 22:00.
Dia 09/11
O Quarto Verde (La Chambre verte, 1978) não é exatamente o filme que mais se imagina característico do cinema de Truffaut. Afinal de contas, é um filme inteiramente povoado pela idéia de morte, pelo amor mesmo à morte, uma morbidez que não encontra muitas ressonâncias em seus outros filmes, comédias, sagas de amor louco ou romances de formação. No Brasil, no entanto, não é a acessibilidade que faz a disponibilidade. Tanto o dulcíssimo Beijos Proibidos quanto O Quarto Verde são inexistentes em vídeo ou dvd no país. A RetrôTV nos brinda com o segundo, que, a despeito de sua aparente estranheza dentro da filmografia truffautiana, é um de seus filmes mais emocionantes. o compromisso com o quarto verde é às 23:00.
Dia 10/11
Da Ambição ao Crime (Crime of Passion, 1957) é o terceiro longa-metragem de Gerd Oswald, um desses realizadores bastante celebrados entre os críticos e cinéfilos americanos mas jamais largamente reconhecidos internacionalmente (outro exemplo: o genial André de Toth). Ver seus filmes não é algo que aconteça todo dia, então recomenda-se a visão... ainda mais porque são Barbara Stanwyck e Sterling Hayden os protagonistas. O filme passa às 11:25 no Telecine Cult. O Solar de Dragonwyck (Dragonwick, 1946) volta à programação do TCC com estatuto de estréia. Primeiro filme de Joseph L. Mankiewicz, Dragonwyck passa às 22:00, num caso raro (ao menos nesse começo do canal "cult") de destaque em horário nobre dado a um filme em preto-e-branco não muito badalado. Vamos ver filmes antigos no Telecine Cult enquanto eles ainda existem!!!
Dia 11/11
Já que estávamos
falando de George Cukor, vamos recomendar aqui outro de seus filmes. Feito dez anos depois do outro, A Vida Íntima de Quatro Mulheres (The Chapman Report, 1964) passa na RetrôTV às 23:00. O filme não era exatamente muito bem quisto por Cukor, que teve o material tirado de suas mãos e remontado a mando dos produtores. Em todo caso, mesmo o desvirtuamento na montagem não impediu o filme de ser um questionamento forte acerca da sexualidade feminina, com os matizes e as ambigüidades que Cukor sempre consegue retirar de suas atrizes. À noite, dessa vez na madrugada de sexta-feira para sábado, é a vez de embarcar mais uma vez com Cláúdio Cunha e assistir a Sábado Alucinante (1979), exploit de discoteca feito para se aproveitar da onda de Os Embalos de Sábado à Noite e similares. Está longe, muito longe de ser um bom filme, mas é um psicotrônico dos melhores. Das musas (Simone Carvalho, Sandra Bréa) às músicas, das roupas aos hábitos (hippismo, amor livre), passando naturalmente pela esquálida narrativa (assinada Benedito Ruy Barbosa, junto com Claudio Cunha) e culminando numa tirada sensacional de Maurício do Valle equacionando curra e discoteca, é algo que vale a pena ver nem que seja para saber que existe. Passa à 01:30.
Dia 12/11
Antes de filmar a atriz ninfeta Isild le Besco em À tout de suite, Benoît Jacquot filmou para a televisão o filme Princesa Maria (Princesse Marie, 2004), filmado em duas partes que somam 3h10. A primeira parte passa nesse sábado, no Eurochannel, às 11:00. É um filme histórico sobre Maria Bonaparte, com nada menos que Catherine Deneuve desempenhando o papel principal. O problema é que Jacquot, a se julgar por tudo que aportou por aqui nos últimos anos, é convencional para caramba. Em todo caso, a observar. Mais à noite, às 03:25 da madrugada de sábado para o domingo, a TV5 exibe And the Pursuit of Happiness (1986), documentário feito para a tv e dirigido por Louis Malle sobre imigrantes nos Estados Unidos. Haja opção! Parece que ainda estamos em época de festival, mas dessa vez diante da tela da televisão... Se continuar assim, já está ótimo...
Dia 13/11
Depois de um bom tempo requentando policiais ou dramas dos anos 80, filmes esquecidos de Brigitte Bardot e coisas mais recentes meio desimportantes, a TV5 volta a trazer peças mais importantes e raras do melhor cinema francês, como J'embrasse pas (1991), de André Techiné. De seus dois últimos, Les Égarés foi exibido apenas no Festival do Rio e Les Temps qui changent não apareceu de forma nenhuma, Rio ou São Paulo. Oportunidade aqui, então, de matar as saudades e ver um filme que jamais foi lançado nacionalmente. E, claro, ter Emmanuelle Béart ajuda, e em J'embrasse pas ainda temos a chance de vê-la morena. 21:25 na TV5.
Dia 14/11
Continuando a programação dedicada aos documentários de Louis Malle, a TV5 exibe bem cedinho, às 07:30, o filme God's Country (1986). O filme registra as mudanças na vida de uma cidadezinha agrícola e próspera em Minnesota, seis anos depois da primeira filmagem. O resultado é um questionamento da idéia de sonho americano. Quem sabe o filme faz uma tabelinha com o recentemente estreado Marcas da Violência, de David Cronenberg, na maneira como trabalha o imaginário de paz do interior americano? Mais à noite, o Eurochannel exibe La commare secca (1962), primeiro filme de Bernardo Bertolucci, às 23:30. Ainda que não se trate de nada especial, mais um exercício de estilo à maneira narrativa de Rashomon, é curioso para ver como é o único trabalho dele feito antes de Antes da Revolução, que, goste-se ou não, apresenta uma proposta já bem mais pessoal de cinema.
Dia 15/11
Continuando a voga do cinema egípcio dos anos 50, a TV5 (já deu pra perceber de quem é essa semana nos desatques da tv, não?) exibe, no horário nada cristão de 05:20, o filme Raya & Sekina (Raya wa Sekina, 1953), de Salah Abouseif (ou Abou Seif, como está no site do canal). As duas mulheres do título são duas assassinas em série que mataram mais de 60 mulheres e roubaram-lhes as jóias. Mais à noite, o Telecine Cult (olha ele aí: cada vez menos estréias, ao contrário do que se poderia supor nos momentos inaugurais do canal) lança em sua programação O Homem Sem Passado (Mies vailla menneisyyttä, 2002), de Aki Kaurismäki. O filme já circulou por outros canais a cabo, mas na rede Telecine é a primeira vez que aparece. E, na ausência de desataque maior, é sempre um prazer ver o cinema de Kaurismaki – curiosamente, um diretor de estética não muito inacessível (não é mais estranho do que um Jarmusch, por exemplo) que nunca teve muito destaque e voga no Brasil – exibido, seja de que forma for, no Brasil. O filme passa às 22:00.
Dia 16/11
Limpidez, classicismo, exatidão. Os westerns de Anthony Mann têm uma característica toda própria, uma leveza de andamento e uma complexidade moral, uma mise-en-scène nada ostentatória e ainda assim tranqüilamente identificável, toda a união possível dos opostos. Seus cinco faroestes com James Stewart representam um dos momentos mais altos do cinema americano. Já que uma mostra com todos eles juntos parece impossível, o jeito é se contentar com o primeirão, Winchester 73 (idem, 1950), que a RetrôTV exibe às 23:00.
Dia 17/11
Mais um documentário de Louis Malle passando na TV5: Humain, trop humain (1974). Passado na França, ao contrário de outros de seus documentários (nos Estados Unidos, na Índia, até no fundo do mar...), o filme registra as condições de trabalho nas fábricas da Citroen e mostra em seguida, três meses depois, o Salão do Automóvel em Paris. Pouquíssimo conhecido e tido como um dos melhores trabalhos de Malle, Humain, trop humain (tradução: "Humano, demasiado humano", como o livro de Nietzsche) passa às 21:30. No Cinemax Prime, que anda meio quietinho essa semana, a graça é a tabelinha de filmes de Nicholas Ray com Humphrey Bogart feitos em seqüência. Às 22:30, passa primeiro O Crime Não Compensa (Knock on Any Door, 1949), filme estreado já há alguns meses...
Dia 18/11
...e, no dia seguinte, passa de fato a maior atração, No Silêncio da Noite (In a Lonely Place, 1950)
, que estréia às 19:00, no mesmo Cinemax Prime. É notável como, na Hollywood dos anos 40-50, o terceiro e o quinto filme de um realizador (no meio houve o pouquíssimo visto e igualmente considerado Alma Sem Pudor/Born to Be Bad, com Joan Fontaine) mostram tamanha personalidade e tamanho excesso de hybris (uma palavra que é muito apropriada para o cinema de N. Ray). O apadrinhamento de Bogart ao jovem realizador é compensado pelo grande trabalho na composição de personagens do casal principal, completado por Gloria Graheme – no que possivelmente é sua mais memorável aparição no cinema junto com Os Corruptos/The Big Heat de Fritz Lang, que seria feito três anos depois. Não se pode recomendar mais esse filme, um dos maiores de Ray e um dos maiores do cinema. No mesmo dia, outra preparação para a estréia do dia seguinte. Trata-se de Kill Bill, v. 1 (idem, 2003), que a HBO exibe às 22:15, infelizmente num full-screen que destrói todo o meticuloso trabalho de composição do quadro de Tarantino. Perde-se 42% da tela, mas os 58% que ficam até que dão pro gasto...
Dia 19/11
...e, às 21:00, a HBO estréia Kill Bill, v. 2 (idem, 2004), naturalmente, com as mesmas características de exibição do volume anterior. Em todo caso, 58% de Kill Bill é melhor do que 100% de quase todos os filmes exibidos nos canais de filmes recentes. E, numa semana com tão poucas novidades, a saga da Noiva tarantinesca ganha o nosso destaque semanal. Já num registro mais raro, a RetrôTV exibe às 20:30 Os Cinco de Chicago (Bloody Mama, 1970), um dos últimos filmes de Roger Corman antes de sua aposentadoria de 19 anos como diretor. A notar a participação de um Robert De Niro bem novo, antes da consagração com Caminhos Perigosos (1973), num registro do cinema que Roger Corman usou bastante, mas ficou muito menos conhecido do que seus filmes de terror: o cinema policial. Naturalmente, com espaço para muito humor.

Dia 20/11
E deu a louca em tudo! Depois do Telecine Classic mudar de nome para Telecine Cult, de modo a incorporar no canal também os filmes mais recentes, eis que estréia no Telecine Emotion Quem Sabe? (Va savoir, 2001), de Jacques Rivette, às 22:00. Há algo mais "cult" do que o cinema de Rivette? É claro que tudo é revestido, como de costume, por uma intriga de suspense, pelos jogos de máscaras e pelo teatro, conforme já se sabe. Grandes interpretações de Jeanne Balibar e Sergio Castellitto, além da intensa presença da deslumbrante Hélène de Fougerolles, ajudam Jacques Rivette a tecer uma de suas mais interessantes obras recentes. Não se deixe convencer que a duração dos filmes de Rivette são excessivas: eles têm seu próprio ritmo, e um que é cativante e só assim consegue fazer casa para todos os persoangens e suas ações.
Dia 21/11
Se na semana passada a RetrôTV exibia o primeiro dos cinco westerns dirigidos por Anthony Mann e protagonizados por James Stewart, a Cinemax aproveita e exibe o último deles, Um Certo Capitão Lockhart (The Man from Laramie, 1955), às 14:30. Ótima essa notícia de que a Cinemax anda cavucando nos arquivos em busca de filmes decisivos. A má notícia é que nem sempre o cuidado de exibição é o mais apropriado. Por exemplo, esse filme é o primeiro de Mann em CinemaScope e, como não poderia deixar de ser, o filme sofre terríveis danos de composição e perda de imagem (na casa de 40%) sendo exibido em tela cheia. Já que a Cinemax tem um canal excedente que exibe a programação com três horas de atraso, por que não inventar uma forma de exibir o filme em seu formato original? Mais à noite, a RetrôTV continua com sua programação mensal dedicada a Audrey Hepburn. Os filmes dessa segunda são mais raros e menos revisitados no que diz respeito às várias homenagens feitas à atriz. Às 23:00, passa Uma Cruz à Beira do Abismo (The Nun's Story, 1959), filme de Fred Zinnemann em que a atriz interpreta uma freira. Logo em seguida, à 01:50, passa o mais raro ainda Robin e Marian (Robin and Marian, 1976), dirigido por Richard Lester em 1976 e contando a história de Robin Hood e Lady Marian depois de velhos. Audrey, naturalmente, é Marian, e cabe a Sean Connery interpretar o aposentado herói. A descrição já permite salivar...
Dia 22/11
O Telecine Cult entra na onda do cinema coreano para exportação e estréia Primavera, Verão, Outono, Inverno e... Primavera (Bom yeoreum gaeul gyeoul geurigo bom, 2003), filme que fez a fama de Kim Ki-Duk nos circuitinhos bistrô mundo afora. É possivelmente seu pior filme, mas é prato cheio para fãs de orientalismo fast-food. O destaque do dia vai para duas novas pérolas achadas pelo pessoal do Cinemax dando sopa nos arquivos da Columbia. Não num horário muito cristão, aliás: às 05:45, veremos O Gênio do Mal (Baby, the Rain Must Fall, 1965), de Robert Mulligan, estrelado por Lee Remick e Steve McQueen. Um pouco mais tarde, às 10:45, passa Ratos Humanos (Tight Spot, 1955), de Phil Karlson, com Ginger Rogers e Edward G. Robinson. Diretores importantes e menos reconhecidos do que deveriam ser, duplas de protagonistas pra lá de curiosa que fazem a força de um dia de cinema na frente da televisão.
Dia 23/11
Talvez já tenha dado no saco todo o trabalho de semântica (e suas implicações) já feito com a palavra cult, mas aqui é que a porca torce o rabo. Um determinado uso de cult é para certos grupos de filmes que têm um tipo de fruição muito particular: filmes trash, Bollywood, esse tipo de coisa que demanda de um certo tipo de público um distanciamento que mistura achar os códigos engraçados porque ridículos (ou o contrário). E, pós-Tarantino, nada mais natural a um canal chamado Telecine Cult exibir uma trinca de filmes de blaxploitation. O primeiro é O Chefão de Nova York (Hell Up in Harlem, 1973), segundo filme de Larry Cohen, mais conhecido por seu trabalho de roteirista (Por um Fio de Joel Schumacher). Segundo Filipe Furtado, seus filmes como diretor merecem atenção. Então, às 18:05, manter guarda em frente à tv.
Dia 24/11
Deu a louca no mundo? Uma simples quinta-feira, e já é facilmente o dia nacional do filme bom na tv a cabo. Bem, talvez não exatamente do filme bom, mas das atrações importantes. Mas não deixa de ser impressionante (e é algo inédito nessa coluna) que sete canais diferentes tenham coisas interessantes para divulgar no mesmo dia. A começar com a atração mais vistosa, mérito da TV5: Um Homem de Verdade (Um Homme, un vrai, 2002), primeiro longa-metragem dos irmãos Arnaud e Jean-Marie Larrieu, possivelmente a maior revelação do cinema francês contemporâneo, junto com Abdelatif Kechiche (cujo L'Esquive também já passou, aliás, na mesma TV5). Passa às 21:25, e conta no elenco com Mathieu Amalric, que já virou ator-fetiche para os fãs de Reis e Rainha (onde estavam que não o tinham visto ainda em Minha Vida Sexual ou Só Deus Sabe?). Na RetrôTV, na sessão-trocadilho Vade Retro, às 23:00, passa A Casa dos Maus Espíritos (House on Haunted Hill, 1959), um dos mais consagrados filmes de William Castle, estrelado por Vincent Price. No Eurochannel, a Noite Nostalgia do mês é dedicada a Giulietta Masina, que merece um documentário sobre ela, O Poder de um Sorriso, que passa às 22:00. Em seguida, o canal emenda com Julieta dos Espíritos (Giulietta degli spiriti, 1965), de Federico Fellini, às 23:00, feito exclusivamente para ela, e depois com O Abismo de um Sonho (Lo sceicco bianco, 1952), que começa à 01:30. Duas escolhas não-óbvias (as mais naturais seriam A Estrada da Vida e Noites de Cabíria), mas será que no caso a novidade se presta no caso de O Abismo..., um filme evidentemente com um Fellini ainda em gestação? O Cinemax ataca às 20:00 com Meu Problema com as Mulheres (The Man Who Loved Women, 1983), versão do diretor Blake Edwards para o original de François Truffaut. Aqui, o mulherengo é Burt Reynolds, e as damas nada menos do que Julie Andrews e Kim Basinger. Já o Cinemax Prime tem uma dupla de filmes com Humphrey Bogart. O primeiro, que começa às 21:00, é O Diabo Riu por Último (Beat the Devil, 1953), de John Huston, e o segundo, bem menos conhecido, é Confissão (Dead Reckoning, 1947), um noir com Lizabeth Scott, dirigido por John Cromwell. Passa às 22:30. Acha que acabou? Nada disso. Ainda tem, mais cedo, outro filme blaxploitation de Larry Cohen que passa no Telecine Cult: Incendiando o Harlem (, 1973), às 18:00. Com tudo isso, é até melhor esquecer a mais badalada estréia do dia no Telecine Premium, Os Sonhadores (The Dreamers, 2004), mais uma incursão de Bernardo Bertolucci no mundo fetichista das pequenas obsessões que dão errado mas deixam um gostinho de contestação. Chique e confortável, ou seja, uma banalidade. Ufa!
Dia 25/11
Fechando a trilogia de blaxploitation, um dos mais famosos filmes
do gênero, Foxy Brown (idem, 1974), dirigido por Jack Hill e estrelado por Pam Grier, no papel que a imortalizou. O filme passa às 18:10
Dia 26/11
Fechando a semana (uma particularmente boa, até impressionante), um sábado agitado. Se no quesito dos filmes antigo a RetrôTV fornece um pouco de suas recorrências sempre recomendáveis – Marinheiro por Descuido (The Navigator) de Buster Keaton no "Shhh", Era uma Vez no México de Sergio Leone e O Professor Aloprado de Jerry Lewis –, na disputa pelo principal horário da semana temos uma disputa dos próprios Telecines entre si (uma vez que a HBO não representa ameaça nenhuma com Tróia. Já às 22:00, o jeito é escolher entre três belos filmes. No canal principal, o Premium, estréia Meninas Malvadas (Mean Girls, 2004), filme de Mark S. Waters que fez a consagração de Lindsay Lohan e concretizou um dos comentários mais ácidos e precisos do ambiente escolar americano contemporâneo. No Emotion, estréia Má Educação (La mala educación, 2004), mais recente filme de Pedro Almodóvar. Já no Telecine Cult, passa Ata-me!, filme do mesmo Almodóvar, só que de 1990. De certa forma, é uma arrumação meio esquisita. Não ia ser mais interessante dar a possibilidade do espectador ver ambos filmes do mesmo cineasta no mesmo dia? E por que um filme é cult e outro é emotion? Esses nomes fazem realmente sentido? O que passa pela cabeça da marquetagem do Telecine? Bom, contanto que a televisão a cabo continue nos dando semanas fortes com essas (vale ressaltar que não é comum), essas perguntas não precisam de respostas...

Dia 27/11
Bem, já era de se esperar que o paraíso do cinéfilo não fosse continuar depois de uma semana tão cheia de atrações que ficavam entre o absolutamente necessário e o raro e digno de ver. Essa semana é um pouco a ressaca da festa. Não que não haja filmes de interesse, pois hão de ver que eles aparecem hora ou outra. Mas falta aquele painel de clássicos redescobertos, curiosidades de fazer salivar, enfim, aquilo que faz do cinéfilo não um simples deglutidor de clássicos mas um aventureiro do audiovisual. Bom, nessa segunda-feira, um título apropriado para a ressaca, um filme que provavelmente todos já viram em sala de aula (se foram alunos de segundo grau na época do vídeo, naturalmente): Giordano Bruno de Giuliano Montaldo (idem, 1973), feito após o sucesso de Sacco e Vanzetti. Ambos os filmes ajudaram a consolidar o papel de Gian Maria Volonté como o ator esquerdista por excelência do cinema europeu. Mas quem for seguir o conselho que vá avisado: é cinema italiano daqueles pesados, empostados, linhagem Wertmuller-Scola de um socialismo meio cioso dos protocolos. Em todo caso, é um filme que não passa há anos na tv a cabo, e a RetrôTV aproveita e exibe Giordano Bruno às 11:00. Além de Volonté, o filme conta com participação de Charlotte Rampling.
Dia 28/11
É só o Telecine Classic virar "Cult" que os gênios da programação passam a sarapintar de filmes "cult" o resto dos outros canais. Sonatine, de Takeshi Kitano (Sonatine, 1993), passa no Telecine Action às 22:00 com o genial nome que ganhou em vídeo, Adrenalina Máxima. E apesar de credenciar-se como um "filme de ação" (sangues, assassinatos gráficos, yakuzas), há tanto de especulativo e particular nesse filme (e, em geral, no cinema de Kitano) que fica sempre engraçado ver um de seus filmes freqüentando uma prateleira de "ação", ou um canal do tipo. Soturno e desesperado, Sonatine é um dos mais belos filmes da década de 90 e é também uma espécie de preparação para Hana-Bi, sua obra-prima de quatro anos depois. Às 22:30, O Cinemax Prime exibe A Última Noite (25th Hour, 2003), último filme de Spike Lee a dar as caras por aqui nas salas de cinema. Apesar de só ter feito um longa-metragem de ficção desde então (She Hate Me, já lançado em vídeo e dvd com um nome ridículo), Lee dirigiu documentários, episódios de longas, curtas-metragens, episódios de séries, e até agora nada disso apareceu, tanto nas telas grandes como nas pequenas. A Última Noite é uma declaração de amor e ódio a Nova York, a morar nos Estados Unidos, a todos os sentimentos misturados que se conjugam com as misturas de raças, posições políticas e sociais na América. Spike Lee é muito mais do que um cineasta de ação afirmativa. Ouviram, feijoadas brasileiros?
Dia 29/11
A principal influência de Emanuele Crialese em Respiro (idem, 2002) é John Cassavetes, ao menos na maneira de apresentar uma personagem feminina que vive entre o sociável e o anti-social, um poder controlado da atriz e uma força instintiva que faz brotar movimentos inesperados. Sua Gena Rowlands nesse belo filme é Valeria Golino. Uma pequena fábula sobre a força interna do ser humano, especialmente a feminina, Respiro estréia no Telecine Emotion às 22:00.
Dia 30/11
Qual foi a última vez que prestamos atenção num lançamento de Claude Lelouch? OK, teve o ignóbil episódio de 11 de Setembro, mas desde então ele já lançou títulos nada ambiciosos como A Coragem de Amar e O Gênero Humano, Primeira Parte: Os parisienses. Em 2002, ele fez Amantes e Infiéis (And Now... Ladies and Gentlemen), que o Telecine Premium estréia às 22:00. Jeremy Irons e Patricia Kaas vivem dois amnésicos que se encontram e vivem um romance. O índice da glicose emocional já subiu? Pois é, senhoras e senhores, Claude Lelouch. Acredite quem quiser. Veja quem agüentar. O filme ainda tem o mimo de contar com um papel coadjuvante dado a Claudia Cardinale. Às 22:30, uma atração que não pode se considerar muito melhor. Quem foi conferir The Eye 2 no cinema (lançado como Visões) sabe que os Pang Brothers são os reis das chances desperdiçadas. Mas quem quiser conferir como começou o franchise "The Eye" pode ver o filme no Cinemax Prime, que exibe o filme com o título The Eye – A Herança (Jian gui, 2002). E não, o filme não conta com a atriz principal de Visões, a dulcíssima e deliciosa Shu Qi, de Millennium Mambo e Carga Explosiva.
Dia 01/12
Começa dezembro, o mês do natal, e o Telecine Cult nos lembra disso exibindo Natal Branco (White Christmas, 1954), filme de Michael Curtiz com Bing Crosby e Danny Kaye. O grande destaque desse musical, no entanto, fica para as composições de Irving Berlin. Aproveitem porque esse mês o Papai Noel não passou nos canais Telecine e a oferta de filmes novos na programação é pouca e cheia de filmes ruins. 22:00, horário das estréias, para variar.
Dia 02/12
Nova fornada de clássicos aparecendo na programação da Cinemax. às 11:00, teremos a versão da produtora Hammer para A Múmia (The Mummy, 1959), filme dirigido por Terence Fisher e estrelado por Peter Cushing e Christopher Lee.
Um pouco mais tarde, às 16:15, teremos a adaptação que Fritz Lang filmou do romance de Emile Zola A Besta Humana (anteriormente filmado por Jean Renoir com o mesmo nome). Desejo Humano (Human Desire, 1954) é estrelado por Glenn Ford e Gloria Graheme, a mesma dupla que Lang utilizou em Os Corruptos/The Big Heat. Dois momentos obrigatórios do cinema dos anos 50, apesar de não partilharem muito mais que isso.
Dia 03/12
A briga pelo horário nobre da semana, a famosa sessão de sábado à noite, está bem melhor do que a média essa semana. Na HBO, às 21:00 passa Harry Potter e o Prisioneiro de Azkaban (Harry Potter and the Prisoner from Azkaban, 2004), dirigido por Alfonso Cuarón e melhor título da série até agora. No Telecine Premium, passa Colateral (Collateral, 2004), um dos melhores filmes de Michael Mann, às 22:00. Ambos têm um cuidado visual incomum geralmente em Hollywood. Colateral, no entanto, feito em HDTV e filmado em grande parte em exterior-noite, pode sofrer muito mais com a perda das sutilezas devido à tradução para a telinha, e grande parte da força do filme vem do fato de Mann ser um grande estilista visual. Talvez seja a ocasião de ver os dois filmes em DVD (onde será respeitado o formato original do filme, pelo menos em Colateral) e ligar no A&E para conferir Um Sonho Sem Limites (To Die For, 1995), filme que Gus Van Sant fez há dez anos atrás com Nicole Kidman. Há dez anos atrás, ninguém poderia imaginar que Gus Van Sant seria um dos nomes ousados e criativos do cinema contemporâneo, e Nicole Kidman seria uma das musas maiores do cinema americano. Nesses momentos, uma volta na máquina do tempo pode dar novas interpretações a esse filme que na época de lançamento parecia tão sem propósito. Passa às 22:00.

Dia 11/12
Esse dezembro não é exatamente um mês de grandes surpresas. Tanto a rede Telecine quanto a RetrôTV, responsáveis por muitas das raridades exibidas nos canais a cabo, apresentam uma programação bastante requentada e sem grandes estréias no mês. Considerando que alguns anos atrás o fim-de-ano era motivo para o saudoso Telecine Classic reexibir suas principais mostras (ou seja, algo como Rossellini, Ophüls, Renoir, Satyajit Ray...), a "guinada para o cult" vem com um certo esquecimento daquilo que o canal já fez de melhor. Mas, se a semana está pouco propícia a descobertas, em compensação ela está muito rica para aqueles que desejam descobrir tardiamente ou rever alguns dos filmes mais poderosos que entraram em cartaz nos últimos anos. E o destaque do dia é um dos mais poderosos entre eles: Elefante (Elephant, 2003), filme de Gus Van Sant vencedor da Palma de Ouro em Cannes e grande candidato ao título de melhor filme da década (especialmente se Apichatpong Weerasethakul não tivesse feito Mal dos Trópicos, mas isso é detalhe). Filme montado como um quebra-cabeças sobre ação e reação, mais sobre as reações sociológicas e jornalísticas ao episódio de Columbine do que exatamente uma "reencenação" do acontecimento, Elefante não busca soluções ou explicações (coisa que lhe valeu a maioria das inúmeras críticas que o filme teve), mas procura nos mostrar que para eventos complexos procurar saídas simples é algo infame e abjeto. E Gus Van Sant o faz com uma contundência e uma beleza sem igual. Estréia no Cinemax às 22:00 (atentar para o formato: o original é 1:1,33, ou seja, sem tarjas em cima ou embaixo). Antes disso, no Canal Brasil, uma das maiores raridades da semana (a outra também é brasileira, mais abaixo): dois documentários de Eduardo Coutinho feitos para o "Globo Repórter" no final da década de 70: às 16:00 passa Seis Dias de Ouricuri (1976) e, às 16:40, Teodorico, o Imperador do Sertão (1978). Obrigatórios e necessários.
Dia 12/12
Outro dia cheio de atrações entre o interessante e o essencial. Logo no comecinho, às 09:50, o mais obrigatório: Paraíso Infernal (Only Angels Have Wings, 1939), possivelmente a obra-prima de Howard Hawks, passa no Cinemax Prime. Mais à noite, três estréias em programação. A mais interessante (e inesperada, já que nenhum filme anterior do diretor, nem mesmo o mais famoso Só Deus Sabe/Dieu seul me voit, tinha chegado ao cabo) é Le Mystère de la chambre jaune/O Mistério da Câmara Amarela (2003), filme de Bruno Podalydès, estrelado por seu irmão Denis Podalydès, que passa no Cinemax às 23:30. Antes disso, mais um filme de John Sayles que vai direto para a tv a cabo no Brasil sem sequer ter passado pelos festivais de cinema. Depois de Sunshine State/Terra do Sol, agora é a vez de Silver City (2004), espécie de filme de investigação-filme político-regional aparentemente à maneira de Lone Star. No Telecine Premium às 22:00. Às 23:50, no Telecine Emotion, estréia Marcas da Vingança (Forever Mine, 1999), filme de Paul Schrader.
Dia 13/12
Uma das instâncias mais significativas para se ver uma certa ideologia do cinema brasileiro da década de 90 até hoje está na maneira como esses filmes tentaram adaptar a obra de Nelson Rodrigues e acabaram transformando-a numa espécie de zoológico da classe trabalhadora da zona norte carioca, ou a vida suburbana vivida entre o kitsch, o decadente e o estúpido. Ora, isso deve-se naturalmente ao fato de que Nelson Rodrigues sabia do que estava escrevendo porque conhecia esse mundo, ao passo que o cineasta criado nos estúdios publicitários deriva de uma cultura de aquário com muito pouco ou nada de cultura de rua (quer dizer, além de subir o morro com fins narcóticos). Através desse prisma, é interessante ver se o programa Retratos Brasileiros dedicado a Nelson Rodrigues, que o Canal Brasil passa às 20:00, vai se render a essa imagem ou vai tentar criar outra, a de um dramaturgo interessado sobretudo na natureza humana e tratando os pecados de cada suburbano como pecados de todos nós. Em seguida, dois curtas sobre Nelson Rodrigues: às 20:30 o recente A Mulher das Bofetadas (dir. Iziane Mascarenhas, 2005), e Os Filhos de Nelson (dir. Marcelo Santiago, 2000). E já que falamos de curtas-metragens, vale a pena recomendar o informativo e bem-feito curta-metragem Candeias da Boca pra Fora (dir. Celso Gonçalves, 2002), em homanagem ao diretor Ozualdo Candeias, que só é representado no mesmo canal com seus filmes menos pessoais, longe do brilho de petardos como Aopção, Manelão e Zé Zero, entre muitos outros.
Dia 14/12
Alguns filmes feitos nos últimos cinco anos mercem olhares mais dedicados, às vezes olhares que nem poderiam ser realizados à época que o filme entrou em cartaz. Um caso desses é As Virgens Suicidas (The Virgin Suicides, 1999), primeiro longa-metragem dirigido por Sofia Coppola, que viria a dirigir em seguida Encontros e Desencontros, e de certa forma reformulando sua carreira, ou ao menos criando outras formas possíveis de ver seu primeiro longa. Teremos a oportunidade de revê-lo às 22:00 na AXN. Mais cedo, às 17:30, e em modo reverso, passa Longe do Paraíso (Far From Heaven, 2002), de Todd Haynes, filme que foi tido por muitos como um filme neo-clássico ou simplesmente como "uma pura história de amor" quando, na verdade, há muito mais em jogo no filme, inclusive do ponto de vista conceitual. Isso, naturalmente, é sublinhado para quem já assistiu a outros filmes de Todd Haynes, sobretudo Superstar – The Karen Carpenter Story (1987), uma espécie de cinebiografia da cantora dos Carpenters interpretado exclusivamente por bonecas Barbie e focando nas origens sociais e familiares da anorexia. A volta ao maravilhoso mundo dos melodramas de Douglas Sirk funciona como um dispositivo conceitual em que Haynes poderá refletir sobre o estatuto da representação social no cinema dos anos 50 e como o cinema de hoje ainda tenta criar subterfúgios para resguardar um modo-de-vida branco-heterossexual da sociedade americana.
Dia 15/12
Dois grandes destaques brasileiros: às 11:30, o Canal Barsil exibe um programa Retratos brasileiros dedicado a Mário Carneiro, um dos maiores diretores de fotografia do cinema brasileiro, que também é pintor e ocasionalmente diretor de cinema. Em seguida, sua única incursão no longa-metragem de ficção: Gordos e Magros (1977), que passa às 12:00. À noite, mais exatamente às 22:35, o mesmo canal exibe na sessão Brasil Cult dois filmes do recentemente premiado Edgard Navarro (que faturou quase tudo em Brasília esse ano com seu primeiro longa, Eu me Lembro), o mais conhecido SuperOutro (às 23:25) e o ineditíssimo Talento Demais (1995), "documentário" de guerrilha sobre a produção de cinema na Bahia. Necessário e uma justa homenagem a umdos maiores nomes do cinema brasileiro nos últimos 25 anos, impedido de fazer seu primeiro longa pelos suspeitos usuais do coronelismo nacional.
Dia 16/12
Enquanto o AXN exibe às 22:00 M. Butterfly (idem, 1993), filme de David Cronenberg que talvez possa ser o que mais rime com seu mais recente Marcas da Violência (pela intronização "sem marcas" de questões de contuda num cinema em geral sempre levado a traduzir somaticamente a perturbação mental)
, o Cinemax estréia End of the Century: The Story of the Ramones (dir. Jim Fields e Michael Gramaglia, 2004), filme exibido no Festival do Rio ano passado que mostra, através de depoimentos muito mais sinceros do que de costume, a trajetória de uma das mais importantes bandas de rock de todos os tempos, e, em outra chave, um incrível produto de seu tempo. Pode ser que originalmente esse filme só vá ter apelo aos fãs do gênero ou da banda, mas esse filme é de interesse geral, tanto pela qualidde de sua realização quanto por como o assunto transcende a mera factualidade da existência da banda e toca em outros assuntos (artísticos, de grupo, da época...).
Dia 17/12
Aproveitando que Jogos Mortais 2 entrou em cartaz há pouco, o Telecine Premium estréia em sua programação o Jogos Mortais original (Saw, dir. James Wan, 2004) que deu origem à série. Mais feliz é a HBO, que exibe o bem superior (mas não exatamente bom, apenas simpático) Homem Aranha 2 (Spiderman 2, dir. Sam Raimi, 2004), continuação honesta da história do jornalista/univesitário Peter Parker e sua luta com a responsabilidade pelo poder que adquiriu. Nos seus melhores momentos, o filme até consegue ser psicanalítico de uma forma interessante. Mas o destaque do dia vai mesmo para Scanners – Sua Mente Pode Destruir (Scanners, 1980), do mesmo David Cronenberg que era recomendado acima, só que num período bastante diferente de seu cinema, quando identificava sua produção cinematográfica mais com os preceitos do filme de horror. Não que de lá pra cá o horror tenha mudado, ele é só mais aceitável socialmente porque o horror intronizado é mais "de bom gosto". Em todo caso, tanto lá quanto cá, o cinema de Cronenberg é essencial. Scanners passa no Telecine Cult. E todos os filmes passam às 22:00.
Dia 25/12
Úlitma semana do ano, momento de fazer os votos para o ano que vem e, paralelamente, realizar o fechamento do ano que passou. 2005 não terá passado sem algumas mudanças no panorama da televisão a cabo. De bom, a incrível rapidez com que alguns filmes chegam direto à exibição, às vezes antes mesmo de completar o tempo natural de entrada em festival, possível lançamento em vídeo, etc. Ultimamente, só para dar exemplo: O Mistério da Câmara Amarela de Denis Podalydès no Cinemax, ou Um Homem de Verdade dos irmãos Larrieu na TV5. De ruim, a lenta e progressiva transformação dos canais da rede Telecine um depositório de filmes cada vez mais convencional. Já foi o tempo em que só os fascinados pelo cinema de 50 para trás reclamavam; agora está disseminado (e, aparentemente, a Globosat decidiu "compensar" oferecendo os canais da HBO, por um acréscimo módico da assinatura, naturalmente). Final de ano é isso: junto com as dicas dos filmes, um pouco de retrospectiva sobre o que foi esse ano... O dia de Natal pode ser muito agitado, com almoços de família que furam o dia inteiro, ou completamente parado, um feriado em que se fica o dia inteiro esperando o que fazer. Neste último caso, há vários filmes de interesse para se ver. Começando às 13:10 com Guerra e Paz (War and Peace, 1956), de King Vidor, que o Telecine Cult estréia em sua programação. Esse filme foi recentemente recomendado quando passou na RetrôTV, mas quem sabe no Cult o filme passa com a integridade de seu enquadramento respeitada. Em seguida, no mesmo canal mas três horas e meia depois, às 16:40, passa Johnny Guitar (idem, 1954), um dos mais belos filmes de Nicholas Ray, o que também significa um dos mais belos filmes do mundo. Trocando de canal e rumando para filmes mais recentes, o HBO Plus* passa às 19:45 (ou 16:45 no HBO Plus normal, para quem estiver com vontade de perder o filme de Ray) Sexta-Feira Muito Louca (Freaky Friday, 2003), primeira parceria de Mark S. Waters com a bela e talentosa Lindsay Lohan, união que se consolidaria no bacaníssimo Meninas Malvadas no ano seguinte. E Se Fosse Verdade, que entra sexta-feira em cartaz, comprova o talento de Waters para dirigir atrizes e guiar o ritmo da comédia no metrônomo. Por fim, às 22:45 a HBO passa Sobre Meninos e Lobos (Mystic River, 2003), de Clint Eastwood, que se termina com os festejos de uma parada comunitária que evolui pelas ruas da vizinhança em que, anos antes, os três meninos viveram um trauma conjunto (mesmo que com conseqüências muito diferentes para cada um). Natal sempre é uma dessas celebrações de si mesmo, esse ideal de um "espetáculo de si mesmo", um imanentismo do espetáculo (ao contrário da separação do espetáculo das artes, que implicam poucos artistas e muito público) que cai muito bem como pano de fundo para explorar as diferenças de personalidade entre os membros diferentes da sociedade (no caso do filme) e da família (no caso dos feriados de fim de ano). Em todo caso, 2005 é também um ano de Clint Eastwood, e vale a pena assistir a Sobre Meninos e Lobos com os olhos de quem já viu Menina de Ouro...
Dia 26/12
Juventude Transviada (Rebel Without a Cause, 1955) é certamente o filme mais famoso de Nicholas Ray. É também o filme que levou James Dean ao estrelato, e o filme em que ele é mais lembrado até hoje (ofuscando filmes que são menores, mas de jeito nenhum perdíveis: Vidas Amargas e Assim Caminha a Humanidade). E também é um dos filmes em que Natalie Wood está mais bela. Bom, mas nada disso explica a incrível beleza que o filme tem até hoje, com a força cromática e significativa do vermelho através das roupas e dos objetos dos personagens, da fúria interna dos três adolescentes em sua incapacidade de viver sob a égide de uma moral pesada que seus pais lhes impingem. No cinema de Nicholas Ray, a vida é algo que apenas alguns personagens experimentam, mas ela é ao mesmo tempo um fulgor e uma maldição: ela é sempre a explosão de uma violência que maculará aquele que a detém. O filme passa às 23:00 no quadro de uma homenagem que a RetrôTV faz a Marilyn Monroe e a James Dean conjuntamente. Considerando que no mês passado eles fizeram uma excelente e nada óbvia mostrinha dedicada a road movies, essa aqui só revela o óbvio...
Dia 27/12
Telecine Cult. O que desejamos em 2006 para esse canal? Que não seja uma mera plataforma para filmes cuja estética se adequa ao cinema de bistrô, que haja ousadia na seleção de títulos, que os programadores olhem para além dos filmes lançados em circuito e vídeo no Brasil, e que a pecha de lançar os filmes "de circuitinho", como são chamados, não os faça esquecer da enorme importância de manter viva a memória do cinema dos anos 60 para cá. Num dado momento, o Telecine Classic era o lugar perfeito para fazer a descoberta de vários cineastas e filmes raros, tornando novamente disponíveis filmes de valor inestimável para o cinema (considerando que o mercado de VHS e DVD no Brasil está longe de ser bem explorado em termos de clássicos, a importância do canalé maior ainda). Nessa semana, a estréia mais interessante de filme recente que o TCC propõe a seu público é Tirésia (Tiresia, 2003), ousado segundo longa-metragem de Bertrand Bonnelo. Mais recentemente, Bonnelo realizou o curta-metragem Cindy, the Doll Is Mine, estrelado por Asia Argento e feito a partir de uma canção do grupo americano Blonde Redhead. O filme foi uma das sensações de Cannes, mas até agora, lhufas no mercado brasileiro? Que tal em uma de nossas emissoras a cabo? Tirésia passa às 22:00.
Dia 28/12
De todos os canais estrangeiros, os leitores sabem que é disparada a TV5 que aparece com mais destaque aqui. Alguns momentos são muito mais fortes que os outros. Assim, o primeiro semestre do ano foi completamente matador, exibindo filmes raros de Pialat (Nós Não Envelheceremos Juntos), Week-End de Godard, Eternamente Sua de Apichatpong Weerasethakul, Hitler de Syberberg e Shoah de Claude Lanzmann (dois filmes que desafiam o espectador por sua duração de mais de 8 horas e pelo igor de sua estética), entre outros. Polícia (Police, 1985), de Maurice Pialat, não é tão raro nem tão especial, mas é ainda assim um dos destaques dessa semana de fim de ano, mesmo em um horário meio complicado: 03:30 de quarta para quinta-feira. Perfeito para gravar. E que em 2006 tenhamos muito mais filmes franceses e estrangeiros para descobrir na TV5. Mais cedo, O Cinemax Prime exibe às 19:00 Original Pecado (The More the Merrier, 1943), filme de George Stevens estrelado por Jean Arthur, Joel McCrea e Charles Coburn (com direito a Oscar de ator coadjuvante para este último). Para 2006, esperamos que o acervo de filmes clássicos que o complexo HBO/HBO Plus/HBO Family/Cinemax/Cinemax Prime controla seja cada vez mais vasculhado e que eles ganhem uma visibilidade maior do que as manhãs e o começo da tarde. Há tesouros sendo exibidos com pouquíssima divulgação...
Dia 29/12
Programa duplo? Não é exatamente nada muito raro, já que temos um dvd lançado no formato certo e com boa qualidade, mas Vampiros de Almas (Invasion of the Body Snatchers, 1956), de Don Siegel, é sempre um ótimo destaque. Ainda mais quando é estréia na programação do Telecine Cult, o que significa que o filme deve circular pelos próximos meses na grade do canal. O filme passa às 20:35, fora do horário nobre dos lançamentos, mas isso acaba nos dando a chance de sair do filme de Siegel e sintonizar no Canal Brasil, que exibirá o bastante raro Cordélia Cordélia (1971), filme de Rodolfo Nanni, no quadro do Brasil Cult. Adaptação de uma peça de Antonio Bivar, o filme é o segundo filme de ficção de Nanni, cuja fama se deve a O Saci, seu primeiro longa, de 1953. 2005 viu a concretização de uma estratégia destinada a arejar a programação outrora repetitiva do Canal Brasil. Embora tenha dado certo, criando sucessos como os programas de Pereio e Selton Mello, os filmes foram relegados a segundo plano, um pouco como a MTV foi deixando a música de lado e fazendo com que hoje ninguém entenda o M da sigla. O grande trunfo foram as sessões temáticas, como Brasil Cult e É Tudo Verdade, que trouxeram alguma ousadia para a programação do canal, que no geral continua servindo à ideologia do "cinema brasileiro de qualidade", relegando as produções mais selvagens aos horários pouco visíveis ou simplesmente não exibindo. Que em 2006 o Canal Brasil caia na real e não tenha vergonha de ser Brasil.
Dia 30/12
Não falávamos de filmes que estréiam com
pouquíssimo tempo de sua primeira exibição pública? Pois bem: Le Pont des arts (idem, 2004), de Eugène Green, é um exemplo claro disso. O filme estreou em festivais em outubro do ano passado e ei-lo aqui, sendo exibido um ano e meio depois. Le Monde vivant (2003), terceiro longa do diretor e filme imediatamente anterior a este, deu a Green uma grande projeção e a voga, em alguns jornais, de um dos cineastas mais pessoais do cinema francês contemporâneo. Chance de vê-lo com seu filme mais recente às 03:35 na TV5, na madrugada de sexta-feira para sábado. Mais cedo, a Film & Arts, outro canal que aparece aqui com alguma freqüência, exibe Dá-me um Beijo (Kiss Me Kate, 1953), numa época em que havia uma profusão de experiências com formatos cinematográficos panorâmicos, terceira dimensão e cor. Dá-me um Beijo é a tentativa de fazer um musical em 3D e som estéreo, além de uma tela panorâmica para tentar disputar com o CinemaScope patenteado pela Fox. Os espectadores da F&A, portanto, não poderão ver o filme em 3D com todas as suas famosas brincadeiras de jogar coisas para a câmera (recuperadas no dulcíssimo Spy Kids 3D de Robert Rodriguez). Dirigido por George Sidney, estrelado por Kathryn Grayson, Howard Keel e Ann Miller, os maiores atrativos do filme são a coreografia do filme, assinada por Bob Fosse, e a estranha mistura de Cole Porter e Shakespeare que a história cria, já que no filme Porter é um personagem que tenta montar uma versão de A Megera Domada. Às 22:00.
Dia 31/12
Por fim, no último dia do ano, o que fazer? Há algum tempo atrás, o Eurochannel, na época em que o canal tinha boa programação de filmes, decidiu exibir o exigente e longo (e não por isso menos belo) Os Destinos Sentimentais de Olivier Assayas enquanto o ano virava. O resultado de público deve ter sido pífio, mas o video-cassete deste que vos fala guardou tudo... Tudo complica quando o dia 31 cai num sábado. Continuamos fazendo do sábado às 22:00 o grande horário para estréias? O Telecine Premium acredita que não, e exibe uma estréia pouco chamativa, Barbeiragem Total (Barbershop 2 – Back in Business, 2004, dir. Kevin Rodney Sullivan), enquanto a HBO responde afirmativamente e exibe o bem mais falado Efeito Borboleta (Butterfly Effect, 2004, dir. Eric Bress e J. Mackye Gruber), estrelado por Ashton Kutcher, da série That 70s Show e do bacaníssimo Cara, Cadê Meu Carro?. Mas o destaque do dia vai mesmo para a dose dupla de Roberto Pires que o Canal Brasil faz. às 18:00, passa o programa Retratos Brasileiros dedicado ao diretor de A Grande Feira, e em seguida, às 18:30, o canal exibe um de seus filmes mais importantes e invisíveis, Tocaia no Asfalto (1962). Feliz ano novo e até 2006 com muitos filmes na sala de cinema e na sala de casa!

Dia 01/01
Primeiro dia do ano, nenhuma mudança significativa no calendário, como era de se esperar. O que fazer, então, para fugir das incontáveis retrospectivas que a televisão exibe nesse dia? Uma possibilidade é assistir a Happy End (Nowhere to Go But Up, 2003), de Amos Kollek. Co-produção EUA/França/Alemanha, o filme tem Audrey Tautou no papel principal, e retoma o universo que Kollek retratou em Sue, seu melhor filme (e que, com resultados parcialmente bem-sucedidos, tentou trazer de volta em Fast Food, Fast Women). Famoso por seus retratos femininos (depois de Sue houve Fiona, Angela, Bridget, quase sempre com a atriz Anna Thomson), Kollek é um diretor que não consegue manter a regularidade. Com Audrey Tautou, famosa por fazer personagens perversamente dóceis e por sua carinha de anjo (O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, Bem Me Quer, Mal Me Quer), sabe-se lá se Kollek não cai na simpatia barata e um tanto vazio da facilidade que a atriz tem para expressar sua docilidade. Estréia no Cinemax às 22:00.
Dia 02/01
É Fogo na Roupa, de 1952, é o primeiro filme que Watson Macedo faz depois de sair da Atlântida. Mas não é o único motivo para se ver o filme. Esse período representa um momento de consolidação da obra do cineasta, vindo logo após de alguns de seus filmes mais celebrados, Carnaval no Fogo e Aviso aos Navegantes, e seu filme dramático, A Sombra da Outra. É Fogo na Roupa ainda conta com duas estréias de peso: o comediante Ankito e a cantora Elizeth Cardoso, que só conseguiu gravar depois de aparecer no filme. O Canal Brasil exibe às 14:30. O filme conta ainda com Heloísa Helena, Virgínia Lane, Linda Batista, Dircinha Batista, Emilinha Borba e Ivon Cury, com roteiro de Alinor Azevedo.
Dia 03/01
Oficialmente, o dia em que o ano começa. Por quê? Porque a Globo lança o que pode ser o grande fenômeno da televisão brasileira em 2006, a série JK, direção de Dennis Carvalho. Considerando que a última série política que a Globo fez, Anos Rebeldes, contribuiu sensivelmente para o zeitgeist do fim da era Collor, talvez JK venha a encher o imaginário atual e exercer alguma influência em quem vai estar sentado na cadeira da presidência no dia 3 de janeiro de 2007. Veremos. Enquanto a Globo estréia JK, o Canal Brasil exibe Os Anos JK: Uma Trajetória Política (1980), de Sílvio Tendler, na sessão É Tudo Verdade, às 22:40. Homenagem curiosa, já que essa coincidência é para comemorar os 50 anos do começo de mandato de Juscelino. Só que JK só assumiu a presidência em 31 de janeiro de 1956. Ou seja, a sessão É Tudo Verdade, na verdade, faz uma homenagem... à série da Globo! Paralelamente, o Telecine Cult, alheio à política nacional, estréia às 22:00 O Filho (Le Fils, 2002), dos irmãos-pilares do cinema político de autor, Luc e Jean-Pierre Dardenne. Vencedor da Palma de Ouro de melhor ator (e realmente, apaixonando-se ou não pela proposta deles, há de se conceder que os atores em seus filmes estão sempre inacreditáveis de bons), o filme mostra que os Dardenne vão até o limite do que fazem, e que filmam o trabalho de forma impressionante. No entanto, o próprio trabalho deles, aqui, começa a ficar transparente, o mecanismo se vê o tempo todo (porque não há acréscimo ao já feito em Rosetta ou A Promessa), e a intensidade se dilui um pouco. Ainda assim, um filme forte.
Dia 04/01
O film do Telecine Happy ocasionou uma aposentadoria prematura aos filmes de Jerry Lewis assinados por Frank Tashlin e aos dirigidos por ele próprio, pérolas como Artistas e Modelos e Ou Vai ou Racha. A compensação não vem na mesma moeda, mas ainda assim alguma coisa é melhor que nada: O Biruta e o Folgado (The Stooge, 1953), dirigido por Norman Taurog (que não era nenhum Tashlin) e estrelado pela dupla Jerry Lewis-Dean Martin, que o Telecine Classic estréia às 15:15. Horário muito do esquisito para uma estréia dessas, e isso talvez já estabelece um padrão de como certos filmes antigos menos conhecidos serão tratados no TCC daqui em diante. Em todo caso, O Biruta e o Folgado é um filme cujo acesso não é fácil, e para muitos é o melhor filme da dupla Lewis/Martin (claro, é uma heresia com Tashlin, mas...).
Dia 05/01
Já que semana passada um dos filmes recomendados foi de George Stevens (Original Pecado), vamos começar o ano como terminamos o anterior recomendando o filme que Stevens rodou imediatamente antes, E a Vida Continua (The Talk of the Town, 1942, nÃO confundir com o filme de Kiarostami ou com o americano, com Matthew Modine). Stevens é mais famoso por seus filmes do pós-guerra, d peorudções muito mais custosas e com temas fortes. Mas Stevens pré-guerra pode ser bem mais dinâmico e interessante... Passa às 11:00 no Cinemax Prime e conta com Cary Grant e Jean Arthur no elenco – aliás, afora a obra-prima que é Paraíso Infernal/Only Angels Have Wings, esse é o único outro filme em que os dois contracenam; obrigatório, não? Mais tarde, o mesmo Cinemax Prime exibe Starman – O Homem das Estrelas (Starman, 1984), uma mistura de melodrama, aventura e ficção científica, naturalmente com um quê da fórmula de ET, mas aqui dirigido por alguém que nunca teve paciência para ficar adoçando e adulando o público, John Carpenter. Pensando bem, é um filme excelente para começo de ano, em história, em mensagem, em tudo. 22:30.
Dia 06/01
Dois filmes excelentes e não tão comuns
sendo exibidos no mesmo horário. Azar, sorte? Sorte, naturalmente de quem pode escolher. E, considerando que um deles é no Cinemax Prime, que disponibiliza um canal que repete a mesma programação três horas depois, isso não é tão grave assim. Às 22:30, o Cinemax Prime exibe Adorável Vagabundo (Meet John Doe, 1941), belo filme de Frank Capra com Barbara Stanwyck e Gary Cooper, numa copmédia com espírito social que permaneceu como a marca registrada do diretor. Mas, antes disso, o Cinemax Prime passa às 20:30 um filme que pode se revelar como algo bem interessante: é o documentário The Cutting Edge: The Magic of Movie Editing (dir. Wendy Apple, 2004), sobre a montagem no cinema, com participação de diretores como Francis Ford Coppola, George Lucas, Anthony Minguella, James Cameron, Paul Verhoeven e Quentin Tarantino, além de montadores como Walter Murch e Thelma Schoonmaker. Mesmo que seja um mau filme, os depoimentos serão provavelmente excelentes. Às 22:00, o Eurochannel exibe Mulheres Diabólicas (La Cérémonie, 1995), de Claude Chabrol, um dos dois melhores Chabrol nos últimos quinze anos (o outro seria Betty, um filme que ficou um pouco relegado ao anonimato). Curioso que, na virada do ano, o Eurochannel tenha exibido um Chabrol diferente dos quatro que exibia indefinidamente... Isso significa uma nova formada? Tomara...
Dia 07/01
Primeiro sábado do ano e tudo pega fogo. Até canais que geralmente não entram na briga vêm com tudo nesse dia 07.Para começar o Cinemax, que estréia em sua programação Sobre Café e Cigarros (Coffee and Cigarettes, 2003), coletânea dos filmetes que Jim Jarmusch faz há tempos com encontros inusitados em bares regados a café e cigarros, como o título sugere. Embora não conste entre os melhores filmes de Jamusch, o filme tem algums instantes mágicos, e serve um bocado para entender o que realmente interessa Jarmusch em tudo o que ele faz, uma certa relação entre personagens, o aproveitamento de tempos mortos, uma relação com os pequenos prazeres (depois reconfigurada pelo próprio cinema de Tarantino, com suas massagens no pé e interpretações de músicas da Madonna). E é bem melhor que Flores Partidas. Às 22:00. Já o Telecine Cult, no mesmo horário, estréia um dos maiores filmes dos anos 90, O Pagamento Final (Carlito's Way, 1993), de Brian De Palma, momento decisivo na carreira de Al Pacino e filme responsável por uma seqüência final de antologia para ficar na história do cinema. O filme nào é só isso, naturalmente, mas a gente deixa o resto para o leitor descobrir. Já a grande estréia da semana na HBO sai do canal mais badalado e vai para a HBO Plus, com Como se Fosse a Primeira Vez (50 First Dates, 2004), de Peter Segal, às 21:00. Ganha tranqüilamente da estréia do Telecine Premium, Mulheres Perfeitas (The Stepford Wives, 2004), simpática porém tola comédia de Frank Oz, que passa às 22:00. A graça é que, às 20:00, o Telecine Cult exibe As Esposas de Stepford (The Stepford Wives, 1975), a versão original da estréia do TCP, dirigida por Bryan Forbes. Deu pra perceber que o que mais tem nesse sábado é oferta, não? Que seja assim o ano todo. [Infelizmente, não deu para cobrir a programação da RetrôTV porque o site do canal ainda fornecia a programação de dezembro, embora dê alguns destaques de janeiro: Neil Simon e o comediante Harold Lloyd na sessão "Shhhh!"; a coluna dessa semana é dedicada a Roberto Garcia Morrone, leitor costumeiro dessa coluna, fã dos filmes clássicos e defensor de carteirinha da RetrôTV].
Dia 15/01
Domingo sempre foi um dia em que a coluna foi errática, para dizer o mínimo. Freqüentemente atualizada na madrugada de domingo para segunda, ela acabava deixando de informar o leitor sobre um dos dias da semana e, de certa forma, quebrava o ritual de periodicidade que se pede, obrigatoriamente de uma coluna. Como uma das mudanças que a seção deverá sofrer (e sempre para melhor) esse ano, continuaremos a publicar a sessão de filmes da semana entre domingo e segunda-feira, mas tomando como primeiro dia da semana a própria segunda. Mas, para não deixar feio, a gente cobre domingo também, mesmo porque é um dia dos mais agradáveis em estréias (e porque, mal ou bem, são as primeiras exibições e os filmes se repetirão). A TV5 aposta em janeiro num ciclo dedicado ao cineasta francês Claude Miller, cineasta com um currículo admirável de assistente de direção (Duas Garotas Românticas de Jacques Demy, Week-end de Jean-Luc Godard, A Grande Testemunha de Robert Bresson, entre outros) e gerente de produção (vários Truffaut) e mais conhecido justamente por ter filmado o que seria o último projeto de Truffaut, Ladra e Sedutora (La Petite Vouleuse, 1988). É exatamente esse filme que a TV5 exibe neste domingo, às 21:25. Já às 23:30, na Sessão Brasil Cult, o Canal Brasil exibe Exorcismo Negro (Brasil, 1974), de José Mojica Marins, um dos filmes curiosamente menos comentados de Mojica, que ainda assim é um de seus melhores. A razão de ser tão pouco comentado talvez seja justamente o fato de que, na obra toda de Mojica, esse talvez seja o filme que menos consiga ser interpretado como cult, justamente: aproximação com o cinema americano – inclusive se aproveitando da voga do filme de William Friedkin que o título referencia –, fluência narrativa maior e uma pronunciada ausência das cenas mais abstratas e esquisitas que fazem o gosto do "Coffin Joe" como figura de culto trash. Como a razão pela qual gostamos de Mojica não tem nada a ver com isso, e passa, ao contrário, por sua mise-en-scène e sua visão corroída da humanidade (não está tão longe de Nelson Rodrigues), assistiremos felizes e salivando à exibição de Exorcismo Negro.
Dia 16/01
O cinema de André Techiné não anda sendo exatamente privilegiado por nossos circuitos exibidores. Seu último filme a entrar em cartaz foi Os Ladrões. Depois disso, Alice e Martin chegou até a ter cópia legendada em português, e mesmo assim não ganhou lançamento comercial. Depois disso, ele lançou um filme decisivo, Loin/Distante (2001), Anjo do Mal/Les Égarés (2003) e Les Temps qui changent (2004), os dois primeiros exibidos somente em festivais, e esse último nem isso. Enquanto esperamos alguma boa alma exibir seu último filme e rezamos para que seu próximo projeto, Les Témoins, tenha uma sorte melhor no país, podemos assistir ao belo Anjo do Mal, que o Cinemax exibe às 20:15. Quando acabar, dá tempo de colocar no Telecine Premium e assistir à estréia de Não se Mova (Non ti muovere, 2004), segundo longa-metragem dirigido pelo ator Sergio Castellitto (de Quem Sabe, de Jacques Rivette, e A Hora da Religião, de Marco Bellocchio). O filme tem a energia e intensidade física típica dos filmes de ator, mas é muito mais que isso. É um mergulho no universo tortuoso de um médico chegando à meia-idade e rodeado por uma série de fantasmas de masculinidade que desenvolve uma relação adúltera e violenta com uma mulher bem mais pobre. Não se Mova toca forte exatamente por não nos dar um ponto de ancoragem, ao mesmo tempo nos mergulhando na história mas sem nos dar um ponto de ancoragem através do qual navegar confortavelmente pela história. Considerando que foi um filme muito pouco visto, e ainda menos comentado, quem sabe agora o filme tenha a verdadeira chance de ser apreciado... Passa às 22:00.
Dia 17/01
Grande evento da semana, a retrospectiva dedicada a Sérgio Ricardo no Canal Brasil traz à luz uma obra importante que curiosamente é deixada de lado há muito tempo. De Sérgio Ricardo, hoje só se relembra o fato de ele ter quebrado o violão num festival da canção e a composição da trilha sonora de Deus e o Diabo na Terra do Sol, mas tanto a sua carreira como cantor popular-engajado quanto sua obra de cineasta estão envoltas por uma cortina de fumaça que nem dá pra explicar. Bem-vinda, então, é a oportunidade de ver seus longas e curtas em três dias, horário marcado às 20:00 em frente à televisão. Primeiro, é o programa Luz, Câmera, Canção enfocando a carreira musical do cantor e compositor. Em seguida, o canal exibe às 20:30 o recente curta-clip Zelão, uma animação que o próprio Sergio Ricardo fez em 2002 para uma de suas músicas mais famosas, e Esse Mundo É Meu (1964), seu primeiro longa-metragem, de um lirismo social alinhado às obras iniciais de Roberto Santos e Nelson Pereira dos Santos. Num dia movimentado, ainda podemos sintonizar às 22:00 no Cinemax e assistir ao lançamento de um filme que passou batido pelo Festival do Rio, criou alguns admiradores (entre eles esse que escreve estas mal-traçadas) e foi embora: A Última Vida no Universo (Ruang rak noi nid mahasan, 2003), do tailandês Pen-ek Ratanaruang. A história de um livreiro japonês perseguido e de uma garota tailandesa tem lá sua poesia barata "jovens perdidos no mundo" – um jarmuschismo algo presente no cinema oriental, com Shinji Aoyama como principal representante –, mas o filme tem bem mais sensibilidade que isso, e merece ser visto e experimentado com dedicação. Se não chega ao nível de um outro diretor tailandês revelado recentemente, Apichatpong Weerasethakul, isso não é demérito nenhum: quase ninguém é...
Dia 18/01
Lembra de quando o Telecine Action tinha uma sessão semanal dedicada ao cinema de Hong Kong? Pois é, dava uma dinâmica interessante à programação muitas vezes sem criatividade do canal. Garras de Aço (Wong Fei-hung chi tit gai dau neung gung, 1993), de Jing Wong e Yuen Woo-Ping – este último famoso pelo enervante epíteto "coreógrafo de Matrix" –, passa às 15:05 e, apesar de ser protagonizado por Jet Li que interpreta o famoso médico-herói Wong Fei-Hung, não faz parte da hexalogia produzida-dirigida por Tsui Hark. Ainda assim, são dois encenadores para lá de eficientes, e os filmes de ação de Hong Kong tem essa característica meio perdida desde o fim dos musicais regulares: mesmo quando o filme não é exatamente bom, é delicioso assistir pela trivialidade do espetáculo e pela leveza do connjunto, além das cintilações que sempre aparecem uma hora ou outra. Mas, considerando que estão estreando o filme num horário nada nobre, parece que o filme foi achado sobrando embaixo de uma pilha de fitas na sede da Globosat e está sendo exibido mais como raspa do tacho do que como uma volta dos filmes de HK à programação do canal. Tomara que queimemos nossa língua. À noite, voltamos com a programação do Canal Brasil dedicada a Sérgio ricardo, desta vez o curta-metragem O Menino da Calça Branca (1961), contemporâneo do primeiro momento do cinema novo não só na época mas também na estética. Talvez seja o único filme de Sérgio Ricardo mais recente nas memórias das pessoas, porque andou circulando depois de ter sido o curta-metragem que acompanhava Orfeu, de Carlos Diegues, numa última tentativa do Grupo Estação de fazer vingar o famoso "curta antes da sessão". Às 20:25, passa A Noite do Espantalho (1974), seu último longa-metragem, já parte de um período de radicalização. Argumento de Maurice Capovilla, roteiro de Jean-Claude Bernardet, fotografia de Dib Lutfi (irmão de Sérgio Ricardo), montagem de Sylvio Renoldi, presença de Geraldo Azevedo e Alceu Valença no elenco. Impossível não convencer, não?
Dia 19/01
Finalizando a programação dedicada ao cinema de Sérgio Ricardo, o Canal Brasil passa às 20:00 Juliana do Amor Perdido (1970), o outro dos três longas de Sérgio Ricardo, roteirizado pelo próprio e por Roberto Santos, e protagonizado por Maria do Rosário, mulher de destino breve mas importante no cinema brasileiro (atriz de Macunaíma, de dois filmes marginais de Neville d'Almeida e diretora de dois filmes). Assim, só fica faltando o curta-metragem O Pássaro da Aldeia para completar a filmografia de filmes dirigidos por Sérgio Ricardo. Ainda nesta quinta-feira cheia, o Telecine Premium estréia Colateral (Collateral, 2004), de Michael Mann, em sua programação, às 22:00. O fio condutor do filme não é exatamente a narrativa nem o trabalho dos atores, mas o que Michael Mann consegue fazer com câmera digital e externas noturnas, captando uma atmosfera nada comum da cidade de Los Angeles, filmando preferencialmente as interfaces transparentes que ostentam ideais de modernidade e visibilidade plena quando na verdade servem apenas para criar separação e tornar todos mais frágeis. Mas sabe-se lá se tudo isso e o estilo cuidadoso e delicado de Mann vai traduzir bem para a telinha quadrada da televisão, desrespeitando os belos enquadramentos em Scope do filme. Mais vale, na verdade, alugar ou comprar o DVD, que vem entupido de extras, e, ainda no Canal Brasil, assistir a Faustão (1970). Nada a ver com Fausto Silva: trata-se do segundo longa-metragem de Eduardo Coutinho, um filme de ficção (como seu primeiro, O Homem Que Comprou o Mundo) e, mais que isso, uma adaptação de Falstaff vertida para o cangaço. Passa no Brasil Cult às 22:35.
Dia 20/01
Robert Guédiguian é um desses cineastas que merecem mais atenção do que aquela que lhe é dada fora de seu país. A algo recente retrospectiva que exibiu seus filmes mostrou um cineasta de sensibilidade única, com um programa claro – cobrir a cidade de Marselha em sua paisagem humana –, uma visão inequivocamente de esquerda (mas interpelativa mais do que assertiva, ao contrário de seus confrades ingleses) mas acima de tudo um interesse profundo em ir além das superfícies das narrativas que ele apresenta. Cineasta de uma cidade, ele também tem uma trupe: Arianne Ascaride como a única mulher do mundo, Jean-Pierre Darroussin e Gérard Meylan como os únicos homens (o primeiro muito mais talentoso que o segundo), Guédiguian fez filmes de grande densidade humana, como A Cidade Está Tranqüila, Marius e Jeannete ou À Vida, À Morte. Embora haja por vezes um esquematismo emprestado da sociologia ou dos "grandes temas", a sensibilidade de artista de Guédiguian sabe fazer a arte falar mais alto. A TV5, que já passou uma extensa retrospectiva Guédiguian, exibe agora Mon père est ingenieur (Meu Pai É Engenheiro, 2004), filme que foi curiosamente ignorado em festivais e que deve continuar sendo, uma vez que seu último, O Último Mitterrand, já está em cartaz em São Paulo e já já vem para o Rio. O filme passa às 19:15.
Dia 21/01
Há quantos dias de sábado não tínhamos o desprazer em escolher entre filmes tão pouco expressivos para o horário nobre das estréias semanais? Antes da resposta, vamos às estréias do dia. O Telecine Premium, às 22:00, sai-se com Elektra (idem, dir. Rob Bowman, 2005), spin-off de O Demolidor que só rendeu elogios ao charme e à habilidade de Jennifer Garner, mas nada além disso (Ok, disseram que é melhor do que O Demolidor, mas isso não é exatamente um elogio). Do outro lado, um ligeramente elogiado remake de O Álamo (The Alamo, 2004), dirigido por John Lee Hancock, com Dennis Quaid, Billy Bob Thornton e Jason Patric, que é o que a HBO propõe para as 21:00 (raro caso de filme de sábado na HBO que foi direto para vídeo/dvd sem passar pelas salas de cinema). Já a HBO Plus aposta em Na Companhia do Medo (Gothika, 2003), que só prova que Matthieu Kassovitz só recebeu tamanho reconhecimento por O Ódio pelo senso de oportunidade que teve em fazer um filme com temática árabe, choque de etnias, vide no subúrbio francês, etc. Porque desde Rios Vermelhos todo seu esforço consiste em tentar ser um diretor genérico americano. Mais bem sucedido é Jean-François Richet, que fez, também sobre choques, árabes, subúrbios e etnias o belo Ma 6-T va crack-er, e depois fez o digno, mas nada especial, Assalto à 13ª DP no ano passado. Sábado é o dia menos interessante dessa semana. Quem diria!
Dia 22/01
Por fim, temos aqui o que constumamos chamar de prato cheio para o cinéfilo. Trata-se de Num Piscar de Olhos (Zmruz oczy, 2002), de Andrzej Jakimowski, que já passou numa mostra de cinema polônes que circulou no primeiro semestre de 2005 pelo Brasil, como Feche os Olhos. Sabe-se lá se presta ou não: ganhou diversos prêmios ao redor do mundo, sobretudo em seu país natal, onde parece ter faturado tudo que disputou. Mesmo que não preste, ainda é interessante ver filmes poloneses ruins, filmes russos ruins, filmes tailandeses ruins, filmes chineses ruins. Os americanos não deveriam ter o privilégio do filme ruim, e quanto mais filmes de diferentes nacionalidades aparecerem na grade, melhor para a diversidade de culturas e expressões cinematográficas que cabem no universo dos filmes exibidos na tv a cabo no Brasil. Falamos isso porque é comum alguns canais exibirem filmes de países, digamos, não convencionais: Cinemax, Cinemax Prime, Eurochannel... Mas não é comum que isso aconteça na grade dos cinco canais da Globosat, dos Telecines (a não ser, claro, que tenham sido lançados no cinema, ou tenham algum ator forte, de preferência que já tenha estado num filme americano)... Então, ainda que não se saiba se é uma tend6encia ou apenas uma exceção à regra, celebremos a exibição de Num Piscar de Olhos no Telecine Cult às 22:00.
[Curioso que, na mesma semana que mencionamos a RetrôTV (ou Retro Channel), a DirecTV, sem nada avisar a seus assinantes, rompeu contrato com o grupo que fornecia o sinal do canal. Lamentamos profundamente o gesto unilateral e desrespeitoso da rede, que aparentemente está prestes a se fundir com a Sky. Curiosamente, antes mesmo do monopólio constituído, já temos uma perda significativa da diversidade de oferta dos canais a cabo. Mas desade a fusão da Am
bev a gente sabe que qualquer lobbyzinho vagabundo é mais forte do que os aparelhos anti-truste do país. Para reclamações: http://www.retrotv.com.br/noticias/2006/0112b.html]
Dia 23/01
Nem toda semana é cheia de atrações, e essa é um exemplo vivo. Extinta da programação de uma das maiores redes exibidoras de cabo, a DirecTV, a RetrôTV começa a fazer bastante falta. Esse mês, estamos perdendo filmes raríssimos de Harold Lloyd na única sessão semanal de filmes mudos que havia na televisão brasileira, além de uma mostra "40 dias de terror", que anda exibindo autores como Edgar G. Ulmer, Lucio Fulci, Dario Argento, Mario Bava, entre outros. Aqui, temos que nos contentar com belíssimos filmes, sim, mas que são parte da programação normal do Canal Brasil, passam regularmente no canal e ainda por cima existem em vídeo. O curioso é que esses dois filmes, um clássico absoluto do cinema e outro filme mal ou bem com seu lugar assentado na história do cinema brasileiro, são aqui fruto da seleção de algumas celebridades do cinema, que comentam suas esscolhas. Assim, a atriz Zezé Motta apresentará às 22:35 o filme Absolutamente Certo (1959), de Anselmo Duarte. Às 02:15, o diretor Fábio Barreto apresentará Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Glauber Rocha. No caso do último, uma escolha que pode parecer curiosa, uma vez que o cinema dos filhos de Barreto pouco tem a ver com ousaduia estética, arrojamento e liberdade. No entanto, a admiração é autêntica: já em Yndia, Filha do Sol, seu primeiro longa, Fábio Barreto dedicada seu filme a Glauber Rocha. Infelizmente, a influência parece ter ficado apenas na dedicatória, não no impulso artístico.
Dia 24/01
Neste dia 24, o Canal Brasil inicia uma mostra dedicada ao cinema de Emiliano Ribeiro. Naturalmente, ele não é da mesma magnitude de Sérgio Ricardo, apesar de ter uma filmografia que, ao menos no tamanho da produção, se assemelha. Começa no tímido horário de 17:30, em que passa Brasil... Só Rindo (2003), média-metragem em vídeo feito a partir de uma tese sobre o brasileiro e o riso. A seguir, às 18:20, passa A Viagem de Volta (1991), documentário ficcionalizado sobre tratamento de dependentes químicos, num longa-metragem curto (80min) feito para a televisão. Nos dias seguintes, passam os curtas e longas de ficção...
Dia 25/01
Alguma outra atração na TV? Não... Então, continuemos com a programação especial do Canal Brasil, com a pequena mostra dedicada ao trabalho de Emiliano Ribeiro. Às 17:30, passa o curta-metragem João Cândido (1987), filme que encena uma entrevista com o chefe da Revolta da Chibata, em 1910. Às 17:40, passa Diga Aí, Bahia (1977), outro curta-metragem, desta vez sobre a cidade de Salvador, através de entrevistas e imagens da miséria nas ruas. Às 17:53, passa Trama Familiar (1987), média-metragem longo e ficcional (67min) sobre as cosneqüências numa família da tentativa frustrada de suicídio do filho.
Dia 26/01
Às 22:35, com apresentação de Leona Cavalli, a sessão Brasil Cult exibe o primeiro filme da chamada "fase de Paraty" de Nelson Pereira dos Santos, Fome de Amor (1968), com Leila Diniz e Arduíno Colassanti. O filme é uma adaptação muito livre de um livro de Guilherme Figueiredo, e mostra que Nelson Pereira dos Santos, como a maior parte de seus colegas do cinema novo – Glauber excetuado, naturalmente – não funciona muito bem com mensagens cifradas, metáforas transversas e a alegoria. Ainda assim, Fome de Amor é uma tentativa de abertura para novas formas de arte – como a música concreta, sendo desempenhada por um dos personagens – e uma chance para Nelson de continuar arejando sua estética, como já tinha feito em El Justicero e faria nos filmes seguintes. Mais cedo, às 17:30, o mesmo Canal Brasil exibe As Meninas (1996), adaptação de Lygia Fagundes Telles que era um projeto de David Neves antes de morrer. Emiliano Ribeiro, que seria assistente do filme, tomou o projeto e realizou um filme correto, sem o brilho que o filme teria se fosse feito por Neves, mas ainda assim um filme levado a cabo com carinho, como uma homenagem a um amigo que foi para longe.
Dia 27/01
No momento em que Se Eu Fosse Você (2005) é um grande sucesso de bilheteria, o Canal Brasil exibe o filme Pobre Príncipe Encantado (1969), primeiro filme que Daniel Filho dirigiu (e roteirizou), um veículo para o cantor Wanderley Cardoso. Só que o ex-cantor não é o único notável do elenco: temos também Maria Lúcia Dahl, Chacrinha, Rodolfo Arena, Vanusa, Flávio Migliaccio, entre outros. Curiosa coleção de filmes que circula pouquíssimo: conhecemos os filmes de Roberto Carlos, mas os filmes sobre Jorge Ben (assinado Fernando Coni Campos), Wilson Simonal (assinado Domingos de Oliveira), Wanderley Cardoso são praticamente invisíveis... Às 17:30, teremos a última sessão da retrospectiva dedicada a Emililano Ribeiro, com Condenado à Liberdade (2001), longa-metragem de ficção protagonizado por Othon Bastos e Cássia Kiss. Para fechar a fatura brasileira do dia, à 00:30 de sexta-feira para sábado, o Canal Brasil exibe Gosto do Pecado (1980), filme de Claudio Cunha também interpretado por Maria Lúcia Dahl, além de contar com Jardel Filho, Simoen Carvalho, John Herbert, entre outros. O filme não tem tanta voga quanto Snuff, Vítimas do Prazer, Sábado Alucinante nem Oh! Rebuceteio, que fazem a festa das sessões psicotrônicas, mas Claudio Cunha é um diretor que às vezes pode surpreender. Entre os destaques, temos a montagem de Eder Mazzini, a fotografia de Carlos Reichenbach e Jairo Ferreira recebendo os créditos pela música do filme.
Dia 28/01
Sábado, dia das maiores estréias da semana. E realmente, a briga é de um bom nível. Quem sai na frente é a HBO Plus, que às 21:00 exibe pela primeira vez Era um Vez no México (Once Upon a Time in Mexico, 2003), de Robert Rodriguez (curiosamente, Spy Kids 3D, do mesmo Rodriguez, passa no mesmo dia no canal HBO Family (mas não é estréia). Competindo com a HBO Plus está a HBO, que lança no mesmo horário Starsky & Hutch – Justiça em Dobro (Starsky & Hutch, 2004), de Todd Phillips, com dois dos heróis dessa nova geração de atores americanos: Owen Wilson e Ben Stiller (além de participações de Vince Vaughn e da desaparecida Juliette Lewis). Já no Telecine Premium, aproveitando o lançamento de Munique nas salas de cinema, o canal lança O Terminal (2004), de Steven Spielberg, às 22:00. Mas talvez a grande estréia do dia seja Harmada (2004), quarto longa-metragem de ficção de Maurice Capovilla, autor lendário de O Jogo da Vida, Bebel, Garota Propaganda e O Profeta da Fome. O filme pode não ter o mesmo vigor desses outros três, mas sua passagem pelas telas do Brasil foi tão pouco notada que isso faz da estréia na tv a cabo um destaque total. 23:00 no Canal Brasil.
Dia 29/01
Por fim, alguns destaques internacionais. Mac (1992), primeiro longa-metragem dirigido por Juhn Turturro, estréia no Telecine Classicàs 22:00. Em seguida, o ator dirigiu Illuminata e o recente e pouquíssimo conhecido Romance & Cigarettes. No mesmo horário, a Cinemax estréia Guerreiros do Céu e da Terra (Tian di ying xiong, 2003), dirigido por He Ping, numa honrosa tentativa do canal de dar vazão a um pouco da produção chinesa contemporânea (O Trem de Zhou Yu, outra super-produção chinesa com Tony Leung e Gong Li, estréia no canal em fevereiro). Guerreiros... é estrelado por Jiang Wen, pouco conhecido no Brasil como ator (apesar de ser seu métier principal) mas adorado por um grupo restrito que assistiu a Os Demônios Batem à Porta, dirigido e protagonizado por ele, num Festival do Rio e caiu de quatro. Finalmente, um tipo de estréia que sentimos vontade de assistir num verdadeiro espírito de descoberta... Até a semana que vem, esperando atrações melhores e mais surpreendentes...
Ruy Gardnier

 

 
Gloria Graheme e Humphrey Bogart em No Silêncio da Noite (In a Lonely Place), de Nicholas Ray, que o Cinemax Prime exibe dia 18/11

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