A ENCANTADORA DE BALEIAS
Niki Caro, Whaler Rider, Nova Zelândia, 2003

É comum o crítico ouvir dos leitores que "nem todo filme precisa ser original", ou que "nem todo filme foi feito para ser genial", como se a crítica fosse sempre baseada nestes critérios únicos, ou como se eles fossem imutáveis no tempo – ou seja, ou um filme é genial e original, ou não é. Como sabemos, ainda bem que tudo que se refere à arte é um pouco mais complexo do que isso: filmes originais podem ser péssimos, filmes que trabalham em cima de clichês podem ser ótimos. Nada disso invalida, porém, a afirmação que eventualmente alguns filmes pedem, e este é o caso com Encantadora de Baleias: não há nada aqui que justifique qualquer interesse outro que não a reencenação do que já foi encenado milhares de vezes, apenas para dar ao espectador mais do mesmo que ele já sabe que gosta. Só que de preferência, para variar o embrulho do presente, com muitos toques "étnicos", "exóticos".

Desde o princípio, Encantadora de Baleias já está engessado mortalmente: na caracterização do avô como o "chefe-teimoso-que-se-pensa-sábio-mas-aprenderá-uma-lição", ou no uso da narração em off pela menina protagonista para deixar claro que nada a impedirá, ao longo do filme, de atingir o seu destino de liderar o seu povo. Estabelecido isso, é questão de encher a hora e meia entre estes dois pontos com variações acerca do mesmo tema: vovô não entende a menina, menina vai superando preconceitos, e vice-versa, não necessariamente nesta mesma ordem. Claro, Caro conta com uma protagonista de carisma inegável, com as paisagens deslumbrantes da Nova Zelândia, com os hábitos ancestrais e fascinantes dos "maori" para dar o tal "frescor" ao filme. Mas, no fundo, de fresco não há nada aqui, e o difícil é ficar atento ao que se passa na tela.

Aí, o leitor pode perguntar: mas o que mais poderia se esperar do filme? Bom, podemos citar algumas coisas. Por exemplo, que se ampliasse a discussão sobre o isolamento do povo "maori" na atual sociedade neozelandesa – ouvimos muito se dizer que "os tempos são difíceis", mas nunca entendemos exatamente porquê, e como isso se manifesta na prática do dia a dia. Outro exemplo é o trabalho de cenas como as subaquáticas com as baleias: burocráticas, filmadas sem qualquer desejo de inseri-las mais organicamente na narrativa (parecem sempre inserts) – só um plano mais à frente possui qualquer resquício de "magia" (o movimento do alto que acompanha a menina montada na baleia prestes a afundar na água), que é o que parecem buscar. Ou ainda poderia-se pedir uma encenação mais vibrante e menos engessada nos supostos momentos de emoção, como a busca do dente de baleia no fundo do mar pelos meninos. Ou que o personagem do avô tivesse alguma outra nota de gradação entre a teimosia irracional de todo o filme e a iluminação final. Ou que, finalmente, a narração em off não fosse usada tantas vezes como muleta narrativa desnecessária e manipuladora (como a trilha sonora).

Em suma, muito poderia ser feito para tirar Encantadora de Baleias do piloto automático. "Mas o público gosta" seria o argumento final dos que refutam críticas a filmes como este. Falso argumento. Primeiro porque não é fato que só por uma maioria gostar, isso se torna verdade universal; mas principalmente porque não é por acaso que a maioria do público caia em todos os golpes do filme – com isso é que Caro conta, e sabe que funcionará. No entanto, não é por isso que precisamos fingir que estes problemas não estão lá e que o mesmo filme não podia ser ao menos minimamente interessante, para além da repetição eterna dos mesmos temas e tratamentos e golpes de venda de projeto.


Eduardo Valente