Jiang Xiao cria seu Sombras
Elétricas partindo de elementos familiares aos
espectadores. Que são acima de tudo figuras que guardam
afinidades entre si, sejam eles chineses, compatriotas
do diretor, ou brasileiros, freqüentadores de um
festival de cinema. Desde a primeira apresentação
dos protagonistas, um simpático ciclista entregador
de água, e uma garota muda e problemática, o filme
transita por terrenos previamente explorados, sem
nunca pensar em se direcionar por vias mais arriscadas.
Quando os incidentes programados pelo roteiro levam Mao Dabing, o entregador,
a visitar o apartamento-cinemateca da moça Ling Ling (presa após agredi-lo),
encontrando escritos que o levam de volta ao passado, o filme se instala definitivamente
no campo de arquétipos consagrados do melodrama: a opressão da figura feminina,
amizade entre crianças, incontáveis perdas e separações. Coroa tudo isso uma
recorrente evocação do próprio cinema, velhos filmes resguardados na memória
afetiva da audiência. E mesmo que os filmes chineses citados em Sombras Elétricas venham
a ser desconhecidos de uma platéia estrangeira como a nossa, eles não deixam
em nenhum momento de resguardar uma familiaridade, o que consagra o cinema popular,
independente de sua origem, como elemento de um inconsciente coletivo universal.
É assim que, sem ousar, sempre “jogando para a galera”, Jiang Xiao vai usando
do poder da sedução. Seu melodrama, mesmo sem um pingo de originalidade, consegue
cativar e manter um interesse. O diretor sabe bem o que faz, domina suas pretensões.
No entanto, ao se aproximar do terço final, os elementos melodramáticos passam
a transcender os limites do tolerável. Excessos tomam conta da trama e Sombras
Elétricas perde parte de seu encanto meio naif. Cabe ao espectador
discernir entre os limites de se deixar levar pela emoção rasteira, ou manter
a frieza do senso crítico. Mas, pensando bem, essas duas experiências aparentemente
diversas podem na verdade não ser nada incompatíveis. E acima de tudo essenciais
para uma fruição deste Sombras Elétricas.
Gilberto Silva Jr.
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