O
sempre atento mercado publicitário já
esta ágil na divulgação dos jogos
Pan-Americanos, que acontecerão em 2007, na cidade
do Rio de Janeiro. Já se investe pesadamente
em campanhas publicitárias e sobretudo na aproximação
com o possível participante do evento. Mas a
novidade este ano é que o espectador virou, quase
que exclusivamente, telespectador, mesmo quando os jogos
serão realizados no próprio país.
Apostando na interatividade com o interlocutor interessado
nos jogos, a campanha do Pan cria laços afetivos
desde a escolha do nome do mascote, emblema do pan –
um sol – que diretamente nos liga ao universo praiano
e ao verão carioca. No entanto, somos introduzidos
neste universo, vamos nos acostumando a ele, apenas
virtualmente. Você liga, dá seu voto, influi
na escolha de Luca, Kauê ou Cuará.
Aos poucos está sendo introjetada a posição
do (tele) espectador. O principal interesse aqui é
pensar nas campanhas que estão sendo veiculadas
na televisão há cerca de 1 mês.
Leia-se, época de Copa do Mundo. Detenhamo-nos
sobre duas campanhas específicas: as que tratam
de Vanderlei Cordeiro de Lima e Torben Grael. Na primeira,
há um adolescente estudando para a prova de Matemática.
Perdido no meio de livros, contas e números,
o jovem se levanta e vai "relaxar" diante
da televisão. Ora, é tempo dos esportes.
Na tela está o (quase) campeão Vanderlei
Cordeiro de Lima sendo impedido de trazer a medalha
olímpica para o Brasil. Havia um escocês
no seu caminho. O evento já amplamente divulgado,
não carece de maiores explicações.
Todos sabemos o que se passou. Na seqüência
seguinte, ainda assim, está Vanderlei Cordeiro
no pódio, feliz e contente, símbolo da
resistência – sou brasileiro e não desisto
nunca. O exemplo é tão perfeito e eficaz
que faz com que o fracassado garoto dos estudos matemáticos
se volte para o livro e, com todo vigor, resolva subitamente
todos problemas algébricos que martelavam sua
cabeça. Sim, a propaganda beira o constrangimento.
Mas não paramos por aí. Vejamos agora
Torben Grael, o campeão olímpico de Vela.
Uma vez mais, em frente à televisão, uma
garota brinca com seu Lego (ou brinquedo parecido) espalhado
pela sala. No entanto, seguindo o exemplo de Torben,
que "apesar de campeão, é ele mesmo
quem arruma seu próprio barco", a garota,
quando cansa de brincar, arruma ela mesma sua caixa
de brinquedos.
Esse tipo de aproveitamento educativo através
do esporte não é nada novo. Num país
em que o esporte é referência na criação
de ídolos, tal prática se faz bastante
comum. Não raro vemos personalidades esportivas
deslocadas de seu papel original e exercendo essa função
pedagógica que nem sempre diz respeito a seu
ofício. Papel não exclusivo dos esportistas,
é bem verdade. Mas pensemos que em países
com os EUA, por exemplo, o jovem é realmente
incentivado a praticar esportes. Mais do que a formação
de um campeão, a política norte-americana
visa a prática esportiva. O adolescente que se
destaca no esporte é também aquele que
poderá conseguir uma bolsa nas disputadas universidades
americanas. Entretanto, sabemos que o campeão
de futebol americano do colégio que ganha a desejada
bolsa para estudar em Harvard devido a isso, certamente
não sairá de lá como ícone
do esporte, mas sim como médico, engenheiro,
ou qualquer outra profissão que exija a formação
universitária.
Políticas públicas à parte, voltemos
ao que de fato nos interessa: a nova forma de participação
do espectador brasileiro (e sobretudo carioca) nos Jogos
Pan-Americanos. Se pensarmos nas duas citadas propagandas,
em ambas o canal de transmissão utilizado é
a televisão. Nós, telespectadores, vemos
a divulgação dos Jogos pela televisão.
E, dentro da televisão, novos telespectadores
(personagens) vêem, de fato, os acontecimentos
esportivos. Ao contrário do que se espera normalmente,
exceto pelo intermédio da televisão-personagem,
não vemos belas imagens, grandes feitos esportivos,
nem a divulgação do Rio de Janeiro, cidade
maravilhosa. Chama atenção que as duas
propagandas não se dirigem à promoção
do evento esportivo, como a princípio se acredita.
São na verdade apenas instrumentos de divulgação
da própria televisão. Não nos reconhecemos
como esportistas. Nos reconhecemos no garoto matemático
ou na garota Lego. E pra esses, a televisão parece
suprir suas necessidades e anseios, trazendo mais do
que diversão, também "conhecimento"
e "responsabilidade".
Acontece que a autopromoção da televisão
na transmissão dos Jogos é feita de modo
mascarado. A impressão que se têm é
do interesse nos jogos. Escolher o nome do mascote,
ou estar próximo de campeões esportivos
são estratégias de aproximação.
A televisão acaba por eliminar, ou ao menos reduzir,
a magia do contato direto com o esporte. Pode-se notar
uma tentativa de substituição de sensações.
Todos sabemos que o clima num campo de futebol, numa
quadra de basquete ou de vôlei, ou mesmo nas arquibancadas
de uma piscina, é bastante diferente do clima
que se constrói pela televisão. Não
que não se tenha emoção diante
da televisão, mas as sensações
são distintas e sobretudo a experiência
vivenciada é outra. E justamente neste ponto
somos enganados, pois a imagem e o ambiente que se vende
são unificados.
Assim podemos voltar a questão da veiculação
das propagandas começarem exatamente durante
a Copa do Mundo. Quando já se tem um bilhão
de pessoas em frente à televisão e existe
um clima de "parar a cidade" para assistir
um jogo de futebol (pela televisão), fica fácil
apropriar-se dessa ambientação e defender
que a televisão é grande propiciadora
de emoção. Ela consegue dar conta não
só da informação sobre os Jogos,
mas da transmissão da atmosfera do "ao vivo".
Mas se esta autopromoção existe, ela deriva
de algumas novas questões. As possibilidades
de transmissão são fundamentais na nova
forma de recepção. E a equivalência
de emoções não vem apenas de ferramentas
ideológicas, mas também de aparatos tecnológicos:
utilização de muitas câmeras, possibilidade
de escolha do que assistir devido a disponibilização
de novos canais exclusivos, interatividade com o locutor
viabilizada pela internet. O Atual se utiliza do Virtual.
Isso significa que a potencialidade das transmissões
esportivas caminha concomitantemente com a evolução
tecnológica. O que num desdobramento forçado
possibilita pensarmos de que forma o meio digital e
virtual interfere na nossa recepção e
emoção, ainda que ligados pelo ainda mais
potente canal transmissor – a televisão.
Raphael Mesquita
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