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Achados ou perdidos?
Trinta filmes brasileiros em cartaz no Rio de Janeiro e em
São Paulo no primeiro semestre de 2006. Há quanto
tempo não sonhávamos com isso, com uma oferta
de títulos que testemunhariam um panorama rico e saudável
do cinema brasileiro? No entanto, a experiência foi
bem outra, totalmente oposta, poderíamos dizer. Apesar
da grande diversidade de propostas e títulos, o que
se vivenciou foi uma grande confusão de filmes sendo
arremessados em cartaz e resistindo por poucas semanas no
circuito exibidor, sem mesmo dar a chance de um contato maior
com o público. Se o número de filmes lançado
é auspicioso, os índices de bilheteria são
desencorajantes. Excetuados os filmes da Globo Filmes (que,
a não ser Se Eu Fosse Você, também
renderam muito abaixo das expectativas), nenhum conseguiu
superar a marca de 50 mil pagantes, e apenas metade chegou
a fazer 10 mil espectadores. Mas pior que o desempenho comercial
foi o clima fratricida em que esses filmes foram lançados,
criando uma competição desproporcionada entre
títulos que tinham a mesma suposta faixa de público
e fatalmente antecipando a saída de cartaz dos lançamentos
de semanas anteriores. Mesmo aqueles que vão religiosamente
assistir a todos os filmes brasileiros que entram em cartaz
como vários aqui da própria Contracampo
ficaram inteiramente perdidos diante de tantos lançamentos
e prazos tão curtos para se atualizar com a produção.
Num ambiente como a comunidade cinematográfica brasileira,
que não cansa de arrotar a necessidade de fazer o filme
chegar ao público e a obrigação quase
cívica do cineasta para com o espectador, uma conclusão
muito nítida se faz presente ao observar esse semestre:
nunca foi tão fácil perder um filme brasileiro.
Claro, há nuances, explicações, variações
de caso a caso, fatores atenuantes o maior sendo o
pânico das distribuidoras em lançar seus filmes
num ano de Copa do Mundo e eleições nacionais
, mas o que aqui se revela é um descompasso gritante
entre a produção de filmes e a forma de distribuí-los
e exibi-los visando atingir um público mais amplo.
Um descompasso que, em momentos, parece cheirar até
como preguiça, incompetência ou pouco caso com
o sucesso ou fracasso dos filmes em questão. Imersos
nesse aparente clima de desnecessidade do cinema brasileiro
afinal, o nosso cinema quer falar para quem? ,
nós que fazemos muito caso e temos necessidade de cinema
brasileiro tentamos observar diversos lados dessa crônica
de mortes anunciadas que foi o circuito exibidor para o filme
brasileiro esse semestre. Como se configura o mercado? Qual
foi a sensação do cinéfilo ao se deparar
com tantos filmes e tão pouco tempo de vê-los?
Que possíveis pensamentos podem nascer da correlação
de um filme com outro, de vários filmes entre si, da
confluência cronológica de várias propostas
e registros de cinema? É essa sensação
ao mesmo tempo frenética, depressiva e desajeitada
de tudo-ao-mesmo-tempo-agora que se teve na trajetória
ao longo desse semestre que essa edição de Contracampo
deseja reconhecer, compreender e discutir, entrevistando gente
especializada em mercado, perguntando a diretores de cinema
com projetos muito particulares como eles vêem a noção
de mercado exibidor para seus filmes, revelando as impressões
subjetivas sobre essa maratona informal, e, claro, discutindo
e avaliando os filmes que vemos.
A edição se completa com outra faceta do viver-cinema
no Brasil: a formação dos cineastas, aqui contemplada
pela cobertura do Festival Brasileiro de Cinema Universitário.
Panorama como sempre irregular, com muito poucos arroubos
de criatividade e desejos mais vigorosos de cinema, mas ainda
assim palco para algumas descobertas que fazem a diferença.
Pois, naturalmente, o encontro com sensibilidades singulares
e intensas emoções de espectador são
aquilo que compensa e justifica nossa trajetória por
essa tortuosa estrada do cinema no Brasil.
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