O QUE SOBROU DO BBB6

Não é difícil chegar à conclusão que Boninho e cia., na sexta edição do Big Brother Brasil, apenas colheram o que plantaram em anos anteriores. As regras de existência para os que adentram a casa foram sendo moldadas de edição à edição, começando por um padrão aberto no BBB1, mas que foi conquistando gradativamente suas diversas formas mais incisivas de comportamento. A mais agressiva dessas formas esteve em erupção no BBB5, e o modo como a equipe de Boninho se aproveitou de todos os mecanismos possíveis para explicitar como os fatos deveriam ser vistos, criando na edição um clima absolutamente maniqueísta, que acabou se refletindo no BBB6 de maneira muito mais pesada que o previsto. O jogo aberto foi excluído como uma possibilidade, e o que se construía era a disputa pelo troféu da paz, num lar onde todos faziam um esforço surreal para soarem bons, compreensivos, religiosos, necessitados. Figuras que em outras edições passariam como personagens centrados, acabavam levando com mais força faixas de personagens polêmicos, pela ausência total de se ter alguém a acusar como "vilão" em potencial no BBB6. Isso costumeiramente ocorre nos primeiros dias de todas as temporadas do programa, até que as coisas estouram e os materiais para a edição surgem. Como os acontecimentos na casa não deram e não viriam a dar sinais de mudança em momento algum desta edição, a cúpula que comanda o programa tentou das mais diversas maneiras apostar em qualquer faísca que surgisse dentro da casa.

Mesmo quando fatos de interesse irrompiam, como no triângulo amoroso Saulo-Mariana-Roberta, o desespero por transformar aquilo num mote de divisão na casa só se demonstrava mais uma direção errada. Tentou-se instaurar o clima necessário através das intervenções de Pedro Bial, mais incisivas nessa edição do que nas anteriores. Foram diversas as criticas às máscaras criadas pelos personagens, à falsa religiosidade, ao mendigar exagerado das pessoas. Mas a intervenção mais pesada veio se concretizar no episódio pós-triângulo amoroso, onde, tendo os envolvidos ainda atônitos e perdidos sem saber como se comportar diante dos acontecimentos, sobre o que pegaria bem ou mal, Bial os fez engolir a "ressaca moral", em suas próprias palavras. A tática suicida fez com que o mínimo de ação que poderia ocorrer na casa durasse apenas duas semanas, com o casal que ganhou a imagem de vilão dos editores sendo expulsos da casa em seqüência, e o marasmo do Mosteiro BBB6 reinstaurado por fim. Seria uma aposta que não daria muito certo de qualquer forma, tendo em vista que as duas mulheres envolvidas no caso já perpetuavam uma amizade forte na semana seguinte, o que seria mais um sinal da completa falta de disposição para a inimizade dos participantes.

Para piorar a disposição das coisas, após um começo quente com uma prova de resistência que durou mais de 24 horas, a produção passou a optar quase que inteiramente por provas onde a sorte era o fator mais importante, o que estimulava ainda mais a que os participantes se aquietassem e não movessem um músculo em busca do prêmio. Chega a ser inacreditável que a dupla que venceu a prova de resistência não levasse qualquer prêmio além da liderança, e que três semanas depois um participante na sorte escolhesse uma chave, e pronto, carro na garagem. Atos resultam em outros atos, e aos poucos a situação foi se tornando cada vez mais cômoda, aguardando que a sorte tomasse os rumos e tudo ficasse por isso mesmo. O resultado era uma edição cada vez mais fria e pouco dinâmica, muito pouco certa do que realizar a partir do que tinham. Passaram-se muitas semanas até que finalmente caísse a ficha de que apostar num quadro para a dupla Rafael-Agustinho poderia ser uma boa idéia – e esse foi, de longe, o único acerto certeiro dos editores, mesmo que tardio. Enquanto isso, edições vazias de material custaram a cabeça de Fernanda Scalzo, antes um braço forte de Boninho, entre outras coisas idealizadora da polêmica animação "Os Inacreditáveis" do BBB5.

Coincidência ou não, após a saída de Scalzo algumas das melhores edições do programa aconteceram. Nos episódios mais longos (terça, quinta e domingo) a edição surgia mais dinâmica, com menos conversas de Bial com a casa, montagens mais secas, um surgimento leve das animações; as coisas pareciam finalmente se encontrarem. A impressão não se confirmou como um todo na última eliminação e na final, mas estas ainda mostrava um certo amadurecimento com relação à forma de tratar o material. Isto foi também confirmado por entrevistas de Pedro Bial, tanto ao chat da Globo.com quanto à Revista da TV d’O Globo, nas quais ele afirmava com veemência que faltava à maioria do elenco do BBB6 uma real vontade de participar intensamente daquilo tudo, apostando nesta exigência como a cartada ideal para uma sétima edição mais envolvente. A prova da apatia geral do elenco desta sexta edição foi que mesmo quando convocados ao palco como um "timaço" por Bial, os eliminados não foram chamados a participar da final de qualquer forma que não fosse como meros figurantes cumprindo um ritual, sem qualquer interação.

A quem realmente manifesta uma curiosidade por reality shows ainda houve o que algumas razões para interesse no BBB6, mesmo que esse fosse visto como um caso de estudo. Ao menos esse interesse surgiria meramente em observar uma edição que ousasse queimar sem medo uma participante na mesma noite em que viria a congratulá-la campeã do programa, como se numa autocondenação, já que ao começo do programa provavelmente a equipe responsável já estaria ciente do que vinha pela frente. Na falta de figuras carismáticas, o voto acabou decidido pelo fator carência financeira, mesmo que a vencedora não fosse uma flor de pessoa. Com uma singular exceção: houve pouquíssimos participantes tão carismáticos quanto Rafael em toda a existência do BBB. Apesar disso, no fim das contas o troféu da paz do BBB6 terminou nas mãos da que provavelmente foi a participante menos pacifica da edição. Seria um sinal.


Guilherme Martins