O
filão dos filmes sobre o primeiro amor já
havia sido bem explorado por Quando Brota o Amor,
filme inglês de 1971 dirigido por Waris Hussein.
A música dos Bee Gees ajudava, e o clima pós
"Swinging London" da época dava contornos
muito agradáveis às tempestades sentimentais
dos pré-adolescentes apaixonados. ABC do Amor,
além da óbvia comparação
com a série televisiva Anos Incríveis,
traça um interessante paralelo com o filme de
Hussein, principalmente por traduzir perfeitamente o
clima de sua época.
Se Quando Brota o Amor nos trazia o clima romântico
pós-psicodélico londrino, com a rigidez
do sistema escolar sendo constantemente sabotado pelas
almas rebeldes que choravam a separação
dos Beatles, ABC do Amor também nos traz
muito de sua época, seja na edição
esperta com efeitos de video-clipes, seja na câmera
solta que percorre apaixonada as ruas de Manhattan.
Mais do que um Woody Allen juvenil, o filme de Levin
nos toca naquela região saudosista que sempre
acarreta desejos de testar alguma máquina do
tempo, como se voltássemos com a experiência
de agora para as situações que vivemos
no passado. Capta-se muito bem a passagem do estágio
de ódio às garotas para o estágio
de contaminação por paixonite aguda, aquela
que provoca dores e muda rotinas e certezas. Levin dá
conta disso, fazendo com que o moleque interpretado
por Josh Hutcherson dialogasse com sua própria
consciência, ora personificada por um mestre das
artes marciais. O que permitiu diversas comparações
com o cinema do diretor de Ponto Final.
Mas seria essa uma comparação tão
fácil de se estabelecer? Como transportar a angústia
do mais famoso cineasta novaiorquino para a mente de
um pré-adolescente? Ou, melhor comparando, como
imaginar o velho Allen tendo crises de insegurança
tendo seu amor-próprio dilacerado pelo descaso
e pelo choro? Não, definitivamente um passa na
tangente do outro. Allen nunca se ridicularizaria sem
que sua integridade fosse preservada. Gabe, o moleque,
se presta ao ridículo, está mais para
um Jerry Lewis mirim, mas não tão radical.
Se ABC do Amor revela-se limitado, é porque
propõe uma conclusão que o leva para o
perigoso terreno do conservadorismo. Por um lado o menino
que não pode se envolver amorosamente porque
não tem idade ou maturidade para isso. Ele quer
o namoro, mas a garota o coloca em seu devido lugar,
delicadamente, como convém a uma produção
do tipo. Dar tempo ao tempo é o que o filme reserva
aos protagonistas, no que se afasta completamente de
Quando Brota o Amor, filme bem mais livre e corajoso
nesse sentido. Mas existe um lado ainda mais delicado.
É o que envolve o final conciliador. Um final
que mima o público, porque já que Gabe
não pode ter tudo o que quer, pelo menos seus
pais poderão lhe dar um chão, uma base
emotiva para ele se sustentar. Assim é mais fácil
passar pelo drama da primeira rejeição
amorosa.
Sérgio Alpendre
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