ABC DO AMOR
Mark Levin, Little Manhattan, EUA, 2005

O filão dos filmes sobre o primeiro amor já havia sido bem explorado por Quando Brota o Amor, filme inglês de 1971 dirigido por Waris Hussein. A música dos Bee Gees ajudava, e o clima pós "Swinging London" da época dava contornos muito agradáveis às tempestades sentimentais dos pré-adolescentes apaixonados. ABC do Amor, além da óbvia comparação com a série televisiva Anos Incríveis, traça um interessante paralelo com o filme de Hussein, principalmente por traduzir perfeitamente o clima de sua época.

Se Quando Brota o Amor nos trazia o clima romântico pós-psicodélico londrino, com a rigidez do sistema escolar sendo constantemente sabotado pelas almas rebeldes que choravam a separação dos Beatles, ABC do Amor também nos traz muito de sua época, seja na edição esperta com efeitos de video-clipes, seja na câmera solta que percorre apaixonada as ruas de Manhattan. Mais do que um Woody Allen juvenil, o filme de Levin nos toca naquela região saudosista que sempre acarreta desejos de testar alguma máquina do tempo, como se voltássemos com a experiência de agora para as situações que vivemos no passado. Capta-se muito bem a passagem do estágio de ódio às garotas para o estágio de contaminação por paixonite aguda, aquela que provoca dores e muda rotinas e certezas. Levin dá conta disso, fazendo com que o moleque interpretado por Josh Hutcherson dialogasse com sua própria consciência, ora personificada por um mestre das artes marciais. O que permitiu diversas comparações com o cinema do diretor de Ponto Final.

Mas seria essa uma comparação tão fácil de se estabelecer? Como transportar a angústia do mais famoso cineasta novaiorquino para a mente de um pré-adolescente? Ou, melhor comparando, como imaginar o velho Allen tendo crises de insegurança tendo seu amor-próprio dilacerado pelo descaso e pelo choro? Não, definitivamente um passa na tangente do outro. Allen nunca se ridicularizaria sem que sua integridade fosse preservada. Gabe, o moleque, se presta ao ridículo, está mais para um Jerry Lewis mirim, mas não tão radical.

Se ABC do Amor revela-se limitado, é porque propõe uma conclusão que o leva para o perigoso terreno do conservadorismo. Por um lado o menino que não pode se envolver amorosamente porque não tem idade ou maturidade para isso. Ele quer o namoro, mas a garota o coloca em seu devido lugar, delicadamente, como convém a uma produção do tipo. Dar tempo ao tempo é o que o filme reserva aos protagonistas, no que se afasta completamente de Quando Brota o Amor, filme bem mais livre e corajoso nesse sentido. Mas existe um lado ainda mais delicado. É o que envolve o final conciliador. Um final que mima o público, porque já que Gabe não pode ter tudo o que quer, pelo menos seus pais poderão lhe dar um chão, uma base emotiva para ele se sustentar. Assim é mais fácil passar pelo drama da primeira rejeição amorosa.


Sérgio Alpendre