Uma coisa não se pode negar
ao diretor alemão Roland Suso Richter (de O
Túnel): sua capacidade de enredar o espectador na
teia de acontecimentos bizarros do filme é notável.
A despeito de várias brincadeiras inúteis, também conhecidas
como firulas (cortes no mesmo eixo, lentes que distorcem
a imagem, zooms alucinantes...), colocadas apenas para
denotar um estilo, a trama flui bem, pelo menos enquanto
permanece no território cômodo do estranhamento. O problema
é quando chega a hora de explicar o que está acontecendo.
O que vem é tão decepcionante quanto indeciso. O que
acontece não pode ser dito aqui, sob o risco de estragar
por completo o prazer de quem quiser conferir o filme.
Basta dizer que ele se insere, pelo menos no início,
no rol de obras recentes sobre perda de memória.
Richter explica, mas deixa um final em aberto, seguindo
uma concessão à ordem atual de confundir o espectador.
Mas nem a conclusão nem a negação da própria conclusão
soam satisfatórias. Primeiro porque Richter descuida
de um fator fundamental nesse tipo de truque: existe
a confusão mental do protagonista, existe a explicação
para o que acontece com ele, mas não existe conexão
plausível entre uma e outra. Ou melhor, até existe em
termos meio frouxos, mas é tão pobre e boba dramaturgicamente,
que passamos a rever o filme em retrospecto para ver
como tudo se encaixa. E nesse retrospecto o filme cai
muito, pois todo o trabalho sensitivo se esvai, restando
apenas a historinha de espectros arrependidos.
Não se trata aqui de invocar verossimilhança, essa palavra
que muitos têm, equivocadamente, como obrigatória em
cinema. Também não é o caso de querer que as peças do
quebra-cabeça se juntem revelando uma bela paisagem.
Se olharmos de perto, depois de detectada a conexão
forçada, vemos que essas imagens se casam perfeitamente.
O que inicialmente parecia complicado, revela-se fácil
e óbvio conforme pensamos nos acontecimentos relatados.
Talvez esse seja o problema. Uma linha traçada com tanta
simplicidade encontra um diretor que em certo ponto
abandona o trato com a atmosfera de estranhamento para
adentrar no universo esperto dos truqueiros de plantão.
E dentro desse universo, ele não tem nada a acrescentar.
A não ser uma ousada (e um tanto deslocada, por vir
num momento explicativo em excesso) citação ao expressionismo
alemão nos momentos finais do filme.
Resumindo: conforme percebemos o que vai acontecendo,
toda a linha narrativa começa a se tornar clara. Quando
uma coisa dessas acontece depois de 40 minutos de filme,
o desinteresse é inevitável. Acompanhamos os restantes
50 minutos com um crescendo de significados que resultam
no fim do clima criado com tanta desenvoltura. O que
só não é uma tortura porque o elenco está surpreendentemente
bem, com destaque para Sarah Polley e Stephen Rea, o
ator perfeito para deixar todos sem saber onde pisar.
Sérgio Alpendre
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