UM MUNDO MENOS PIOR
Alejandro Agresti, Un mundo menos peor, Argentina, 2004

Nos primeiros 15 minutos de seu novo filme, Alejandro Agresti já apresenta todas as suas armas, e comprem-nas quem quiser: num clássico enredo melodramático, temos a filha que nunca conheceu o pai, a cidade onde todos que lá habitam guardam um segredo, a mãe se recuperando de uma doença fatal, criancinhas amadurecidas... Está tudo posto. A partir deste começo, não restam dúvidas: quem quiser reclamar que é mais um dramalhão nem precisa mais continuar na sala. Os que lá continuam precisam saber apreciar os momentos de um melodrama autêntico.

Porque, não restem dúvidas: estes momentos há de sobra. Agresti dá um segundo passo na direção inequívoca do cinema popular, após Valentin (cujo garoto protagonista diz presente no elenco deste novo filme), e o faz sem qualquer trava. Esta sua entrega é parte do interesse que Um Mundo Menos Pior inegavelmente tem. Porque Agresti possui mais do que conhecido talento como encenador, diretor de atores e construtor de personagens, especialmente feliz naqueles com inclinação cômica (como é o caso, invariavelmente, da maioria deles). Durante uma hora no centro narrativo deste filme, ele parece aqui ter destrinchado completamente o genoma do melodrama clássico, conseguindo manter em iguais doses o comentário social, as reviravoltas de enredo e o interesse humano. A cena que marca o ápice do seu sucesso é a desancada da jovem sem pai contra a velha dona da casa que ela e a família alugam, uma autêntica catarse da Argentina dos ex-militantes anti-ditadura contra um determinado status quo hipócrita e conservador. Seguida da cena onde a mãe vai de encontro ao pai num boliche-bingo, onde canta um autêntico cantor de churrascaria argentino, temos ali a combinação quase letal da emoção desbragada com a elegância da realização.

Infelizmente, porém, dali para diante Agresti perde bastante o rumo da narrativa. Todo o entrecho final parece forçado, as cenas viram grandes discursos, ao invés de orgânicos diálogos (a sequência que marca mais fortemente esta virada é a da conversa no hotel com o casal de lésbicas, sem dúvida), e ele revela que abriu mais portas do que dava conta de fechar. É ali que a música orquestral, anteriormente já incômoda, revela-se realmente pouco inspirada, e que os atores começam a desandar também. É uma pena, porque o filme, que num determinado momento atinge uma quase perfeição no trabalho do gênero melodramático, fecha numa chave francamente negativa – inclusive com um plano final só menos óbvio do que abrupto. Após este, fica realmente a sensação de uma obra terminada às pressas, para cumprir um orçamento ou um prazo – o que é um desperdício das suas bases sólidas num acabamento mal cuidado. Um Mundo Menos Pior merecia deixar melhor impressão.

Eduardo Valente