Desde o começo de Lemming
sabemos do que Dominik Moll quer tratar: o mal-estar
de um bem estabelecido casal jovem e burguês na França
de hoje. Não se pode dizer que seja tema exatamente
novo, mas também não se pode descartá-lo de saída, ainda
mais quando entra em cena uma Charlotte Rampling deslumbrante,
que rouba cada uma das cenas que tem no filme. Neste
começo, Lemming até interessa, enquanto mistura
um estranho humor à sua constante malaise. É
inegável que, especialmente depois da sequência-choque
com Rampling, queremos saber onde Moll quer chegar.
Pena que quando descobrimos, não é lá muito longe...
Na verdade, Moll parece querer radicalizar com Lemming
a opção de exercitar-se no "filme comercial de
autor". Ou seja: um filme que atenda a uma série
de pressupostos de identificação do público (clareza
narrativa, astros do cinema, jogo com os gêneros), mas
ao mesmo tempo queira sempre ter um "quê a mais".
Pois é justamente no quê a mais que Moll se embanana
o tempo todo, e nos deixa sempre pensando como ele podia
ser melhor se simplesmente se contentasse em fazer um
filme de gênero. Lemming expele referências e
influências de cada fotograma: uma pitada de De Palma
aqui, um punhado de Polanski acolá. De fato a melhor
maneira de descrever sua narrativa seria numa maneira
quase tão ridiculamente clichê quanto aqueles falsos
pitches de roteiro que Altman mostrava em O
Jogador: trata-se de uma refilmagem da primeira
parte de Lost Highway, misturada com o Sitcom
de François Ozon, sendo isso tudo escrito por Edward
Albee e filmado pelo Stanley Kubrick - de De Olhos
Bem Fechados (e aliás, uma das poucas boas coisas
do filme é o uso da figura de Laurent Lucas bem parecido
com o Tom Cruise do filme de Kubrick). E é especialmente
doloroso ver isso na tela, porque Moll transfigura diferentes
idéias e obsessões de cada um destes cineastas, sem
nunca tornar nenhuma delas suas de fato – filma a quilômetros
de distância do seu objeto.
De fato, é muito sintomático que o nome do filme se
refira a um roedor parecido com um hamster, porque
Moll filma seus personagens como cobaias de algum estranho
experimento cinematográfico. Experimento que falha tanto
mais pela obsessão que toma o cineasta e faz com que
ele queira que cada plano seja "brilhante",
cheio de sacadas de luz e som - só que ele não se dá
conta que as "sacadas" são as mais óbvias
possíveis (um personagem que vai penetrando na escuridão
de seu caráter caminha por uma estrada até sumir na
escuridão de um túnel – uau!). O filme logo se torna
um amontoado interminável, porque claramente Moll acredita
que teve tantas boas idéias vendo filmes dos cineastas
citados, que quer usar todas num mesmo filme, se possível
– o que não é possível, claro. Ainda mais para um filme
que deseja apenas chegar num final que obviamente estava
desenhado desde os seus primeiros planos.
Eduardo Valente
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