FINAIS FELIZES
Don Roos, Happy endings, EUA, 2005

Ainda um cineasta que tenta se estabelecer, Don Roos busca em Finais Felizes algo próximo de um equilíbrio para sua obra, algo entre o independente “espertinho” de O Oposto do Sexo e o romance cômico mais tradicional de Mais que o Acaso. Pega para si uma estrutura bastante usada entre os independentes, a de ilustrar um cotidiano de um grupo específico de personagens paralelamente, e nisso não surpreende o quanto o filme tenda a lembrar Robert Altman, em especial no tom que dedica a seus personagens, esbarrando no cinismo, mas também na forma de supostamente estar realizando um retrato social da América. Até este ponto, não há nada que, mesmo em alguma instância menor, não se possa perceber também em O Oposto do Sexo, mas embora filmes complementares – seus problemas em especial são bastante similares – há uma evolução bastante forte quando se sai de um ramo de estrutura e texto e se adentra os campos da composição de cena.

Se não há nada de impressionante ou inovador no trabalho de encenação de Roos aqui (na verdade ele se arrisca muito mais em sua empreitada mais comercial com Mais que o Acaso aonde conflitava seus cacoetes com um enredo mais quadrado), mas impressiona o domínio com o qual ele coloca as coisas em cena, a noção exata que parece ter sobre todo o absurdo daquilo que encena. Mesmo nas inserções um tanto insuportáveis de letreiros que dialogam com o público, uma verdadeira negação de suas próprias capacidades enquanto encenador, existe um domínio, uma capacidade de encontrar os espaços exatos do que quer mostrar. Difícil considerar por completo desprezível então uma obra com tais qualidades, mas então retorna o mal que assola tantos cineastas com algum talento: o que filmar?

A trama principal gira em torno de dois irmãos de criação que, na adolescência, tiveram um filho, ainda que só a irmã saiba não ter sido ele abortado. Ela vive atualmente na eminência de um possível reencontro com o filho “perdido”, a partir de um documentarista que quer filmar seu encontro com ele, e o irmão vive entre seu namorado e duas amigas, tentando convencer a todos de alguma forma que o filho delas possa ter sido gerado a partir do esperma de seu namorado; há ainda paralelamente pai e filho dividindo uma mulher interesseira, e a angústia do segundo em revelar ao pai sua homossexualidade. Os temas se entrecruzam: família, sexualidade, paternidade – há sim momentos em que estes temas ganham tratamento que saia de uma certa redundância, mas a insistência de Roos em preencher cada cena com uma tirada infame envolvendo algum personagem arruína qualquer capacidade de se levar muito adiante as idéias do filme. Aposta demais nos atores, estando estes bastante irregulares, muitas vezes oscilando por demais em tons que vão da calmaria ao over em pouquíssimo tempo, com uma inconstância que nem sempre soa intencional – embora muitas vezes case com o estilo cínico que Roos impõe ao filme.

Roos filma em scope, encontrando saídas para o formato em certos momentos, mas soando em tantos outros como quem deseja usá-lo apenas para dar um senso maior de ambições ao filme, sem nenhum interesse visual vital maior. Todavia, Roos passa longe de não ter habilidade com o quadro, apenas insiste demais em textualizar as imagens, faltando um tanto de crença no ato de filmar, como se a imagem e o som não bastassem para seu cinema. Entre todos os tropeços, incapacidades e buracos que assombram Finais Felizes, existe algum tipo de talento reprimido, e inclusive o paralelo entre Roos e o documentarista interpretado por Jesse Bradford, embora forçado, é bastante possível – e o fato de o filme nutrir um certo carinho por ele, mesmo o mostrando como um louco interesseiro, depõe a favor desta impressão.

Guilherme Martins