Após
um longa impessoal dedicado basicamente a seu ator,
não surpreende que Tom Cruise devolva o favor
a Cameron Crowe produzindo o trabalho seguinte a Vanilla
Sky (além da camaradagem que não é
de hoje entre a dupla, parceiros pela primeira vez em
1996). A questão é mesmo como se erguer
um trabalho, ou que rumo seguir, após realizar
um trabalho como aquele. A saída de Crowe talvez
tenha sido a mais fácil, a de recuar e fazer
um filme pequeno sem grandes aspirações
(vale lembrar também que o antecessor de Vanilla
Sky foi Quase Famosos, seu projeto mais pessoal,
logo mais passional), o que significa pouco já
que a partir deste princípio o resultado poderia
tomar muitos rumos, do melhor ao pior. Talvez o mais
difícil de observar em Elizabethtown seja
justamente que o filme não escolhe um deste rumos,
mas abraça todas estas possibilidades, alternando
entre o preguiçoso e o elaborado, belos momentos
de encenação com momentos horripilantes,
dando forma uma projeto um tanto turvo.
Salta aos olhos a opção do absurdo, algo
que caminha em todos os sentidos pelo filme. Assim,
se força além da conta o sentimento de
perdedor do personagem de Orlando Bloom, que causa um
desastre bilionário em uma empresa de calçados
completamente surreal. Surreal tal qual os tipos dos
moradores de Elizabethtown, das ações
e do discurso de sua mãe, da fofice de Kirsten
Dunst, a conversa pelo celular que dura infinitas horas...
Isso pode gerar mesmo algumas cenas e tiques bastante
irritantes, mas a opção por fugir por
completo da realidade traz também momentos de
força ao filme, em especial algumas cenas do
casal central – é um fato que Dunst é
quem faz com que Elizabethtown tenha vida, mesmo
que Bloom seja quem o carregue, com um talento bastante
oposto à fama que o persegue – onde mesmo quando
tudo parece correr por demais, Crowe encontra um tom.
A jornada vai ganhando contornos interessantes à
medida que Bloom é solto nesse novo lugar-título,
onde vai conhecendo uma porção de personagens
excêntricos que faziam parte da vida de seu falecido
pai. Justamente quando se afasta – quase se esquecendo
por completo – do constrangedor começo, em que
à parte um ou dois planos bons, é uma
coleção de equívocos, Crowe parece
permitir que seu filme comece aos poucos a respirar,
sair dessa bolha, encontrar um caminho que não
aquele inicial. Criando o habitual clima crowiano através
da escolha das canções – mais um objetivo
que um artifício desta vez, outro sinal da preguiça
que parece habitar em parte seu trabalho neste filme
–, ele vai encontrando aos poucos os momentos prazerosos
ao filme, mesmo que tente se auto-sabotar, como quando
emenda os rápidos flashbacks da infância
e de momentos com o pai e o enorme discurso de Susan
Sarandon, que por mais que soe em muitos momentos absolutamente
errado, é sem dúvida um passo corajoso
dado o fato que cria uma ruptura total no filme.
Disposto a fechar o filme com o momento em que Bloom
se resolveria tanto com o fiasco de seu trabalho quanto
com a ausência de relação com o
pai – e do romance com Dunst de quebra – em uma viagem
pela estrada seguindo o planejamento dela, a viagem
que há anos ele e o pai programavam e não
realizavam. O clímax é quase um pot-pourri
de como o filme funciona como um todo, uma constante
irregularidade que alterna erros e acertos um sobre
o outro. No entanto, talvez como um todo, o filme soe
melhor do que o fim isoladamente, com um clima sempre
aprazível mas imagens nem sempre tão boas,
idéias que não poderiam dar certo mas
que de algumas forma descem bem. É tudo muito
estranho.
Guilherme Martins
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