A IDADE DA TERRA: ROTEIRO
(seqüências 9, 48 e 49)

SEQÜÊNCIA 9

Quarto de Brahms, ele está se recuperando, camisa aberta, ainda vomita, Madalena se despe, se perfuma, se mete na cama ao lado dele, lhe faz mensagens, lhe dá remédios...

Madalena: Você está no fim...

Brahms: Não diga isto...

Madalena: Velho, feio, doente...

Brahms: Douglas, Viacharelli, Brooks, todos pensam em dar o golpe... não confio em ninguém...

Madalena: Brooks não lhe trairá jamais...

Brahms: Os fanáticos traem com a mesma paixão... Eu não queria ir ao Senado amanhã... sinto estranhas vibrações... Sou um homem bom... Sou um industrial, meu pai era um filósofo, meus ancestrais foram Imperadores, nas minhas veias corre o sangue de uma raça superior...

Madalena: Jogue uma bomba atômica no meu coração...

Brahms: Não, não, jogue a bomba no meu câncer. Ah! Ui! Ai!

Brahms sente dores...

Madalena o despe... o beija... o arranha de leve...

Madalena: Em Ogulaganda ninguém morre de câncer depois que apareceu um Profeta nas Montanhas do Norte... Dizem que faz milagres, multiplica os pães, anda em cima das águas, ressuscita mortos e cura qualquer doença....

Brahms: Cristo não! Cristo não! Eu sou diabo, eu tenho medo de Cristo...

Madalena: Mas quem falou em Cristo?

Brahms: Não, não fale neste nome.

Brahms tapa a boca de Madalena. Silêncio. Espreita. Tempo

Brahms: Sonhei com a estátua de Vênus coberta de sangue...

Madalena beija Brahms. Ele se acalma

Brahms: Tive vinte e três mulheres, tenho oitenta filhos e todas me detestam... as mulheres...

Madalena: São seres inferiores?

Brahms: Seres misteriosos... quem é você?

Madalena: A Rainha da Terra, a mãe do Universo...

Brahms: Você não me ama... você quer salvar Ogulaganda... estou triste, cansado... conquistei metade do mundo e sou tão infeliz como antes...

Madalena: Você é Deus?

Brahms: Verdade?

Madalena: E a prova de sua força...

Brahms: Douglas, Viacharelli, Brooks, muitos políticos e jornalistas pensam que eu quero fechar o Senado e me coroar Imperador... Mas eu já sou o Imperador... Na verdade eu quero libertar os homens de qualquer forma de escravidão... Se eu der o poder ao povo, Douglas, Viacharelli e Brooks serão liquidados. Por isto conspiram... Meu serviço secreto... tenho sede... que tragédya ser condenado pelos amigos... mas não existem amizades... amor, talvez?

Madalena: Ninguém matará Deus...

Brahms: Se o Senado aprovar meus projetos farei a primeira revolução mundial. Conasegui o apoio de Pomenarov e Farawaya, dois idiotas fascinados pelo Ocidente...

Margarida: Durma, descanse, diga e faça o que quiser, estarei com você em qualquer situação.

Madalena beija Brahms

Brahms: Eles pensam que eu quero o poder para mim... não gosto de meus filhos... meu herdeiro será o povo... o filho do povo...

Madalena: Nosso filho... meu amor.

Madalena beija Brahms.



SEQÜÊNCIA 48 – COVA DAS SERPENTES

Dentro da cova das serpentes, entre aranhas e teias eletrônicas: MADALENA e FELIPE fundem seus corpos e o campo abstrato explode em sons polifônicos, transcendentais... um tempo... de quando o cinema é sonho – ou realidade.

Elizabeth na porta da guerra. Justifica-se na cama e mata os dois.


SEQÜÊNCIA 49 – REINO DIVINO

Cosmos. No centro das Galáxias do Ciclo do Sol – Deus – O Grande Olho Dourado Azul – recebe CARLOS, solitário poderoso da América. Infinita solidão de espelhos tristes – o puro poder morto de CARLOS através do labirinto e os espelhos vídeos lhe transmitem as notícias de Ogulaganda e Eldorado. E nas Américas os ratos atacam por baixo e os pássaros bombardeiam. Guerra dos animais, da natureza, do Diabo. CARLOS penetra no Reino Divino, o Deus Solitário, o centro atômico, onde, louco, aciona o botão atômico e a terra parece se desintegrar mas dos gritos Negros – de um Zumbi ressuscitando num abismo infinito... as energias musculares e sonoras que se unem a outros cantos e movimentos de CRISTO e RASSAM, do povo e da natureza e de todos os ressuscitados dos terremotos que enfrentam a bomba da Morte, e a graça a destrói, e a bomba implode nos pulmões de CARLOS: vemos o pulmão, o câncer, a bomba implodida e a invasão dos cancerinosos pelas linfas condenam CARLOS a morrer em alguns dias: do olho ele entra no salão da Catedral, onde POMENAROV e FARAWAYA confabulam com o Papa pela devida coroação de CARLOS: eles são os demônios e a Katedral é a Capital do Inferno na poluição. Em volta, poluído, faminto, doente, o povo morre... E lá, na pseudo-glória, o derradeiro ritual...

No ritual do lento massacre vazio, das mortes que se sucedem, de CRISTO que entra com suas 12 tribus em Ogulaganda...

De Cristo que entra com suas 12 tribus em Eldorado...


Glauber Rocha

 

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