Este sexto longa-metragem dirigido por Blake Edwards
foi aquele que firmou definitivamente o seu nome como
um cineasta de boa mão para a comédia.
Após batalhar por mais de uma década fazendo
um pouco de tudo – até mesmo pontas como ator
– em Hollywood, Edwards estreara na direção
em Bring Your Smile Along (1955), ao qual se
seguiu He Laughted Last (1956), ambos veículos
para o ator-cantor Frankie Lane. No ano seguinte, Edwards
iniciaria com Hienas do Pano Verde (Mister
Cory, 1957) uma parceria com o produtor Robert Arthur
e o ator Tony Curtis, que seguiria com De Folga Para
Amar (The Perfect Furlough, 1958) e Anáguas
a Bordo. Paralelamente, desenvolveu projetos para
TV, sendo que o mais importante entre eles o seriado
de ação Peter Gunn, que, por sinal,
chamaria mais atenção que os filmes do
mesmo período.
Assim como a carreira de Edwards, que vai se firmando
gradativamente, Anáguas a Bordo demora
um pouco a se estabelecer como um filme cômico.
Seu início, com a chegada de Sherman (Cary Grant),
um oficial graduado da marinha, ao submarino "Sea
Tiger", que comandara durante a 2ª Guerra
Mundial, prestes a ser retirado de circulação,
seguido de um flashback que retrata um bombardeio
ao porto de Manila, logo após o ataque japonês
a Pearl Harbor, sugere estarmos diante de uma aventura
de guerra. O humor vem a surgir com a necessidade de
se reparar as avarias à embarcação
em tempo récorde e com a chegada de um novo membro
da tripulação, o tenente Holden (Tony
Curtis), um almofadinha sem nenhum treinamento para
combate. Mas Holden mostra-se bastante útil,
usando seu infinito estoque de esperteza e malandragem
para reequipar o "Sea Tiger" promovendo sucessivos
roubos a outras instalações militares,
em seqüências de impagável comicidade.
É necessario destacar que a personagem do tenente
Holden marca uma evolução de personagens
de perfil similar que Curtis personificara em seus trabalhos
anteriores com Edwards. O Mr. Cory de Hienas do Pano
Verde, um drama de resultado apenas mediano, é
um alpinista social e jogador não muito ético,
que também partilha com Holden a criação
em um bairro pobre e violento. Já o protagonista
de De Folga Para Amar, uma comédia eficiente
mas de rítmo irregular, é um cabo do exército
sem muito respeito às instituições
militares, além de mulherengo compulsivo. Holden
é tudo isso e um pouco mais. Ao que tudo leva
a crer, Curtis e Edwards foram aos poucos burilando
facetas de uma mesma personalidade até atingirem
uma síntese definitiva, em um filme igualmente
mais coeso e consistente.
E apesar de todo esse rico trabalho de composição
de personagem, Holden é, em Anáguas
a Bordo, sempre a segunda figura em cena. Paira
sobre todos o gênio supremo que foi sempre Cary
Grant, fazendo o comandante Sherman lutar com sua costumeira
classe para preservar, sem deixar cair a peteca, o comando
de seu submarino frente ao caos que se instala com a
chegada da guerra, a precariedade de suas máquinas,
as malandragens de Holden e, finalmente, a necessidade
de transportar um grupo de seis mulheres, também
militares, o que dá origem ao título do
filme.
O roteiro, que conta entre seus autores com Maurice
Richlin e Stanley Shapiro, experientes em comédia
e também responsáveis pelo genial texto
de Confidências à Meia Noite, é
pródigo em criar situações engraçadíssimas,
que se aproveitam da inequívoca tensão
sexual oriunda da presença de mulheres em um
ambiente espacialmente limitado e eminentemente masculino.
Consegue preservar a riqueza cômica de forma equilibrada
ao longo das duas horas de projeção e
mesmo no clímax no qual o "Sea Tiger"
é alvejado por um submarino igualmente da tropa
americana, onde poderia sobrepujar uma tensão
dramática.
No entanto, o mais interessante em Anáguas
a Bordo é mesmo observar a evolução
do domínio das técnicas de direção
cinematográfica por parte de Edwards. Nas duas
já citadas parcerias anteriores com o produtor
Arthur, Edwards iniciou seu trabalho com o cinemascope,
formato de tela larga para o qual, posteriormente, viria
a exercer um domínio de técnica quase
inigualável. Em Hienas do Pano Verde e
De Folga Para Amar o cineasta demonstra um certo
deslumbramento com o formato, sobre o qual ainda não
exercia um domínio completo, e exagera no uso
de planos longos e distanciados, em especial no primeiro
título, o que acaba sendo responsável
por uma certa frieza no resultado final.
Em Anáguas a Bordo, opta inteligentemente
pelo formato de tela usual na época (1:1,85),
mais adequado a retratar as dimensões exíguas
de um submarino. Os resultados são mais que eficazes,
por vezes impressionantes, em especial nas seqüências
que retratam a instalação das mulheres
na rotina do submarino, com todos transitando por portas
e corredores estreitos, o que dá motivo para
sucessivos e inadvertidos esbarrões e toques
de corpo indesejados e até certo ponto constrangedores.
Marcas da formação de um talento indiscutível,
que faz aqui o primeiro momento inesquecível
daquela que viria a ser, ao longo dos próximos
30 anos, uma longa série de comédias de
inegável qualidade, mesmo em seus momentos menos
inspirados.
Gilberto Silva Jr.
(VHS: Paris Video, selo Republic)
Obs.: Anáguas a Bordo foi o título
de lançamento em cinemas e exibição
na TV. Lançado em VHS como Operação
Petticoat.
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