CONSTANTINE
Francis Lawrence, Constantine, EUA, 2005

Constantine retoma Keanu Reeves no papel do escolhido – Neo, o one da matriz -, com a mesma pose cool, a mesma roupa preta e o mesmo trabalho de intermediário entre este e outros mundos. No filme de estréia de Francis Lawrence – um egresso dos videoclipes – John Constantine – originalmente personagem inglês e louro dos quadrinhos Hellblazer, da DC/Vertigo - é um fumante deprimido, misto de exorcista com paranormal, que mora em cima de um boliche abandonado em Los Angeles, estoca água benta em casa e tem como superpoder o conhecimento sobre a verdadeira natureza da realidade.

No filme, Deus e o Diabo fizeram uma aposta sobre as almas humanas: ganha quem arrebatar mais gente pro seu reino, seja o inferno (uma L.A. após a bomba) ou o paraíso dourado. A única regra é a não-interferência direta. Agentes de cada lado, anjos e demônios, são encarregados de espalhar a influência divina (ou demoníaca) para conquistar almas. E, como não poderia deixar de ser, os vilões não conseguem, a princípio, manter o acordo.

É o filho do diabo em pessoa quem resolve quebrar as regras e instaurar seu reinado de terror aqui mesmo, no mundo entre céu e inferno. Para tanto, precisa de ajuda divina, que encontra nas manchas de sangue da lança do destino, a mesma que atravessou o flanco direito do Cristo na cruz. A lança é encontrada, apropriadamente, no norte do México, logo abaixo da Califórnia de Constantine. A muamba sagrada é então atravessada por um passador cucaracha, e chega às mãos das pessoas erradas. Cabe a ninguém menos que Constantine - já que Deus ou é imóvel ou está preocupado com outros assuntos - resolver o problema todo.

O que se vê é uma enxurrada de clichês mal realizados e amarrados por uma estética neo-heavy-metal, muita luz azul e atitude de nonchalance dos personagens – é quase o pacote completo de Matrix (Idem, 1999), obra da qual Constantine obviamente derivou, pegando emprestado até mesmo o protagonista.

A cena final de Constantine  – não a alardeada final depois de todos os créditos, uma nulidade absoluta, mas a que aparece antes deles – é bem um exemplo do tom do filme: tendo passado todo o tempo sofrendo por conta de um câncer adquirido por causa do uso indiscriminado do tabaco, John, depois de mil peripécias, é curado pelo diabo; a última cena então o mostra de costas, fazendo o gesto, repetido mais de uma dezena de vezes durante o filme, de acender um cigarro. Conforme a câmera vai girando para sua frente, porém, sua voz em off nos avisa de que agora ele crê que Deus tenha de fato um plano para cada habitante do mundo, e é aí que somos confrontados com o que ele realmente tinha em mãos: chicletes. O filme de Lawrence, ao contrário de Hellblazer, - em que o herói, por ter sido curado do câncer em uma aventura não muito semelhante, se regozija em saber que poderá continuar fumando, isto é, reprisa o seu comportamento de sempre - é um aprendizado de vida e de fé para John Constantine, que compreende que só através de renúncia e abnegação pode continuar cumprindo a missão que lhe foi destinada: expulsar demônios das pessoas.

Juliana Fausto