Constantine
retoma Keanu Reeves no papel do escolhido – Neo,
o one da matriz -, com a mesma pose cool, a mesma roupa preta e o mesmo trabalho
de intermediário entre este e outros mundos. No filme
de estréia de Francis Lawrence – um egresso dos videoclipes
– John Constantine – originalmente personagem inglês
e louro dos quadrinhos Hellblazer, da DC/Vertigo - é
um fumante deprimido, misto de exorcista com paranormal,
que mora em cima de um boliche abandonado em Los Angeles,
estoca água benta em casa e tem como superpoder o conhecimento
sobre a verdadeira natureza da realidade.
No filme, Deus e o Diabo fizeram uma aposta sobre as
almas humanas: ganha quem arrebatar mais gente pro seu
reino, seja o inferno (uma L.A. após a bomba) ou o paraíso
dourado. A única regra é a não-interferência direta.
Agentes de cada lado, anjos e demônios, são encarregados
de espalhar a influência divina (ou demoníaca) para
conquistar almas. E, como não poderia deixar de ser,
os vilões não conseguem, a princípio, manter o acordo.
É o filho do diabo em pessoa quem resolve quebrar as
regras e instaurar seu reinado de terror aqui mesmo,
no mundo entre céu e inferno. Para tanto, precisa de
ajuda divina, que encontra nas manchas de sangue da
lança do destino, a mesma que atravessou o flanco direito
do Cristo na cruz. A lança é encontrada, apropriadamente,
no norte do México, logo abaixo da Califórnia de Constantine.
A muamba sagrada é então atravessada por um passador
cucaracha,
e chega às mãos das pessoas erradas. Cabe a ninguém
menos que Constantine - já que Deus ou é imóvel ou está
preocupado com outros assuntos - resolver o problema
todo.
O que se vê é uma enxurrada de clichês mal realizados
e amarrados por uma estética neo-heavy-metal, muita
luz azul e atitude de nonchalance
dos personagens – é quase o pacote completo de Matrix
(Idem, 1999), obra da qual Constantine
obviamente derivou, pegando emprestado até mesmo o protagonista.
A cena final de Constantine – não a alardeada final depois de todos os créditos,
uma nulidade absoluta, mas a que aparece antes deles
– é bem um exemplo do tom do filme: tendo passado todo
o tempo sofrendo por conta de um câncer adquirido por
causa do uso indiscriminado do tabaco, John, depois
de mil peripécias, é curado pelo diabo; a última cena
então o mostra de costas, fazendo o gesto, repetido
mais de uma dezena de vezes durante o filme, de acender
um cigarro. Conforme a câmera vai girando para sua frente,
porém, sua voz em off
nos avisa de que agora ele crê que Deus tenha de fato
um plano para cada habitante do mundo, e é aí que somos
confrontados com o que ele realmente tinha em mãos:
chicletes. O filme de Lawrence, ao contrário de Hellblazer, - em que o herói, por ter sido curado do câncer em uma
aventura não muito semelhante, se regozija em saber
que poderá continuar fumando, isto é, reprisa o seu
comportamento de sempre - é um aprendizado de vida e
de fé para John Constantine, que compreende que só através
de renúncia e abnegação pode continuar cumprindo a missão
que lhe foi destinada: expulsar demônios das pessoas.
Juliana Fausto
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