SPARTAN
David Mamet, Spartan, EUA, 2004

David Mamet, desde que resolveu se aventurar no oficio de cineasta, vem realizando filmes que existem muito mais como exercícios. Tentativas de se aproximar de uma gramática que lhe é exterior e dominá-la. Nos seus últimos filmes, esta proposta vinha dado sinais claros de cansaço, resultando em filmes cada vez mais estéreis. Spartan é, neste contexto, uma agradável surpresa, já que revela Mamet depurando sua forma e conduzindo com elegância mais esta incursão no cinema de gênero no qual o cineasta se enxerga como mero visitante.

O título se refere ao protagonista (Val Kilmer) um soldado de moral e retidão espartanas, mas também ao esforço do diretor, já que há uma clara intenção de simbiose entre a missão de Kilmer e a de Mamet. A intriga excessivamente elaborada é um dos pontos frágeis do filme, assim como a tentativa meio frouxa e paranóica de dar uma dimensão política ao exercício. Spartan consiste assim uma novidade dentro da carreira de Mamet: um filme melhor dirigido do que escrito. Mamet se incumbe da missão simples e a executa até o final.

Há algo extremamente datado em Spartan, a sua noção do que seria um filme de gênero parece ter mais a ver com um cinema americano que acabou há muito tempo atrás. David Mamet tem plena consciência disso, Spartan tem até algum senso de humor com sua própria condição de filme fora do tempo. Ao lado de um filme de espionagem high-tech pretensamente sério como Jogo de Espiões, Spartan se mostra um filme analógico. Nisso, Mamet não está tão distante de um cineasta como John Carpenter - o que o limita, é que se aproxima do seu objeto a partir de um pronto de partida excessivamente teórico. Mas, mesmo nisso, Spartan é um avanço em relação aos filmes anteriores, já que Mamet criou um protagonista cuja tendência calculista, pela primeira vez desde Jogo de Emoções, parece justificada dentro do filme.

Spartan existe como filme compacto. Tudo nele tende a economia e a miniatura (tirando a já mencionada tentativa frustrada de dar uma dimensão mais política à trama). O trabalho de Mamet é todo voltado para a contenção. Cria um filme duro e propositalmente frio à imagem do seu protagonista. O filme ocasionalmente alcança resultados bem fortes dentro deste jogo (o trabalho de montagem tem momentos muito bons), mesmo que o todo resulte mais digno do que memorável. De qualquer forma, é um avanço dentro de uma carreira que vinha cada vez mais se mostrando irrelevante.

Filipe Furtado