Na saída de uma sessão de imprensa,
uma jornalista (cujo nome não é revelado aqui por falta
de autorização) definiu a 8ª
Cor do Arco-Íris: “Não é fácil fazer um filme iraniano”.
Descontada a generalização contida no termo “filme iraniano”,
por pressupor a homegeneidade de uma produção heterogênea,
a frase não deixa de ter a sua felicidade. Isso, se
por “filme iraniano” quisermos entender alguns filmes
de Kiarostami (em especial Onde Está a Casa de Meu Amigo?) e Panahi
(em especial O
Balão Branco), com suas dramaturgias seqüenciais,
de repetição, nas quais o quase nada, o evento mínimo,
é elevado à condição de épico. Que fique claro que é
um épico minimalista, épico da imobilidade, no qual
as metas traçadas são secundárias (em geral não cumpridas)
de modo a se valorizar o processo, não a tarefa e o
resultado. A força dessas narrativas está menos nos
acontecimentos e nas motivações dos personagens, mas
concentra-se acima de tudo na força de vida contida
em pequenos gestos, em situações sem funcionalidade
dramática, em encontros pelos percursos - extraindo
desses hiatos da existência a poesia do inesperado,
do mínimo denominador comum.
É esse o caminho buscado por essa produção matogrossense,
que não por acaso também se constrói narrativamente
como busca. O percurso mostrado é o de um garoto do
interior que, clandestinamente, pegue carona em um caminhão
até Cuiabá, onde, para comprar remédio para a avó doente,
tem de vender sua cabra, mesmo sem desejar abrir mão
dela. Em sua jornada pelas ruas, encontra gente diversa
(um velho, delinqüentes mirins, dois hippies, um pintor,
uma empregada doméstica que recebe o santo), sempre
tratada como caricatura, como tipo, sem impor-se pela
singularidade (a exemplo de Onde Está a Casa do Meu Amigo?). Nenhum
desses encontros produz verdade ficcional ou revela
autencidade no registro documental (pouco importanto
se alguns trechos são documentais ou encenados). Amaury
Tangará coloca o protagonista em interação com essas
vidas urbanas, em espaços públicos, mas não se apreende
nada dos encontros: todas as situações parecem lá estar
apenas para que se mantenha o menino em deslocamento
por pontos turísticos e periféricos de Cuiabá.
O uso abusivo de dois tipos de trilha-sonora, uma para
amanteigar as emoções (horrível), outra para produzir
efeito de desordem (apenas ruim), talvez derive da consciência
da fragilidade visual. Com imagens granuladas e cores
esmaecidas (não se sabe se por estilo ou por circunstância
de produção), às vezes captada com lentes destinadas
à deformação das formas originais da arquitetura para
remodelá-las no espaço, a narrativa jamais transforma
o documental em verossímil. O problema mais grave não
está na ação dentro dos quadros, mas em como se filma
essas ações, em como não se extrai nenhuma poesia ou
vitalidade desses instantes, em como não se extrai espontaneidade
alguma dos atores. Por isso a frase da jornalista, de
forma geral, é de sábia simplicidade: não adianta empregar
fórmulas exitosas, como as de Kiarostami e Panahi, porque
cada fórmula pede um olhar singular, uma busca da verdade
no artifício, sem o qual não há expressão possível.
Cléber Eduardo
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