FORA DO MAPA
Campbell Scott, Off the map, EUA, 2003

Quem só lembra de Campbell Scott como o ator que despontou como interesse romântico de Julia Roberts no soporífero Tudo por Amor, de Joel Schumacher (1991) ou como o protagonista do geracional-grunge Vida de Solteiro, de Cameron Crowe (1992), deixa passar sua estréia bastante interessante como diretor, em A Grande Noite (1996) – uma comédia um tanto excêntrica em que ele dividiu a direção com o colega ator Stanley Tucci. Pois com este Fora do Mapa, produção extremamente independente que nunca chegou a ser lançada comercialmente nos EUA (mesmo com passagens por Sundance e Cannes em 2003), Scott volta a mostrar que tem uma sensibilidade considerável no trato com personagens e atores, optando de novo por uma ambientação um tanto "fora do normal" para seu filme.

Basicamente, Fora do Mapa é a história, contada pelo ponto de vista de uma menina de 11 anos, de um verão cujo grande evento foi a depressão que o pai dela enfrentou. Ponto de partida um tanto quanto inesperado para um filme que caminha tanto pela comédia quanto pelo drama. No papel do pai, Sam Elliott coloca sua máscara e voz inconfundíveis para funcionar com extrema beleza no retrato deste personagem que é uma autêntica força da natureza em completa perda de gosto pela vida. Joan Allen completa a família como a mãe que carrega a casa nas costas como pode, enquanto o marido não se recupera – num personagem tão mais forte quanto nunca deixa ser tomada por um olhar culpabilizador ou não-compreensivo com o momento vivido pelo companheiro de vida. A grande força do filme, no entanto, vem mesmo é da resistência em assumir para seu pequeno conto de personagens um registro de “filme-doença-do-Supercine” – e faz isso eminentemente pela inserção constante (e muitas vezes desconcertante) do humor e também de um trabalho cuidadoso de criação de ambientes em torno desta família que mora isolada da civilização, num trailer no meio do deserto do Novo México (daí o título).

Se pode ser dito que o filme tem alguma falha maior é um certo aparente orgulho excessivo de sua “sensibilidade”, uma certa tentativa de se afirmar o tempo todo como um “filme de arte”. Isso se marca por um certo exagero desnecessário nas tintas excêntricas de algumas caracterizações (tentando sempre aquela sensação “livre”, algo “offbeat”), mas onde mais se faz notar é no exagerado uso da trilha sonora, que aqui não exerce função manipulativa, e sim de um distanciamento sempre “artístico”. Scott não percebe que, com menos esforço constante para se diferenciar, poderia aí sim ter feito um filme autenticamente surpreendente. Como está faz um filme que deixa a marca de um olhar bastante sensível para a vida e para o cinema, mas que ainda pede uma burilada a mais antes de ser realmente “único”.

Eduardo Valente