É impossível não
pensar, logo no início de Efeito Ketchup,
nas matrizes de um certo cinema adolescente, eminentemente
norte-americano. Mais especificamente, no cinema de
high school, que é quase um gênero
dentro de um gênero, pois o filme de Fabik se
localiza perfeitamente neste gênero. Impressiona,
então, a força desta matriz tais as semelhanças
de aproximação dramatúrgica, e
mesmo de mise-en-scène, com tantos filmes
do mesmo gênero que já vimos. Vira quase
uma estranheza (ou um retrato um tanto involuntário
de uma globalização de costumes - com
direito a menção ao programa de TV Big
Brother local, e à banda de rap sueco na trilha,
cujas letras soam absolutamente iguais aos afins americanos)
perceber que, a princípio, só muda mesmo
a língua que as personagens falam - e o sueco
soa ainda mais peculiar quando os rockzinhos de praxe
da trilha sonora entram em inglês. Dentro desta
matriz do cinema adolescente, demoramos a entender exatamente
a filiação do filme, uma vez que ao clima
das filmagens dentro da escola (que lembram todo o esquematismo
das relações nas comédias românticas
adolescentes) se soma uma surpreendente crueza (inclusive
com o surgimento de um pênis segurado pela personagem
principal, de doze anos) que remete mais ao cinema de
Larry Clark.
Mas, logo fica tudo esclarecido quando percebemos que
O Efeito Ketchup é uma perfeita versão
escandinava de Aos Treze: um filme que incorpora
uma certa "modernidade" de linguagem ou uma
pretensa "ousadia" de temas a um latente moralismo
alarmista. Sim, como no exemplar norte-americano, trata-se
de mais uma "cautionary tale", ou seja, um
filme para alertar os pais do perigo de deixarem seus
adolescentes sozinhos no assustador mundo da puberdade
contemporânea. A única diferença
notável entre os dois filmes é que o progenitor
ausente aqui trocou de sexo: desta vez a menina é
criada pelo pai praticamente "solteiro" (ou
seja, abandonado pela mãe). De resto, batem ponto
todas as figuras esperadas: a perua auto-centrada e
manipuladora; o rapaz sensível mas incapaz de
escapar das pressões do grupo de amigos; os boçais
"garotos populares"; as amigas que abandonam
a protagonista quando esta se torna "mal-vista".
Tudo seguindo a cartilha do manual de auto-ajuda para
relações entre pais e filhos adolescentes
(e é engraçado ver que o filme, jocosamente,
coloca o pai lendo um destes numa cena - talvez sem
se dar conta de que a piada não cabe no discurso
que monta).
Ao final, como era de se esperar, um evento catártico
une todos os "de bom coração"
no filme (que podem até ter vacilado, mas nunca
deixaram de estar do lado certo da Força), e
permite a vingança final que leva à humilhação
("olho por olho, dente por dente") dos mau-caráteres.
Tudo fica bem quando termina bem - mesmo que o final
seja uma estranhíssima cena de "remissão
a infância", que revela bem o olhar infantilizador
que o filme atira sobre todos os seus personagens. E,
no meio tempo, continua sendo difícil se ver
nas telas de um cinema de viés mais comercial
(portanto, Elefante excluído) um retrato
deste universo que se mostre minimamente interessado
de fato pelo adolescente - e não "preocupado"
com ele. Se a opção dada é apenas
a deste pretenso "realismo", maior motivo
ainda para abraçar a sátira desbragada
de Meninas Malvadas - este sim o grande filme
de high school do ano.
Eduardo Valente
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