A NOVA CINDERELA
Mark Rosman, A Cinderella story, EUA, 2004

Os tempos atuais são extremamente complicados para os cineastas que se dedicam a exercitar-se num gênero específico, como é o caso de Mark Rosman neste A Nova Cinderela. Isso porque a linguagem do cinema tem sido de tal forma deglutida, regurgitada e cuspida de volta, que um abraço ao gênero pede uma de duas posições, necessariamente: uma tamanha crença nele que consiga nos pegar de surpresa em tempos tão cínicos, e com isso encontrar extrema beleza (exemplo mais recente: Diário de uma Paixão, de Nick Cassavetes); ou o uso do manancial de imagens criadas e recriadas, de narrativas urdidas e encenadas, para propor uma nova Verdade, por assim dizer, que venha emergir das profundezas do mais falso (exemplo mais recente: Kill Bill, ambos). Rosman não demonstra a capacidade de fazer nenhum dos dois, e toma o caminha mais “fácil”, porém o menos interessante: tentar o tempo todo se equilibrar entre as opções. Ou seja: abraça todas as convenções do gênero, no que busca a adesão do espectador, mas dando piscadelazinhas de esperteza, como se quisesse não levar as regras a sério de todo. Soa, então, apenas cínico e desinteressado.

A idéia de “atualizar” a história de Cinderela como um filme de high school contemporâneo poderia ser, em si, fonte de muito interesse. E Rosman até incorpora alguns elementos interessantes, aqui e ali – como a estranha mistura de contemporaneidade na ambientação da escola com um tanto de nostalgia dos anos 50 na casa e na lanchonete onde a nossa nova Cinderela trabalha. No início este jogo tem ainda alguma graça, em especial com a apresentação dos dois personagens “alívio cômico” (a madrasta e o amigo da adolescente – ambos donos dos melhores momentos do filme). Mas, rapidamente, Rosman vai abraçando cada vez mais a sua banal narrativa de “menina-impopular-apaixonada-pelo-menino-popular-mas-sensível” e quando se vê estamos num exemplar absolutamente comum do já esgotado gênero do high school, versão anos 90. Num ano em que vimos Meninas Malvadas quase virar o gênero de cabeça para baixo, todas as tentativas de Rosman de dar diferencial a seu filme soam como o menino mauricinho querendo chocar a família tomando porre de Keep Cooler.

A isso, Rosman tenta juntar também uma discussão sobre realidade e fantasia (na encenação e na vida), mas não sabe muito bem como desenvolver o tema a contendo no seu roteiro – que incorpora ainda uma um tanto quanto precária e banal crítica aos tempos atuais (“it’s not what you are, it’s what you wear”). O resultado, logo logo, é o tédio mais completo, que só nos deixa como opção ficar vendo a mais que esperada descambada do filme para uma crença quase anacrônica no american way of life (esta sim bem anos 50), e a tradicional vingança contra os personagens “maus” - rebaixados e humilhados aos papéis que forçavam aos “bonzinhos” no início do filme. Mais do mesmo, requentado e bem fraco. 

Eduardo Valente