CASA VAZIA
Kim Ki-duk, Bin jip, Coréia do Sul, 2004

Seja um processo de auto-reflexão ou meramente uma fase seguinte de seu cinema, Kim Ki-duk parece trilhar no momento um caminho, se não por completo contrário em discurso, de um interesse cada vez menos instigante. Em Casa Vazia parte de uma idéia de bastante interesse (um sujeito que ocupa casas de pessoas em viagem por algum tempo), para chegar num enorme vazio estético. Na realidade, o interesse das imagens dura algo como dois minutos, pois um primeiro momento já na primeira invasão do protagonista levanta a primeira desconfiança: o jovem logo após adentrar o recinto, começa a consertar objetos quebrados, lavar a roupa, como se em retribuição a sua estadia. Até onde vai a inocência do espectador?

O processo de transição de um cineasta cujo olhar chegou a interessar bastante num determinado momento, para o atual "estado das coisas" do cinema de Kim Ki-duk, se dá da mesma maneira em que, em seu cinema, saem as imagens fortes onde existem os corpos e entram as imagens vazias onde os corpos parecem invisíveis (aqui, literalmente). Há ainda em seu cinema uma capacidade de construção de ambientes e climas, uma capacidade de colocar em cena aquilo que lhe interessa – o problema aqui é que todo esse processo parece esgotado, e se o resultado ainda é o intendido pelo cineasta, já não é mais capaz de qualquer emoção. Quase um cinema tão nulo que mereça passar despercebido, o que é de certo algo que não se espera – e menos ainda deseja – de qualquer cineasta, sobretudo realizadores que em algum momento podem ter chamado um tipo especial de atenção.

O filme sai de Tsai Ming-liang por completo (em cujo Vive L’Amour, acima de todos, parece instalar-se), quando, em uma de suas invasões, o protagonista encontra a mulher e começa então a ajuda-lá a escapar de um violento marido. Torna-se difícil ver qualquer interesse nos personagens “bonitos” de Kim Ki-duk quando estes são a completa bondade marginalizada, e o resto do mundo parece o caos assustador que tenta afugentá-los. Sobram o marido, que além de violento com a esposa, é vingativo; o policial que irá massacrar nosso protagonista com palavras e brutalidades físicas antes e depois de saber que não é um homicida (e ainda irá gerar a cena mais patética do filme com o já “invisível” mocinho acertando as contas com ele); e a noção das famílias em deterioração (que já começa a intermediar nossas relações com as casas vazias antes mesmo do encontro com a mulher, que virará a principal narrativa do filme - tendo em vista o pouco que nos permite ver, por exemplo, daquela primeira família).

Casa Vazia remete a uma noção particularmente assustadora: um cinema de sentimentos que pouco sente. Só isso pode vir à mente perante as imagens que Kim Ki-duk tão calmamente parece construir. Muito mais do que traçar um caminho enquanto cineasta que mais e mais parece interessar pouco, Kim Ki-duk realiza em Casa Vazia o mais falso dos filmes humanos: não convence da bondade e tão pouco da maldade – sua ternura tem a sensibilidade de uma martelada. Enganador, em amplos sentidos.

Guilherme Martins