Se é bastante curioso observar
a trajetória de cineastas oriundos de outras áreas do
fazer cinematográfico, com John Sayles não poderia ser
diferente. Casa dos bebês surge como um elemento
surpresa dentro da carreira de John Sayles, roteirista
nato que nunca escondeu que sua formação cinematográfica
vem da escrita: um filme em que sua base literária soa
muito mais frágil que suas habilidades de construir
belas imagens, e onde suas ambições políticas funcionam
muito mais quando os personagens estão com a boca fechada.
A narrativa gira entorno de uma casa de adoção de bebês
no México, onde Sayles tenta traçar o contato entre
um grupo de mulheres bastante diferentes entre si em
busca da adoção de crianças com a cultura e a vida mexicana
- além de lançar uma visão politizada nada simplificante
sobre a situação e as relações entre as mulheres. Um
dos pontos importantes a serem notados é que não importa
que o cineasta esteja dirigindo melhor que escrevendo
aqui, a base do filme será o texto, tal qual Sayles
sempre constrói seus filmes, decorrendo então em uma
porção de problemas para o filme. O subtexto político
nem sempre funciona, as cenas com o garoto pobre são
de forma geral equivocadas, as longas trocas de diálogos
entre as mulheres americanas não constroem tão bem as
personagens como pretendem – ainda que sucedam quando
o interesse é construir a relação entre elas. Mas é
interessante ver como Sayles, embora acredite bastante
em suas idéias (muito longe de serem desprezíveis, só
mais bem trabalhadas anteriormente pelo cineasta), parece
disposto a se colocar em questão, o que ganha em interesse
quando as idéias soam mais frágeis do que costumam em
seus trabalhos.
Se Terra do Sol é um filme de tese (e também
um belo filme), Casa dos bebês parece soar quase
como o oposto. Tudo parece trabalhado de uma outra forma,
o discurso é mais aberto, as personagens são mais leves
- e quando não o são destoam por completo uma das outras.
Sayles se revela grande encenador dos momentos mais
simples, como a cena em que Maggie Gyllenhaal fala ao
telefone com o marido distante ou o momento em que a
mulher americana e a jovem mexicana trocam confidências
cada uma em sua língua e ainda assim parecem refletir
perfeita capacidade de compreensão - momentos realmente
belos dentro de um filme irregular em sua grande maioria.
Acima de tudo um filme onde a direção de atores é a
chave para que qualquer coisa funcione já que, calcado
diretamente em suas capacidades dramáticas, Sayles não
decepciona exercendo a função. É certo que tem em mãos
um bom elenco, mas também se sabe que isso não seria
o bastante, e algumas das cenas já citadas são também
grandes exemplos de cenas onde a direção de atores é
perfeita. Mais importante ainda parece ser o último
plano: a tela congelada com dois bebês sendo levados
para suas mães adotivas, um plano recheado de esperança
e simplicidade, que cai como um fim perfeito para o
discurso expansivo do filme. Um plano particularmente
bem filmado, pensado, montado (e Sayles também exerce
a função de montador aqui, assim como compõe e toca
algumas das canções). Casa
dos Bebês, embora um trabalho menor do cineasta,
ainda é de grande interesse.
Guilherme Martins
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