CAMPEÕES
Marek Najbrt, Mistrí, República Tcheca, 2004

Campeões tem uma estrutura narrativa no mínimo peculiar: seus capítulos são divididos como os jogos que a seleção de hóquei sobre o gelo da República Tcheca disputou no campeonato mundial do esporte (algo que realmente aconteceu), até chegar a um improvável título. É como se, no Brasil, usássemos uma campanha futebolística da seleção numa determinada Copa do Mundo como comentário, símbolo e justificativa narrativa para a estruturação de uma determinada ficção (Jorge Furtado fez algo parecido no "Comédia da Vida Privada", marcando o encontro de um grupo de amigos ao longo de anos para assistir sempre aos jogos da Copa).

Trata-se de uma simpática idéia, que o filme explora até também. No entanto, há que se ver o que acontece com a ficção que de fato compõe o filme a partir desta boa idéia. E esta, inegavelmente (e sem trocadilhos) patina bastante. Desde o início, Campeões deixa claro sua idéia de trabalhar com um microcosmo (uma minúscula cidade de beira de estrada que, a julgar pelo filme, só tem mesmo os seis ou sete habitantes que são personagens aqui) para, a partir deste, ganhar um significado nacional maior (espelhado tanto na presença do time de hóquei que representa a nação como nas diferentes questões que cada um dos personagens representa - o da imigração empobrecida, o da presença dos resquícios da Segunda Guerra, etc). Só que nesta lógica de relação micro-macro, quem sai perdendo são os personagens, que na maioria das vezes têm pouca vida para além daquilo que o cineasta quer que cada um deles signifique em determinado momento. Resolvido a traçar um painel que passa, acima de tudo, por uma certa decadência e desesperança com as relações humanas no geral, Najbrt acaba não separando o que seria uma observação sobre o enfado de ser, em si mesma, enfadonha.

Há, é verdade, um clima de constante estranheza (marcada, principalmente, pelas visões que o bêbado local tem com a seleção de hóquei) que empresta algum interesse, tanto visual quanto de construção de universo ao filme. Assim como é verdade que, no clímax e na resolução final pós-vitória da seleção, o filme ganha bastante em ritmo e em vida interna - especialmente na fuga das únicas duas "forças da natureza" do local (a mulher e o garoto) do círculo vicioso criado pelos homens de lá. E também deve-se dizer que a conexão do acontecimento extra-local (a vitória no Campeonato, celebrado por um dos homens como a solução dos problemas tchecos, da prova da superioridade tcheca, etc) com o que se filme tem especial interesse para nós e nossa relação, de novo, com as Copas do Mundo e campeonatos esportivos em geral. São estes elementos que fazem de Campeões, se um filme um tanto claudicante, de forma nenhuma um trabalho desprovido de qualidades e fontes de curiosidade.

Eduardo Valente