BAAADASSSSS!
Mario Van Peebles, Baaadasssss!, EUA, 2003

Alguns filmes tendem a levantar questões que podem soar mais incisivas no que diz respeito ao ato de fazer cinema em si do que ao próprio cinema que vemos na tela. Se Baaaadassss se encaixa nesse quesito também é uma reafirmação de como é muito complicado sequer se pensar na possibilidade de separar as duas coisas. Mario Van Peebles realiza um estudo bastante pessoal sobre a trajetória de Melvin Van Peebles, aqui mais emulado como mentor do que necessariamente pai, enquanto tentava se esquivar das limitações dos estúdios e investia sua vida na realização de Sweet Sweetback’s Baaaadassss Song. Todo o interesse gerado pelo filme de Mario, então, não vem necessariamente do esforço dramatizado na tela, mas do esforço que ecoa estar sendo realizado atrás desta.

Van Peebles (o filho) parece tão mergulhado no delírio de reencarnar todo o processo que testemunhou décadas atrás, que torna-se um bocado desleixado sobretudo com a direção de atores, o que de certa forma será vital para que a viagem que pretende emperre de princípio – talvez o único ator que realmente esteja na sintonia certa seja o próprio Mario (além das belas moças que mais do que cumprem seus papéis). Sua busca por uma aproximação com a obsessão do pai é intercalada por depoimentos dos personagens, tentando emular um falso documentário. Nestes momentos, quase se acredita que o cineasta vá optar por uma vertente mais calcada no humor – que, mesmo presente, parece sempre atravessado por demais pelos tons dramáticos, onde Van Peebles por alguns momentos opta por morais complicadas (ainda que siga um olhar mais compreensivo perante as atitudes de Melvin do que necessariamente assinando embaixo seus atos).

Qual seria então o mérito de Baaaadassss? Apesar de todos os problemas, que se aplicam ainda a encenação e decupagem equivocadas em algumas opções (com seus “momentos” de Réquiem para um Sonho), de alguma forma este filme ainda soa importante. Talvez pelo impacto de ver uma obra onde se possa notar pulsar por trás das câmeras muita vontade de cinema, e ver até nos seus problemas um tanto desta; ou por observar um cineasta ter a coragem de realizar uma obra absolutamente pessoal, onde impera uma piração particular. São interesses complicados, sobretudo por estarem excessivamente além da imagem, mas se tornam obrigatórios quando se transpõem nesta. O filme, então, se nos decepciona em muitas instâncias, nunca chega a perder de todo o interesse.

Guilherme Martins