PARA SEMPRE EM MINHA VIDA
Gabriele Muccino, Como te nessuno mai, Itália, 1999

Antes de realizar o já exibido comercialmente por aqui O Último Beijo, sentimental comédia dramática sobre as rachaduras afetivas de casais em diferentes estágios de seus relacionamentos, o diretor italiano Gabriele Muccino, hoje dedicado à refilmagem americana de O Gato Sumiu, de Cedric Kaplish, havia dirigido esse Para Sempre na Minha Vida.  Antes da primeira imagem, notícias sobre turbulências políticas, de diferentes épocas e lugares, plantam uma questão. Independentemente do período e do país, os problemas amorosos suplantam a macro-realidade. O filme visa registrar esse universo de intimidade, mas com os dois olhos no universal-atemporal. Tudo poderia se passar em qualquer tempo-local, porque os fatos e contextos não contaminam as guerras e os armistícios das emoções. Qualquer contexto apresentado, portanto, terá ali de ser esvaziado. Pois nada pode interferir na essência do que está sendo tratado pelo diretor: a insegurança em relação ao futuro, a ansiedade gerada pela perda da virgindade, os desencontros afetivos e a construção de uma identidade que, sem abrir mão da aceitação em determinado grupo de convivência, persegue a afirmação da individualidade.

Sobre tudo isso saberemos logo nos primeiros minutos. Embora vá abrir o leque narrativo em seu transcorrer, incorporando diferentes personagens como condutores de alguns trechos, o roteiro elege um protagonista. Trata-se de um adolescente de 16 anos, sempre às turras com os pais, às voltas com a descoberta de táticas de sedução e louco para perder a virgindade. Ele participa da ocupação de sua escola com outros colegas, em protesto contra a privatização do ensino, mas só tem cabeça para a namorada de um chapa. Uma traminha boboca demais para se sustentar é elaborada para costurar os temas propostos. Temos, assim, uma linha de frente e um pano de fundo. Ou seja: os atritos de ordem amorosa e a militância estudantil. Uma e outra serão usadas para levar o espectador ao riso, servirão para que se tire sarro delas. O drama do personagem central, mesmo sendo banhado em apelos emocionais, é relativizado por um enfoque que, a cada momento, assume uma posição distante. É o olhar de um adulto para um adolescente, de quem não leva a sério as dores do outro, de quem finge entender sem compartilhar. Pelo contrário. Muccini trata esse sofrimento com a intenção de nos fazer achar graça dele. Conflito familiar, choque de gerações, amizades abaladas, tudo vira piada.

O mesmo se dá, de forma ainda mais explícita, com o lado político. No caso, apolítico. Os militantes são reduzidos a slogans vazios, tratados como bobocas inúteis que se reúnem para fazer farrinha, para se sentir parte de um grupo, provavelmente para fugir da convivência dos pais. Persegue-se, intencionalmente ou não, a despolitização. Nesse sentido, é um filme sintomático. Filia-se com a Itália de Berlusconi ao tirar tudo de contexto, debochar da resistência juvenil e ainda olhar para Maio de 68 apenas como molecagem romântica. Muccino é o anti-Nani Moretti do cinema italiano. Sua ambição, aparentemente, é pequena. Só na aparência. Ele caça uma aparência de filminho sensível com levada esperta, o que, para muitos olhares, leva o resultado a ser visto como delicado e meigo em sua modernidade. O caminho para tal é a música “toca-coração” e a encenação cheia de cacoetes, com ritmo dinâmico-apressado, que busca um estilo contemporâneo, da moda, prisioneiro da ditadura da “câmera leve”, asfixiado pela montagem estilhaçada. Tais características podem até soar como opção adequada à urgência dos personagens, mas não ajudam em nada na construção de uma carga emotiva e dos próprios personagens.

Para Sempre na Minha Vida é tolo no que importa e lamentável no que afirma não importar. Sua pretensão nada pequena é dar uma resposta com o próprio filme a quem cobra dos italianos uma filiação às posturas dos neorealistas e do cinema política dos anos 60/70. E essa resposta é de esquecimento da realidade. Ela não importa, defende o diretor.


Cléber Eduardo