Close de chinesa que fala em
som direto
– Cada vez mais mística e raivosa, a guerra e
a revolução dentro de mim, com essa necessidade
besta de tirar roupa. me exibir por nada (vai tirando
a roupa, no fim da seqüência tem um tipo
dormindo ao lado que a beija) fim da seq. Ela está
contra telão do Monte Fuji. Fala sobre o Oriente.
títulos. depois a seq. na rua com autos.
– Não agüento mais Hong Kong, quero cair
fora do Japão, ser freira no Paraguai, contrabandista
em São Francisco, ladrona em Belém do
Pará, traiçoeira no Oiapoque, mística
no Chuí.
Eu rezo a única maneira de salvar-me, tirar o
pé da lama mundial, vou atrás do misticismo
e da aventura, só acredito nelas. Eu penso muito
em mim porque quero me limitar, situar, mostrar-me a
mim mesma, o que eu queria era partir da minha própria
superação, indivíduo e detalhe
sexual subdesenvolvido e sem nenhuma importância.
Detesto esse meu jeito moderninho de falar; esses meus
gestos, os macetes da nossa civilização
ocidental. Contra a propriedade, pela posse. Misticismo
é a visão direta. Documentário
é misticismo; câmera fixa é delírio;
som direto é exacerbação. Só
da raiva pode sair alguma coisa. Por exemplo, o José
Celso Martinez, o que é? não gosto mais
de ninguém, não tenho nenhum medo da morte.
Tenho medo de mim. É o que me salva. O terror
dentro da minha cuca. Sempre preferi a maldade e a traição.
São os nossos caminhos, de onde pode sair qualquer
esperança coletiva. Mudar a face da terra. Só
a violentação é moral, o resto
é lixo. Transformar, sujar, botar as mãos
na massa; Antes do Carnaval em Caxias, a trepada oriental.
O Oriente também é uma bosta, estético,
contemplativo, auto-suficiente. Prefiro a convulsão
da. Gostaria que. Escolheria. O terror ainda é
a saída intelectual para nós, indivíduos
talentosos e superáveis do Ocidente subdesenvolvido,
na tentativa inevitavelmente cruel de entender nosso
mundo e agir contra ele; intelectualmente, diria que
o terror é o caminho mais sensato e adequado
ao relacionamento didático-visionário
dos seres e objetos.
A profecia hoje é obviamente oriunda do neo-realismo
e do naturalismo. A televisão é visionária,
o rádio também. O jornal é profético.
Adoro seu sensacionalismo – elemento altamente marxista,
e provocador. A provocação é o
último estilo literário (ainda) do século
XX. Dela pode surgir a invenção formal
e a revelação do conteúdo místico.
Por uma forma pobre, limitada, ascética, asséptica,
que contenha um extravasamento anti-cristão e
religioso.
Estou com a saída nas mãos e o que é
que eu faço? Estou vendo diretamente as coisas
como elas são para mim. Sei que sou o maior,
ainda bem. Infelizmente, mistificação
no ponto mágico vira sensatez. Os místicos
e os mistificadores serão os personagens dos
meus filmes porque minha imaginação só
comporta essa raça de revolucionários.
Mentindo, sendo parcial e demagógico, encontro
a verdade sincera. Sendo superficial, sou profundo –
evidentemente. Agora é a vez da América.
Por uma arte americana de invenção, barroca
ao nível da forma (uma forma ascética
e baseada no excesso, bárbara e realista como
a televisão); clara, didática, revolucionária
ao nível do conteúdo: não há
conteúdo possível nesta situação
e estado de coisas, meados do século de praxis-Marx;
o conteúdo é a forma, está na cara;
o conteúdo é este: deixar cair! isto é,
deixar explodir; as coisas andarem; o tempo correr;
o mundo caminhar para soluções inevitavelmente
simples, poéticas e revolucionárias. Meu
destino intelectual continua sendo simplesmente o da
nossa face direita da Terra. Quero pensar como um telex
e é só; nem mais nem menos; essa é
minha proposição, mítica, mística
e mistificadora – para melhor achar a verdade, ou melhor,
provocar a verdade nos outros, me discutir e corromper
internamente, me situar como o mais mentiroso dos novos
autores talentosos do novo cinema, vítima do
ancestral cinema de autor; tudo é possível;
simplesmente; então para que essa onda toda?
cinema, parcela da infra-estrutura de direita diante
da qual cinicamente nos criamos, inventamos, tentamos
dar do nosso melhor, então, diante da direita
pura e simplesmente institucionalizada, nós,
colaboracionistas e criadores do sistema, nós
produzimos uma arte inevitavelmente imoral e obscena.
Rogério Sganzerla
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