Remake
de um filme homônimo de Roger Corman de 1958,
Teenage Caveman faz parte de um conjunto de cinco
filmes produzidos em 2001 para serem exibidos na TV
a cabo através da Creature Feature Productions,
uma união de Lou Arkoff (filho do lendário
produtor de filmes de terror "b" Samuel Arkoff),
da atriz Colleen Camp e do criador de efeitos especiais
Stan Winston para homenagear a produtora AIP, que nos
anos 50 produziu uma infinidade de filmes de ficção
científica e terror direcionada a públicos
jovens. A única coisa que faz supor que
Larry Clark seria o realizador mais indicado para dirigir
este filme é a palavra "teenage" no
título, e certamente os produtores o contrataram
para extrair interpretações convincentes
dos diversos adolescentes que são protagonistas
do filme. O resultado é menos uma convergência
de interesses do que um choque de vontades, e Longe
da Escuridão (título genérico
que o filme ganhou em português) só funciona
para incondicionais amantes de Clark ou para admiradores
"sorvete-na-testa" de cinema de terror. Mesmo
assim, não impede que haja alguma coisa muito
interessante acontecendo na tela. Vejamos.
Num mundo pós-apocalíptico,
em que a tecnologia parece ter voltado a suas formas
rudimentares e a humanidade vive em pequenas comunidades
tribais, um grupo de jovens vive confllitos de geração
com os adultos que comandam a tribo. Cansados das ordens
ditatoriais do chefe da taba, eles decidem ir contra
os mandamentos e partem juntos em busca de caça.
Um súbito clarão e estamos numa casa hi-tech,
controlada também por dois personagens adolescentes,
mas que de fato são humanos com centenas de anos
de idade. Inicia-se então uma série de
cenas de orgia, que na verdade são experimentos
dos senhorios para transmitir por contato sexual um
vírus que ora confere às pessoas vida
eterna, ora as faz explodir. Apenas um casal da tribo,
apaixonado e virgem, decide não fazer parte do
jogo sexual. Seguem-se então diversas cenas de
ação e perseguição, assassinatos
estúpidos e jogos de poder.
Fica desde o início muito
claro aquilo que interessa a Larry Clark e aquilo que
não o interessa de forma alguma. As cenas de
ação e terror do filme são conduzidas
abaixo do nível piloto-automático, quase
sabotando mesmo o princípio do roteiro. Nenhuma
tensão criada, nenhum crescendo emocional, nenhuma
fascinação pelo cinema fantástico:
tanto efeitos especiais quanto a cenografia aparecem
diante de nós desinvestidas de qualquer poder
de sedução que são a pedra de toque
do gênero de ficção científica.
A dicotomia entre a pureza sexual do jovem casal e a
promiscuidade do resto da tribo é igualmente
um não-problema (o que acaba incomodando, uma
vez que o roteiro do filme parece fazer dela o centro
narrativo). Em compensação, sempre que
os jovens estão entregues às trocas de
fluidos e de saberes e aí faz-se importante
notar que uma das poucas fontes de literatura herdadas
pela tribo foi uma edição da revista Penthouse
, o filme passa a ganhar verdadeiro interesse.
No entanto, só há
uma cena em que Larry Clark parece filmar inteiramente
o que gosta: a já mencionada cena da orgia inicial.
Atores naturais no que falam e como se comportam com
seus corpos dão a esse momento uma força
comparável aos melhores momentos de Ken Park,
por exemplo, mas é uma força que inexiste
no resto do filme. Cabe fazer defesa generalizada de
a) esse filme; e b) de Larry Clark? a) não; b)
sim, no sentido de que é um dos únicos
cineastas junto só com Gus Van Sant
que sistematicamente tenta criar um estatuto próprio
para o adolescente na tela, em filmar a maneira como
eles (ou ao menos parte deles) verdadeiramente falam
e se comportam. Numa tradição que costuma
fazer da adolescência apenas uma passagem ao mundo
adulto quando paradoxalmente o que se vê
hoje no mundo é uma juvenilização
da idade adulta e que coloca atores de quase
trinta anos para interpretar pessoas de menos de vinte
anos (de Barrados no Baile a Dawson's Creek
para as duas características), esquivando-se
dos problemas mais decisivos que essa idade coloca em
função de uma passagem à responsabilidade
(e, logo, à ordem), o cinema de Larry Clark vale
como a função utópica de pela adolescência
instaurar um outro mundo de valores em que viver não
equivale a se constranger. Com todos os problemas que
isso implica. Pasolini não está tão
longe.
Ruy Gardnier
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