Para
a maioria das pessoas que lêem sobre cinema, ainda
parece um ato quase misericordioso sair de casa com
fortes expectativas para se ver um filme de ação
completamente comercial ainda mais quando não
se trata de um caso especial, seja por remexer no cinema
(As Panteras Detonando) ou seja pela política
engajada (Exterminador do Futuro 3). Bem Vindo
à Selva é nada mais que um exercício
em estilo nos filmes de ação, daqueles
que se auto-recicla, com um bom senso de humor. O cinema
é um caldeirão, e certos cineastas sabem
tirar proveito disto. Neste aspecto pode-se dizer que
aguardava que desse caldo viesse algo bastante interessante.
O interesse veio, em escala menor.
Um detalhe brilhante abre o filme de Peter Berg: numa
ponta, enquanto The Rock adentra uma boate movimentada,
Arnold Shwarzenegger (como se passasse um cetro mas
ao mesmo tempo principalmente abrisse todo o filme para
o espectador) surge andando na direção
da câmera, dispara um "have fun", e
logo desaparece, sem influenciar em nada na narrativa
que começa a se desenrolar. Momento brilhante
na maneira como é conduzido, e que com extrema
perfeição estabelece o terreno que estaremos
habitando. Esqueça os limites, parece urrar o
filme. Poucos minutos depois, The Rock enfrentará
um time inteiro de futebol americano no braço,
e como não poderia deixar de ser, lhes põe
no chão.
A trama do filme de Berg é simples e direta,
mas será perfeita para atrair o mais completo
conjunto de personagens absurdos, em situações
absurdas. The Rock vai para Amazônia cumprir um
último serviço à seu chefe para
que enfim possa se aposentar e abrir um restaurante:
resgatar o filho dele (Seann William Scott), que se
emaranhou na selva amazônica atrás de preciosidades
antigas (!). Por lá, juntam-se à trama
Christopher Walken como o americano que lucra as custas
do trabalho escravo dos nativos, e uma garçonete
brasileira (Rosario Dawson) com segundas intenções.
Há também uma antigüidade, aparentemente
entitulada "o gato negro", a qual os personagens
saíram à caça, por razões
adversas. Não há como deixar de lembrar
da frase de Shwarzenegger a cada novo elemento a adentrar
a cena poucas vezes um filme se auto-definiu tão
sinceramente nos primeiros instantes de projeção.
Logo após embarcar em sua viagem, The Rock começa
sua jornada conhecendo um piloto escocês excêntrico
que pilota um avião colado com fita isolante
(!). Será um prenúncio para o humor que
irá povoar o resto do filme: macacos africanos
isso mesmo raivosos e pouco gentis, uma fruta que
dopa bizarramente as pessoas, pequenos animais marinhos
tarados por membros sexuais e atraídos pela urina
(o resultado é o castramento!), nativos falando
um português perfeito que o filme não faz
questão alguma de esconder tratar-se de uma dublagem
vagabunda, e por aí vai. Podem parecer artifícios
baratos para uma diversão fácil, e não
o deixam de ser é a maneira como são
conduzidas que levam o filme a ter algum êxito
na proposta, sendo essa algo bastante leve. É
um filme cafajeste, de uma forma bastante sincera.
Esse caldeirão do absurdo não poderia
terminar de outra maneira: em revolução.
Um olhar mais exigente poderia pedir um tratamento mais
engajado de tal assunto o filme não esconde
a importância política do ato, mas pura
e simplesmente interessa muito mais a Berg tirar pequenos
elementos, seja na forma, seja na relação
dos personagens em cena, ou como brincar com pequenos
dispositivos do cinema de gênero. É necessário
sempre voltar a cena inicial, que prenuncia o que viria
adiante: quem naquele momento não se apega com
algum interesse, certamente calhará de chegar
entediado até aqui. Há algumas cenas muito
bem pensadas de ação, e é difícil
não notar o curioso fato, cada vez mais raro
no cinema de ação americano, de se buscar
o estilo em algo menos notadamente espalhafatoso a
ação aqui é bastante clássica,
sem que soe velha.
Que Peter Berg poderia ir adiante com o material que
tem em mãos, muitos já nos provaram
dentro de um exercício de gênero com bastante
semelhanças ao exercido em Bem Vindo à
Selva, F. Gary Gray fez dois belos filmes recentemente
mas também já se viu diversos artesãos
fracos transformarem suas obras em fiascos. Longe disso,
Berg sai com um filme limitado, mas funcional, e absurdo
da melhor maneira possível.
Guilherme Martins
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