Na
tarde do último domingo (14/3) a Rede Globo exibiu
a partida São Paulo x Juventus pelo campeonato
paulista. Tinha tudo para ser – e de certa forma foi
– um jogo dos mais modorrentos. Já o espetáculo
apresentado pelo canal de TV passou longe disso, se
revelando um dos momentos de maior estranhamento na
TV recente. Um pouco de contexto para o leitor que não
acompanha futebol: tratava-se da última rodada
da primeira fase do campeonato paulista, e num outro
lugar o Corinthians fazia um jogo para escapar do rebaixamento
(luta que travava exatamente contra o time do Juventus).
A Globo originalmente havia programado a partida do
Corinthians, como de praxe, mas voltou atrás
depois que a diretoria do clube barrou a transmissão
do jogo. Oficialmente para atrair torcedores ao estádio,
extra-oficialmente, segundo a imprensa esportiva, para
garantir que com a transmissão da outra partida,
o São Paulo não fizesse corpo mole.
A coisa já começa interessante aí,
pelo credo de que a transmissão de TV fosse coagir
os jogadores do São Paulo a se empenhar no jogo,
que para eles não valia nada. Ninguém
quer fazer feio diante das câmeras de TV, elas
decerto têm um certo valor intimidador para os
jogadores, mas se essa era a idéia da diretoria
corinthiana, não correu tudo a contento. As câmeras
fizeram os jogadores do São Paulo se esforçarem
por 45 minutos, é verdade, mas dada a natureza
da transmissão do canal de TV nem isso teria
sido necessário. Porque São Paulo x Juventus
foi um não-evento televisivo. Se é norma
da televisão, ao apresentar um evento ao vivo,
procurar torná-lo um espetáculo tão
grande quanto possível, a transmissão
da Globo fez o caminho inverso. Isto porque, da forma
como foi transmitido, nada no jogo efetivamente importava.
Bem distante do que gostaria a diretoria corinthiana,
a transmissão de São Paulo x Juventus
foi um massacre da imagem. Um exercício de esvaziamento
do seu significado. O jogo se revelou de quase nulo
interesse por quem o transmitia. O evento televisivo
espetacular existiu naquela tarde, mas em outro lugar.
Poucas vezes se viu a televisão dando tanto destaque
ao fora de quadro. Só ele importava. A transmissão
só ganhava vida com os flashes do outro jogo,
que se davam a cada jogada de perigo que lá ocorria,
e mesmo outras que só justificariam as inclusões
num destes clipes de melhores momentos numa partida
bem ruim. De acordo com amigos que efetivamente viram
o outro jogo pela Sportv fora mesmo uma partida ruim,
mas a transmissão da Globo não escondia
seu entusiasmo por ele. Afinal, este jogo sim tinha
de ser espetacular.
Em campo, os 22 jogadores correm de um lado para outro,
mas parecem os únicos (salvo os poucos torcedores
da Juventus) interessados na partida. Até os
comentaristas e o narrador da Globo só conseguiam
discuti-la em relação a outra imagem que
não víamos (a do outro jogo, um jogo virtualmente
exibido); só assim as imagens que víamos
pareceram poder ser legitimizadas. Seu interesse só
existia via filtro. Até quando assistíamos
a torcedores acompanhado o jogo junto ao tradicional
radinho de pilha, a informação que recebíamos
da TV é de que eles estavam ouvindo a partida
do Corinthians.
À luz de sua apresentação televisiva,
São Paulo 2x1 Juventus, apesar da evidência
das imagens, parece nunca ter acontecido.
Filipe Furtado
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