Escola de Rock
Richard Linklater, The school of rock, EUA, 2003
Richard Linklater sempre teve um ouvido muito bom. Algo que se mostrava bem aparente tanto nos diálogos, quanto na sua habilidade de construir cenas a partir da música (mesmo num filme como Waking Life, onde todos os diálogos acabam por funcionar muito mais como uma trilha a partir da qual a ação é literalmente coreografada). O crítico Kent Jones certa vez descreveu um dos primeiros filmes do diretor, Jovens, Loucos e Rebeldes (93), como a melhor representação da experiência de ouvir musica dentro de um carro numa rodovia. Escola de Rock, que não deixa de ser um complemento pré-adolescente e censura livre do anterior, talvez seja o melhor filme já feito sobre a descoberta da música pop.

É isso que Linklater se propõe aqui: captar o momento em que pela primeira vez se descobre música popular e o impacto que para muita gente esta descoberta tem quando feita aos 10, 11, 12 anos. É algo reconhecível para muitos, e Linklater trata tudo com grande honestidade e sensibilidade (e não deixa de ser uma grande sacada do filme que ele se passe numa escola, justamente o lugar de onde, quando se tem 10 anos de idade, a música ajuda a escapar).

Não se trata propriamente de um filme sobre música, mas sobre o sentimento que esta pode despertar no ouvinte. Digamos que é um filme sobre fãs de rock, muito mais do que sobre rock (não é a toa que o filme independe de se gostar ou não das bandas que o personagem de Jack Black cita). Linklater sempre demonstrou compreender bem pessoas - especialmente num cuidado com detalhes de comportamento -, e aqui ele faz maravilhas com o elenco infantil para passar esta idéia (vale elogiar também atuação de Jack que consegue ao mesmo tempo funcionar numa chave cômica 100% paródica sendo extremamente sincera).

O filme (assim como boa parte da boa música pop, vale dizer) não deixa de se construir a partir de elementos já bastante usados, mas Linklater espertamente sabe como tratá-los de forma que o filme nunca soe velho e surrado. Trata-se menos de jogar contra o clichê e mais retrabalhá-lo: por exemplo, estão aqui os pais sempre preocupados, mas o filme consegue compreender o ponto de vista deles. Até mesmo as piadas mais batidas, como a do garotinho gay que quer ser o estilista da banda, acabam ganhando um frescor nas mãos do diretor.

Escola de Rock não deixa de tratar o "montar uma banda" de forma não muito diferente de se fazer um filme (há uma atenção bem grande para todos os elementos em torno da música). Como filme, não deixa de lembrar uma bela canção pop.

Filipe Furtado