Da
estrutura:
Se há algum motivo para atenção
nesse 21 Gramas do meteórico rapaz Iñarritu,
fora o talento da dupla de atores masculinos, é
a sua trepidante capacidade de transformar malabarismo
narrativo em monotonia. Cineasta que se trilha em exercícios
tipificados de pós-linguagem cinematográfica,
Inãrritu faz em 21 Gramas uma das mais
inférteis acrobacias narrativas dos últimos
anos - deixando os detratores de Amnésia
até com um pezinho atrás... O que impressiona
é que, se o filme consegue alguma intensidade
em sua primeira meia hora (apostando nas lacunas e no
jogo de ações incompletas), logo se deixa
revelar como um mero tratado melodramático e
diretivo sobre o cultivo da tristeza. Conforme junta
as peças de seu quebra-cabeça, Inãrritu
deixa cair a máscara de cineasta supostamente
interessado num cinema de incompletudes e acasos, para
deixar claro seu discurso fatalista e delirantemente
conclusivo. Se há algo impressionante na estrutura
de 21 Gramas, é a forma como ela é
traída por dentro da própria lógica
dramática que rege o teor melodramático
de seu diretor, se tornando um show de fragmentos previsíveis
(em sua "imprevisibilidade").
Do melodrama:
Mas o que há de tão problemático
em um simples melodrama? Tradição audiovisual
mexicana, como a telenovela no Brasil, a chave melodramática
de representação não surpreende
por ser umas das matrizes através da qual um
diretor mexicano vá constituir seus clichês
pessoais, seus signos particulares (o espanhol Buñuel
soube como ninguém se infiltrar nesse universo
em sua fase latino-americana). O que decepciona no cinema
de Iñarritu é que esse decalque, esse
exercício de melodrama não se dá
através de uma consciência cinematográfica
da releitura ou da transposição de clichês
do gênero. Não: Inãrritu lida com
a matriz do melodrama (datada de mais 60 anos) sem qualquer
capacidade de ultrapassá-la, de recolocá-la
- ele antes a parasita. Com uma breve e inócua
maquiagem sobre meia dúzia de clichês narrativos
(típicos de qualquer filme enlatado do Supercine
global), o diretor tenta se vender como um nome de um
cinema de novidade, como um cinema de impacto conceitual.
A repetição de clichês sempre pode
ser belíssima nas mãos de um bom artesão,
mas se torna quase ridícula diante de tantos
fogos de artifício.
Do conceito:
E o que resta, então? O conceito... Mais próximo
de uma "sacada" do que de uma idéia,
o título das 21 Gramas é o tipo
de "tirada" que se esgota na sinopse. "21
gramas é o peso que se perde ao morrer - qual
o peso que se carrega em uma vida?" Ponto final.
Está tudo dado: ao longo do filme, o que se vê
é um diretor se empenhando em ligar pontos (da
forma mais sensacionalista possível), esmerado
apenas em delinear um conceito que se parece mais com
um lema de pára-choque (ou um slogan "cabeça")
do que com uma idéia para cinema. 21
Gramas tem mais de duas horas de duração,
mas poderia se esgotar em duas linhas.
Do estilo:
Ah, sim, o estilo. Câmera na mão, fragmentos,
violência. Amores Brutos já tinha
trazido tudo o que Iñarritu sabe fazer. 21
Gramas apenas reitera que, sim, o moço tem
um estilo delineado, sabe o que faz com a câmera
e tem certa paixão por histórias paralelas.
A questão de Iñarritu não parece
ser mesmo o "como" ou "o quê",
mas o "POR QUÊ?" Seu cinema parece tão
firme (saído do forno com tanto orgulho de saber
"o que" quer dizer e "como" quer
vender...) que a sensação que se tem é
a de uma obra semi-morta, esmaecida em si mesma. Um
odor de portfólio misturado com perfume
éxotique se propaga na sala de cinema.
A combinação não cheira muito bem.
Felipe
Bragança
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