Ao que podemos julgar pelos
filmes que chegaram ao Brasil, Matías Bize vem se tornando
um cineasta especialista em trabalhar com cenários de
ação limitada. Em Na Camatínhamos um quarto de
motel. Aqui em A Vida dos Peixes uma casa durante uma festa. É nessa festa que
o jornalista Andrés, chileno há muito tempo radicado
na Europa, vem a reencontrar amigos e um grande amor,
Beatriz. O diretor pretende focar com sua câmera apenas
o essencial, concentrando-se nos personagens, sendo
os cenários da casa apenas esboçados com o objetivo
de localizá-los espacialmente na ação. Essa idéia de
cinema que se propõe enxuto em recursos narrativos nos
traz a memória que, para o bem ou para o mal, a herança
do Dogma 95 permanece viva.
Felizmente Bize e suficientemente inteligente para não
se ater às limitações inerentes ao Dogma. Utiliza-se
de conceitos para impor sua visão pessoal, demonstrando
com isso bastante competência como encenador. Tem domínio
de imagem para transmitir de forma coerente a idéia
explícita em seu título: comparar seus personagens a
peixes num aquário, fazendo que sua câmera percorra
um fluxo coerente, acompanhando Andrés, que não consegue
ir embora da festa, apesar da sua intenção declarada
em ficar pouco tempo. Ao se deparar com rostos e figuras
do passado, o protagonista vai sentindo-se cada vez
mais preso num universo ao qual acreditava não mais
pertencer.
Entretanto, se o Bize diretor demonstra talento para
a criação de um universo no campo visual e sonoro, A
Vida dos Peixes carece de um trabalho mais forte
do Bize roteirista. Se a idéia de um retorno aos amigos
do passado e a lembrança do suicídio de um deles traz
a memória a influência de O Reencontro, de Lawrence
Kasdan, filme emblemático da década de 1980, não temos
aqui igualada a originalidade do roteiro de seu possível
modelo. O roteiro de A Vida dos Peixes, com seu
tratamento episódico e seu clímax com a tentativa de
reatamento de um romance frustrado, limita-se a uma
série de situações clichês que minam bastante a força
da talentosa mise-en-scène de Bize.
Gilberto Silva Jr.
Outubro
de 2010
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