Pânico, assim como
outros slashers produzidos em série, caso
fossem fábulas, teriam a seguinte moral: o mal existe e nunca morre. Michael
Myers, Jason Voorhees e, claro, Gosthface seriam provas de que as forças malignas sempre voltam, não importa o quão
combatidas. Há uma espécie de ontologia do mal nestes longas metragens
geralmente baratos e quase sempre vagabundos. Bastante interessantes, aliás,
dependendo do grau de relação que estas obras mantêm com o mundo e do domínio
artesanal dos mecanismos do horror por parte dos cineastas. Craven possui tais habilidades, basta perceber como o cineasta consegue criar suspense
com os mesmíssimos elementos que vem utilizando desde 1996 – uma cozinha,
um telefonema anônimo, uma voz sinistra. E, claro, Pânico 4, está
absolutamente conectado com o mundo.
A nova criação
do diretor de A Hora do Pesadelo funciona como um radar a detectar as
vibrações emitidas pelas diversas manifestações do mal em nosso tempo. E o faz
de maneira tão precisa que chega a, sem trocadilhos, assombrar. Ainda mais
quando se pensa – e isso é absolutamente inevitável – no recente
massacre na escola em Realengo. Mesmo que as intenções motivadoras da tragédia
no Rio de Janeiro sejam sensivelmente diferentes daqueles apresentados pelo Gosthface da vez, a essência é a mesma: matar em favor de
uma causa pessoal e, geralmente, absolutamente banal. Não há dinheiro,
religião, política ou qualquer outro “grande tema” envolvido. Mata-se por
vingança, pelo estrelato. Mata-se pela vontade de ser o que não se é
(Wellington Menezes, ao que parece, gostaria de assumir a máscara de radical
islâmico; Trudie, a da eterna vítima Sidney
Prescott). Neste processo, pouco importa quem são as vítimas, basta que se pareçam
com aquilo que provocou a fúria do assassino.
Mais do que
qualquer estratégia metalingüística, e elas são
inúmeras (algumas vezes tolas, outras engraçadas), o que sintetiza a questão
das aparências em Pânico 4 é o plano em que Trudie,
depois de nocautear Sidney e executar a performance de vítima,
autoflagelando-se, deita-se ao lado da prima, mimetizando a posição dos braços,
tronco e cabeça de Sidney. Podemos chamar de efeito-espelho não só aquilo que
se obtém no interior do plano, com a organização dos corpos das duas atrizes em
perfeita simetria, mas também a imagem da realidade do mundo devolvida ao
espectador. Afinal, está tudo aí: a vitimização como causa – Columbine, Realengo, 11/09: os assassinos consideravam-se
todos vítimas – e efeito: Sidney tornou-se uma celebridade por ter
sobrevivido aos três massacres em Woodsboro. Quem é
capaz de contradizer o fato de que o mundo de hoje é repleto de vítimas em
busca de holofotes? Para Craven, essa é a nova face
do mal. Assustador.
Wellington Sari
Abril
de 2011
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