PÂNICO 4
Wes Craven, Scream 4, EUA, 2010

Pânico, assim como outros slashers produzidos em série, caso fossem fábulas, teriam a seguinte moral: o mal existe e nunca morre. Michael Myers, Jason Voorhees e, claro, Gosthface seriam provas de que as forças malignas sempre voltam, não importa o quão combatidas. Há uma espécie de ontologia do mal nestes longas metragens geralmente baratos e quase sempre vagabundos. Bastante interessantes, aliás, dependendo do grau de relação que estas obras mantêm com o mundo e do domínio artesanal dos mecanismos do horror por parte dos cineastas. Craven possui tais habilidades, basta perceber como o cineasta consegue criar suspense com os mesmíssimos elementos que vem utilizando desde 1996 – uma cozinha, um telefonema anônimo, uma voz sinistra. E, claro, Pânico 4, está absolutamente conectado com o mundo.

A nova criação do diretor de A Hora do Pesadelo funciona como um radar a detectar as vibrações emitidas pelas diversas manifestações do mal em nosso tempo. E o faz de maneira tão precisa que chega a, sem trocadilhos, assombrar. Ainda mais quando se pensa – e isso é absolutamente inevitável – no recente massacre na escola em Realengo. Mesmo que as intenções motivadoras da tragédia no Rio de Janeiro sejam sensivelmente diferentes daqueles apresentados pelo Gosthface da vez, a essência é a mesma: matar em favor de uma causa pessoal e, geralmente, absolutamente banal. Não há dinheiro, religião, política ou qualquer outro “grande tema” envolvido. Mata-se por vingança, pelo estrelato. Mata-se pela vontade de ser o que não se é (Wellington Menezes, ao que parece, gostaria de assumir a máscara de radical islâmico; Trudie, a da eterna vítima Sidney Prescott). Neste processo, pouco importa quem são as vítimas, basta que se pareçam com aquilo que provocou a fúria do assassino.

Mais do que qualquer estratégia metalingüística, e elas são inúmeras (algumas vezes tolas, outras engraçadas), o que sintetiza a questão das aparências em Pânico 4 é o plano em que Trudie, depois de nocautear Sidney e executar a performance de vítima, autoflagelando-se, deita-se ao lado da prima, mimetizando a posição dos braços, tronco e cabeça de Sidney. Podemos chamar de efeito-espelho não só aquilo que se obtém no interior do plano, com a organização dos corpos das duas atrizes em perfeita simetria, mas também a imagem da realidade do mundo devolvida ao espectador. Afinal, está tudo aí: a vitimização como causa – Columbine, Realengo, 11/09: os assassinos consideravam-se todos vítimas – e efeito: Sidney tornou-se uma celebridade por ter sobrevivido aos três massacres em Woodsboro. Quem é capaz de contradizer o fato de que o mundo de hoje é repleto de vítimas em busca de holofotes? Para Craven, essa é a nova face do mal. Assustador.

Wellington Sari


 Abril de 2011