Des
hommes et des dieux, de Xavier Beauvois, França, 2010 (COMPETIÇÃO)
O
que há de melhor em Des
hommes et des dieux é
a justeza com que Xavier Beauvois trabalha o discurso religioso
–
há uma tentativa real de compreensão do discurso
cristão e da forma como ele se relaciona com aquela
situação.
Isso é raro, e faz com que o filme consiga escapar de uma
série de clichês de
dramatização, que
normalmente acabam esvaziando a grande maioria das propostas de
filmes que lidam com a religião. Por outro lado, o roteiro
do
filme parece excessivamente centrado nessa proposta, numa solidez um
tanto analítica que limita o filme. Para se ter uma
idéia,
um dos momentos dramáticos chave do filme é uma
cena em
que Beauvois simplesmente filma o rosto de cada um dos monges, em
close-ups que vão se fechando em escala – e
pronto, é
isso. Beauvois procura na maior parte das vezes um tom mais frio e
equilibrado, o que dá ao filme um certo ar de
importância
que ele na verdade não tem – na realidade,
é um
filme limitadíssimo, meio chapado mesmo, e que nunca vai
além
das idéias que tem na cabeça.
Des
filles en noir, de Jean-Paul Civeyrac, França, 2010 (QUINZENA)
Des
filles en noir,
de Jean-Paul Civeyrac, exibido na Quinzena, podemos dizer, ao
contrário, que é um filme cuja solidez
é
verdadeira, o que também não o impede de cair nas
suas
próprias limitações. O filme
é sobre duas
adolescentes de uma cidade pequena e a rejeição
que
sentem em relação ao mundo de uma maneira geral,
somado
a um típico fascínio romântico pela
idéia
do suicídio. Há um sentido de
organização
extremo dos elementos (de encenação e
metafísicos)
que às vezes faz pensar num cineasta como Brisseau
–
como também um tipo de tentativa de compreender os
personagens
a partir do próprio ato de filmá-los, numa
insistência
e apego àquilo que eles têm de mais fundamental (o
corpo, o rosto, a posição em
relação à
câmera). Mas se em Brisseau existe todo um sentido de
aventura
(!) nessa proposta, um rumo ao desconhecido, em Civeyrac o objetivo
se limita à própria compreensão dos
personagens.
É um filme que fica detido, amarrado a um certo conjunto de
sentimentos daquelas personagens (rejeição
à
vida, falta, culpa), e que faz isso muito bem, narrativamente falando
– e “competência”, aqui, jamais
quer dizer
mediocridade. Mas fica sempre a sensação de que o
filme
poderia ter ido mais fundo.
Hors
la loi, de Rachid Bouchareb, França/Argélia/Bélgica/Tunísia/Itália, 2010 (COMPETIÇÃO)
Há
muito pouco a se dizer sobre Hors
la loi.
Junto com Chongquing
Blues,
deve ser o pior filme da competição oficial (mas
não
vi vários). A vilanização evidente dos
franceses
nas primeiras cenas do filme (passadas antes e durante a Guerra da
Argélia) foi o principal motivo para a polêmica
criada
em cima do filme. Mas isso dura cinco minutos. Depois a
história
é passada para a França, e Bouchareb parece
querer
fazer qualquer coisa entre um épico familiar e um drama
político, num contexto de violência que faz pensar
em
Era
uma vez na América.
Mas é um filme completamente lavado, sem atmosfera
– a
violência não é sentida na pele (nem em
parte
alguma). Os personagens são arquétipos vazios, e
cada
cena parece servir apenas para reforçar certas
características
deles que já havíamos compreendido nos primeiros
dez
minutos de filme, o que torna o resultado bastante entediante. Lembra
muito os típicos dramalhões que costumam
concorrer ao
Oscar de melhor filme estrangeiro (é bem possível
que
Bouchareb chegue lá).
Calac Nogueira
Maio de
2010
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