Boxing Gym, Frederick Wiseman, EUA, 2010
(QUINZENA DOS REALIZADORES)
O mais interessante no trabalho de Frederick Wiseman, e
nesse Boxing Gym em particular, é seu interesse por aquilo que o cinema,
como dispositivo, tem de mais analítico e científico. Seu novo filme tem lá
seus bons momentos de conversa, sobre os mais variados assuntos, entre os
freqüentadores da academia de boxe onde o filme foi rodado, e é evidente também
a vontade de falar sobre a devoção a esse esporte e tudo que ele representa
para os seus praticantes (certamente personagens interessantes), mas sem dúvida
o maior ponto de interesse que Wiseman encontrou nesse espaço são as
possibilidades que ele oferece, diante da câmera, para a realização de um
estudo sobre o corpo humano.
É isso que o diretor busca obstinada e laboriosamente
registrar, partindo da escolha precisa pelo universo amplo do boxe. O filme
impressiona por sua capacidade de observar clinicamente o corpo em trabalho,
naquilo que ele tem de mais elementar, naquilo que ele tem de potência. Os
enquadramentos de Wiseman são estudados, precisos, criam imagens quase
abstratas dos movimentos do boxe e de seu treinamento. Boxing Gym, num
certo sentido, tem seus pontos de contato com a vídeo-dança, gênero que invadiu
o universo da vídeo-arte nos últimos anos, mas Wiseman é sem dúvida um homem de
cinema – alguém que entende de quadro, de montagem (seu novo filme tem uma
noção de ritmo impressionante), elementos formais fundamentais para se atingir
um bom resultado na tela. Mais do que isso, Boxing Gym representa o
interesse por um retorno aos primórdios do cinema – quando este era ainda
essencialmente um aparelho que aguçava a curiosidade cientifica do homem do
século XIX. Nada de anacrônico nessa proposta, no entanto. Trata-se de um dos
filmes mais jovens desse festival – ágil, leve, curioso.
Alice Furtado
Maio de 2010
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