Chatroom, Hideo Nakata, Inglaterra, 2010
(UN CERTAIN REGARD)
Chatroom parte de uma premissa interessante. A idéia
é alternar entre cenas da vida familiar e social de um grupo de adolescentes britânicos
e a realidade de um imenso fórum virtual – espécie de Mirc atualizado ao dias
de hoje – composto de infinitos chatrooms pelos quais circulam esses
mesmos personagens; tudo isso sem recorrer ao texto escrito. A realidade
virtual da sala de bate-papo é assim transformada em espaço físico, os
personagens corporificam seus avatares e o texto é tornado fala. A diferença
entre um mundo e outro, como se não pudesse deixar de haver, é marcada nos tons
da fotografia, no grau de verossimilhança do cenário, no gestual dos atores – os
avatares são sempre mais performáticos que as matrizes, simbolizando de forma
bem precisa o modo de funcionamento deste universo.
Contudo, se a solução visual proposta por Hideo Nakata para
representar o mundo textual dos chats parece bastante original (não podemos
deixar de suspeitar fortemente que ela já existisse na peça teatral sobre a
qual o filme se baseia), ainda que uma série de clichês seja empregada para
sustentá-la, o mesmo não podemos dizer sobre a caracterização dos personagens
adolescentes. Obviamente estamos diante de um conjunto de mentes torturadas,
alguns já experientes em antidepressivos e tentativas de suicídio, todos eles necessariamente
vivenciando crises de identidade e a maioria com problemas de desafeto
familiar. Nada de novo também no trabalho de câmera – assim como o cinema de
grande orçamento tratou de associar a fotografia pálida e acinzentada à
noção de realismo (quem foi que teve essa brilhante idéia?), paradigma que aqui
é seguido à risca, também houve, principalmente ao longo da última década, a determinação
igualmente arbitrária de que o cinema que representa os jovens e a eles se
dirige deve ser feito em câmera na mão, ou no mínimo em movimento incessante, o
que Nakata infelizmente não ousa contestar.
Em essência, Chatroom não é muito diferente daquilo
que o diretor já havia desenvolvido na mitologia de O Chamado – mais uma
vez estamos diante de um perigo que se manifesta a principio virtualmente, mas
que a um dado momento atingirá a realidade. Exceto que dessa vez não há
paranormalidade nenhuma, e o perigo é representado por um simples garoto,
William, que no passado tentou se suicidar diversas vezes, e que agora, através
de seu próprio chatroom, tenta influenciar Jim, tratado pelo filme como
um adolescente mais frágil e manipulável (como muitos outros que aparecem ao
longo da história), a fazer o mesmo para valer. O que Hideo Nakata falha em
trabalhar, com um argumento que a princípio não é de todo ruim, é a dimensão
cerebral da ameaça, justamente o ponto divergente do perigo físico de Samara em O Chamado. Ao invés disso, trata o filme como um simples thriller de ação, no qual falta construção de clima para manter relevante o suspense, em
grande parte devido às afetações de interpretação que tornam tudo um amontoado
de superfícies performáticas totalmente inverossímeis, não apenas nos chats,
mas também na vida.
Alice Furtado
Maio de 2010
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