Um
geólogo atravessa o sertão nordestino fazendo uma
pesquisa de campo para a futura construção de um
canal
que desviará as águas de um rio e
inundará
alguns vilarejos. Tema político? Não,
“a política
não é da minha conta”, diz a
narração
em off do geólogo. No caminho, ele lembra da ex-mulher e
curte
uma fossa. O filme vai somando no vazio signos e rostos que colhe ao
longo do trajeto. Resultado: setenta minutos de um mesmo sentimento
–
uma baita dor de cotovelo – sendo reiterado num travelogue solitário, diário íntimo de viagem à beira do autismo. O espaço não ajuda: tudo
parece
igual, sempre o mesmo, como se não houvesse movimento e
mudança; a solidão dos lugares os desdiferencia.
Uma
inércia se instala: as imagens de Karim Aïnouz e
Marcelo
Gomes nem operam um deslocamento imaginário do espectador,
como na ficção psicológica
clássica, nem
o afetam fisicamente, como nas obras dos cineastas-artistas que
dão
ênfase à expressão imediata de
sensações.
Elas passam por nós de modo inofensivo. Há um
registro
interessante de um decadentismo brega das
locações de
beira de estrada. E só. O resto é puro
tédio e
melancolia chique – toda melancolia é chique,
assim como
todo tédio; no universo popular com que o filme
não
dialoga senão através de referências
musicais e
iconográficas (ou seja, um diálogo todo ele
indireto,
mediado, quiçá mediatizado), o cara que perde a
mulher
fica puto, fica triste, mas não entediado e
melancólico.
Aïnouz
e Gomes trabalham menos um “tema” do que uma
“força
afetiva” sobre a qual querem realizar quase um
documentário,
quase uma ficção. Para tanto, adotam uma
espécie
de visão
plástica,
um olhar que só capta do mundo as formas
primárias, as
que contêm poucos significados e muitas qualidades
sensórias.
Mais um exercício de vibrações de cor
do que de
representação do espaço. As imagens do
filme são
emissões afetivas em primeira pessoa, depósitos
de
impressões subjetivas. Você não
vê o corpo
do protagonista (ele é uma voz e um olhar – em
raros
momentos, é também um ouvido), mas vê o
interior
de suas reações ao mundo. Nenhuma imagem do
filme,
entretanto, é especialmente forte ou reveladora, todas ou
quase todas poderiam muito bem estar numa videoarte clichê.
Viajo
Porque Preciso, Volto Porque Te Amo
se apresenta assim como um filme em que o grande tema em jogo, no fim
das contas, é a sensibilidade de seus diretores-autores, e
em
que o lugar do outro nada mais é que uma
superfície a
mais para projetar essa autocelebrada sensibilidade.
Luiz Carlos Oliveira Jr.
Maio de 2010
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