ENTRE IRMÃOS
Jim Sheridan, Brothers, EUA, 2009

A guerra do Afeganistão representa hoje para o cinema algo próximo da guerra do Vietnã em termos de imaginário. Ela já deixou de ser um assunto candente sobre o qual é preciso discursar ou se posicionar, ou mesmo a necessária matéria-prima-em-dia-com-os-noticiários de filmes de ação corriqueiros. Trata-se de um panorama estabelecido, ao qual pode-se recorrer de maneira imediata ao mencionar-se o termo guerra ou, ainda, a atuação do exército americano – o que carrega consigo, de forma natural mas não necessariamente explícita, o ideário dominador e expansionista que atravessa a história deste país. O uso de câmeras de vídeo, as torturas, o cativeiro, são todas características pontuais de um cenário dado.

Em Entre Irmãos, Sam (Tobey Maguire) parte com seus soldados para o Afeganistão como seu pai foi para o Vietnã. Os traumas que carrega quando volta em nada diferem daqueles que tanto vimos representados no cinema em relação a outras guerras. Vietcongues ou servidores do talibã, pouco importa: o que interessa são as cicatrizes emocionais que permitem que esta experiência alimente um drama que sustente a narrativa. E, neste sentido, Jim Sheridan é particularmente feliz com este seu último filme. A guerra contra o terror é um estado de coisas que serve para nos revelar a mentalidade do personagem do fuzileiro bom moço que nada faz além de honrosamente cumprir obrigações como parte inerente de seu dever pátrio, e provocar nele uma transformação que funcione como mote para a exploração de conflitos nas relações familiares.

Tais conflitos são o real ponto de interesse do filme, e Sheridan filma bem os vetores de força dentro do espaço da casa, assim como os embates e aproximações entre os membros da família. A progressiva reintegração de Tommy (Jake Gyllenhal) ao seio do núcleo familiar em paralelo ao afastamento de seu irmão Sam não é trabalhada como uma oposição simplista imposta por um roteiro com o desejo de chocar, mas como uma autêntica questão de balança familiar. Afinal, a repressão de um sentimento de um lado sempre corresponde a uma explosão de outro, para que o equilíbrio seja de alguma forma garantido. Mesmo que se trate do equilíbrio das eternas brigas. Pois tal é a lei da família.

E é o gosto por filmar os afetos e desafetos familiares de forma funcional e despojada – algo já presente em seu filme de 2002, Terra dos Sonhos – que faz deste filme de Jim Sheridan nada mais nada menos do que um filme profundamente ciente de seu material e de seus limites. Uma boa direção de atores, a recusa de paralelismos óbvios na montagem e um grande respeito pela coerência do desenvolvimento psicológico dos personagens (que garante que eles não traiam sua “natureza” para fazer avançar o drama) garantem um bom filme mediano no qual o principal objetivo é atingido com propriedade: emocionar. Um filme que ocupa de maneira digna o lugar de atualizar dramas familiares e sentimentais derivados da existência habitual de campanhas belicistas. Sem grandes ênfases, sem encenações grandiloqüentes, sem lançar mão de um melodrama espalhafatoso. Apenas um filme corrente sobre assuntos correntes.


Tatiana Monassa