A guerra do Afeganistão representa hoje para o cinema algo
próximo da guerra do Vietnã em termos de imaginário. Ela já deixou de ser um
assunto candente sobre o qual é preciso discursar ou se posicionar, ou mesmo a
necessária matéria-prima-em-dia-com-os-noticiários de filmes de ação
corriqueiros. Trata-se de um panorama estabelecido, ao qual pode-se recorrer de
maneira imediata ao mencionar-se o termo guerra ou, ainda, a atuação do
exército americano – o que carrega consigo, de forma natural mas não necessariamente
explícita, o ideário dominador e expansionista que atravessa a história deste
país. O uso de câmeras de vídeo, as torturas, o cativeiro, são todas
características pontuais de um cenário dado.
Em Entre Irmãos, Sam (Tobey Maguire) parte com seus
soldados para o Afeganistão como seu pai foi para o Vietnã. Os traumas que
carrega quando volta em nada diferem daqueles que tanto vimos representados no
cinema em relação a outras guerras. Vietcongues ou servidores do talibã, pouco
importa: o que interessa são as cicatrizes emocionais que permitem que esta
experiência alimente um drama que sustente a narrativa. E, neste sentido, Jim
Sheridan é particularmente feliz com este seu último filme. A guerra contra o
terror é um estado de coisas que serve para nos revelar a mentalidade do
personagem do fuzileiro bom moço que nada faz além de honrosamente cumprir
obrigações como parte inerente de seu dever pátrio, e provocar nele uma
transformação que funcione como mote para a exploração de conflitos nas
relações familiares.
Tais conflitos são o real ponto de interesse do filme, e
Sheridan filma bem os vetores de força dentro do espaço da casa, assim como os
embates e aproximações entre os membros da família. A progressiva reintegração
de Tommy (Jake Gyllenhal) ao seio do núcleo familiar em paralelo ao afastamento
de seu irmão Sam não é trabalhada como uma oposição simplista imposta por um
roteiro com o desejo de chocar, mas como uma autêntica questão de balança
familiar. Afinal, a repressão de um sentimento de um lado sempre corresponde a
uma explosão de outro, para que o equilíbrio seja de alguma forma garantido.
Mesmo que se trate do equilíbrio das eternas brigas. Pois tal é a lei da
família.
E é o gosto por filmar os afetos e desafetos familiares de
forma funcional e despojada – algo já presente em seu filme de 2002, Terra
dos Sonhos – que faz deste filme de Jim Sheridan nada mais nada menos do
que um filme profundamente ciente de seu material e de seus limites. Uma boa
direção de atores, a recusa de paralelismos óbvios na montagem e um grande
respeito pela coerência do desenvolvimento psicológico dos personagens (que
garante que eles não traiam sua “natureza” para fazer avançar o drama) garantem
um bom filme mediano no qual o principal objetivo é atingido com propriedade:
emocionar. Um filme que ocupa de maneira digna o lugar de atualizar dramas
familiares e sentimentais derivados da existência habitual de campanhas belicistas.
Sem grandes ênfases, sem encenações grandiloqüentes, sem lançar mão de um
melodrama espalhafatoso. Apenas um filme corrente sobre assuntos correntes.
Tatiana Monassa
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