Woodstock para Ang Lee nunca seria o palco inquieto de
grandes subversões e choques desconcertantes com a ordem das coisas. Só poderia
ser o que é: uma aventura mansa aberta a uma diversidade circense de expressões
humanas e permeada de leves (e sempre cômicas) afrontas à moral dos mais
conservadores. A caracterização de Elliot, o bom moço que termina por tornar o
histórico evento possível quase sem querer, o torna a personificação perfeita
de todo o filme. Sua inofensividade patente serve de espelho para o olhar de
Ang Lee sobre a totalidade dos acontecimentos. Trata-se de uma sensibilidade
dócil, uma espécie de estado chapado capaz de amortecer revoltas, que lida com
um turbilhão de acontecimentos de maneira sempre serena. Como contraponto, temos
a caricatura de tudo aquilo que parece ligeiramente extremo: o grupo de teatro
de vanguarda, os pais de Elliot drogados com haxixe, os mafiosos que aparecem
para reclamar controle sobre o evento.
Chamar o filme de conservador, no entanto, seria ignorar o
trabalho e o interesse particulares de Ang Lee, cujas ambições nunca foram
muito além de reconstituir âmbitos comunitários com leves deslocamentos em
relação às normas sociais vigentes: revoluções discretas de caráter individual em
sujeitos apenas um pouquinho diferentes de seu entorno, mas ainda assim
“normais”. Firmemente apegado a uma narração descritiva, portanto, Aconteceu
em Woodstock se desenrola sem sobressaltos, com pontos de virada
praticamente imperceptíveis, e mostrando-se interessado sobretudo na
simultaneidade de ações, que ganha freqüentemente a imagem por meio de split-screens.
O interessante na utilização que Ang Lee faz do recurso é deter-se sempre sobre
uma mesma cena, evidenciando diferentes ângulos da mesma e provocando uma
vertigem perceptiva pela convergência de movimentos de câmera.
Por fim, é isto que subsiste como imagem preponderante: uma
profusão de ações performadas por um número infindável de pessoas. Ações não
necessariamente dotadas de sentido ou propósito. Ao menos não no momento de sua
realização. Pensando-se por este lado, pode-se compreender o trabalho de Ang
Lee como o esforço de um cronista para recontar eventos de maneira minimamente
cativante e sem nunca impor “dificuldades” de fruição, com o objetivo último de
provocar reflexões posteriores sobre os sentidos que atribuímos às coisas. Ou,
mais precisamente, às ações em sociedade. E, vendo por este ângulo, sua obra
pode chegar a parecer mais provocadora do que a superfície a princípio sugeriria.
Tatiana Monassa
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