O precioso anel que retorna à sua dona após ter sido
receptáculo de tantos auspícios de percorrer novas trajetórias é uma espécie de
símbolo da narrativa de Bem-Vindo. Ao fim de todas as tempestades, a
volta ao estado anterior. Se esta perspectiva corresponde à constatação de um
horizonte cinza em relação à questão imigratória na Europa e ao futuro de uma
vasta juventude de refugiados vindos de diversas partes do globo, ela serve
também de comentário sobre a situação pessoal do personagem francês, Simon. É,
no fundo, seu estado emotivo que guia o filme, tornando o imigrante ilegal, o
iraquiano Bilal, apenas um elemento evocador de seus conflitos afetivos.
É para impressionar e se aproximar de alguma forma da
ex-mulher que ele ainda ama, Marion, que Simon resolve abrigar Bilal e o amigo
por uma noite, mergulhando em seguida de cabeça na missão subversiva de
protegê-lo e ajudá-lo a atingir seu intento: chegar à Inglaterra a nado. O
santo graal do iraquiano somente intensifica o comportamento obsessivo de Simon,
que chega a projetar no rapaz o filho que não tem: ele está disposto a tudo isso em nome de
um amor. Há, inclusive, um diálogo absolutamente demonstrativo em que Simon diz
à ex-mulher que ele próprio, em comparação, não havia nem mesmo atravessado a
rua para recuperá-la.
Por mais que o comentário político de Bem-Vindo seja
contundente – não há para onde fugir, a vigilância é ampla, profundamente
inquisitiva, e paranóica, trazendo ecos das práticas nazistas, como comenta
Marion – sua narrativa se esvazia rapidamente ao se mostrar ancorada antes no
relato de uma dor de cotovelo incurável. Por mais sensível a esta problemática (humanitária,
em última instância) cujos contornos sombrios se alargam sob seu nariz, e em
grande parte por causa de sua conivência silenciosa, a consciência do
personagem (estaria ele representando toda a França?) segue motivada sobretudo
por seus dramas sentimentais. Seria tal estado da ficção um comentário irônico?
Ou apenas e tão somente a revelação da natureza burguesa das vozes que encontram
algum espaço pra se expressar sobre as injustiças?
Tatiana Monassa
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