Sem apelar para um surrealismo
metafórico, O Lar trabalha o inusitado do argumento de uma família
vivendo à beira de uma auto-estrada sem circulação de veículos de forma
naturalista com toques de fábula. Os pais e os três filhos levam sua agitada
vida em comunhão uns com os outros e com o ambiente que os circunda. O
isolamento social tensiona as relações, fortalecendo a intimidade e abrindo
brechas para choques internos. À medida que o roteiro avança e o equilíbrio
comunitário passa a ser ameaçado pela crescente castração da liberdade pela
abertura da auto-estrada, as insatisfações dos personagens começam a colocá-los
uns contra os outros. A vastidão da paisagem e a crescente circulação de
veículos diante deles opõe-se então a seu progressivo encerramento no interior
do concreto.
A situação sem saída armada poderia
facilmente converter-se numa tragédia pela revelação de ímpetos ocultos dos
personagens, mas a diretora trabalha-os sempre na chave da idiossincrasia e da
instabilidade, de forma que a intensificação do drama apenas acentua aspectos
que já estavam lá, dos quais, sem dúvida, a aparente desordem mental de
Isabelle Huppert, que estaria controlada pela paz do cotidiano bucólico, é o
mais relevante. Este manejo que Meier mantém sobre seus personagens, equilibrando-os
todos em importância no interior da casa e recusando a encerrá-los num perfil
pré-definido, preferindo encontrá-los nas falas e movimentações, é o que O
Lar guarda de mais interessante. De resto, o colapso familiar por falta
justamente de uma solução possível para o impasse proposto emperra a conclusão
do filme e torna o confronto que poderia transformar os personagens no
desdobramento de uma série de situações tediosas que terminam por ofuscar a
vivacidade inicial do filme.
Tatiana Monassa
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