Que
os alemães nos últimos anos tenham utilizado
o cinema como forma de explorar sua memória histórica
do nazismo ao comunismo e à separação
em duas Alemanhas representando duas ideologias, é
algo extremamente salutar. Não deixa de ser um
sopro de ar ver que um país tenta reconstruir
sua memória fora da culpa absoluta ou do negacionismo
radical. Mas, em termos dos resultados obtidos, contando
com os premiados e queridinhos Adeus Lênin
e A Vida dos Outros, esse cinema está
muito aquém do que se espera: em termos de vigor
histórico, em termos de conceito, mas acima de
tudo em termos de cinema.
A Onda faz parte desse processo que ainda
inclui outro filme darling do circuito de arte, Edukkators
, e apresenta a mesma fórmula dos anteriores.
Parte de um tema com diversas ressonâncias históricas
e políticas, e o converte num drama sentimental,
terreno em que ele poderá assolar todas as possíveis
conseqüências mais funestas e radicais do
processo de pensamento e entreter seu espectador cioso
de diversão "inteligente" com uma baboseira
de suposto teor especulativo. No caso específico
do filme, uma aula sobre autocracia, a propósito
do questionamento de ser ainda possível um fascismo
hoje em dia, vira um experimento sobre disciplina e
unidade em que começa a brotar uma sinistra lógica
de grupo que rapidamente se transforma em violência
e prática de exclusão. O experimento é
até interessante, mas ao invés de ater-se
aos questionamentos que prefigurava, o filme prefere
deixar de lado os objetivos de sua própria "aula"
para ficar criando soluçõs dramáticas
bombásticas e conceitualmente evasivas, como
a imersão do próprio professor dentro
da experiência que instaura. Inconvincente do
ponto de vista dramático e totalmente incapaz
de autocrítica (afinal de contas, é um
filme sobre manipulação que não
questiona qualquer uma de suas próprias jogadas
manipuladoras de construção), A Onda
não consegue ser nada além de um filme
bem cretino.
Ruy Gardnier
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